A força do TikTok para o mundo da música, todo mundo já conhece. Músicas novas ou antigas despontam nas paradas a todo momento por conta de virais de dança ou desafios no aplicativo chinês. Mas o TikTok também se tornou um impulsionador do mercado literário. Como as paradas do Spotify ou da Billboard, os rankings de best-sellers – no Brasil e no mundo – também são impactados pelo potencial viral dos vídeos curtos. As editoras estão atentas.
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“Os Dois Morrem no Final”, livro do norte-americano Adam Silvera, foi publicado recentemente no Brasil pela Intrínseca depois de viralizar no aplicativo. “A gente viu ele despontando no TikTok lá fora e descobriu que os direitos estavam disponíveis no Brasil”, conta a editora de aquisições Talitha Perissé. O romance foi catapultado para a lista dos mais vendidos aqui no país. “A gente não consegue dar a certeza de que o TikTok carregou ele para cima, mas consegue dizer que sem dúvida ajudou a chamar nossa atenção”, pontua.
O livro, inclusive, vai virar uma série sob os cuidados do mesmo criador de “Bridgerton”. Não é um caso isolado. Recentemente, a Netflix anunciou que fará um filme baseado em “Os Sete Maridos de Evelyn Hugo”, romance de Taylor Jenkins Reid. O livro é um dos queridinhos dos usuários no TikTok, o que ajudou a alavancar suas vendas. Os vídeos postados sobre Evelyn Hugo acumulam 250 milhões de visualizações no app.
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Outro exemplo: “Vermelho, Branco e Sangue Azul”, que vendeu mais de 54 mil exemplares no país em 2021 e vai virar filme no Prime Video. Vídeos envolvendo o título em português acumulam mais 97 milhões de reproduções no TikTok. Já o título em inglês – “Red, White and Royal Blue” – passa de 538 milhões de visualizações.
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Jovens leitores são quem impulsionam os virais
Como a plataforma é muito consumida por jovens, os livros voltados para esse público tem maior potencial viral. “É o público mais intenso, mais animado, mais apaixonado. Os livros jovens, então, acabam tendo uma entrada maior com eles também”, explica Talitha Perissé. A ideia de que “adolescente não gosta de ler” nunca foi tão equivocada. O público teen e jovem adulto não apenas lê como engaja.
A maneira de se comunicar no TikTok já impacta as aquisições do mercado literário. Raffaela Machado, da Galera Record, diz que qualquer livro jovem precisa ter sua premissa explicada em trinta segundos hoje em dia. “Se não conseguir, vale repensar se vale à pena contratar”, sinaliza. A Galera Record, atualmente, considera imprescindível contratar booktokers para fazer os lançamentos de livros voltados para esse público, que tem aquecido o mercado.
A Intrínseca segue outra linha. “A gente não tem contratado booktokers, porque é uma relação que a gente quer construir organicamente. Mas em termos de conteúdo pra empresa, a gente incluiu, sem dúvida, o TikTok no nosso plano de marketing”, explica Talitha.
“Eu acho que a grande questão do TikTok é que ele tem uma característica de espontaneidade. O vídeo no TikTok tem uma autenticidade. A pessoa ali não está com a função de trabalhar com isso. Agora acho que vamos ter essa transição. Quando você vê que é autêntico, fica com mais vontade de consumir também”, opina a editora, em entrevista ao POPline.
@editoraintrinseca Conheça um pouquinho do nosso dia a dia ❤️ Qual é o proxímo departamento que você quer conhecer? #intrinseca #booktokbrasil #booktoker ♬ original sound – Intrínseca
Das postagens orgânicas à postagens patrocinadas
Booktoker é o nome dado para o usuário do TikTok que posta vídeos falando sobre livros e suas experiências literárias. O movimento digital começou organicamente, mas já se profissionalizou. Tiago Valente é um exemplo. Ele fala de livros no TikTok desde 2020 e se tornou uma das maiores referencias nacionais, com mais de 381 mil seguidores e sete milhões de curtidas. Hoje em dia, 100% de sua renda vem do trabalho como booktoker. “É um trabalho que une minhas maiores paixões”, diz o mestrando em Letras, que lê cerca de 50 livros por ano.
“O objetivo principal do meu conteúdo é criar novos jovens leitores, por isso, gosto de indicar todo tipo de livro, mas, principalmente, aqueles que trazem representatividade LGBTQIAPN+, porque acredito que a literatura é um meio de transformação e pode ajudar a construir uma sociedade menos preconceituosa. Mesmo assim, me divirto muito quando faço vídeos sobre histórias de mistério, principalmente sobre cozy misteries – meu gênero literário favorito!”, Tiago conta ao POPline.
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O POPline apurou e booktokers profissionais cobram a partir de R$ 600 por vídeo, dependendo do número de seguidores e alcance. A maioria dos vídeos postados, no entanto, não é patrocinada. O algoritmo do TikTok é imprevisível e as editoras sabem que as publicidades podem não reverter. Tiago Valente já fez publicidade para a maior parte das editoras nacionais e diz que um vídeo postado pode demorar até meses para viralizar ou receber um alcance maior. “Os vídeos continuam passeando pelas timelines por 90 dias até encontrarem o público certo”, explica.
@otiagovalente deixe uma declaração de amor criativa nos comentários! 🗣✨ #AprendaNoTikTok #livros #comédia ♬ som original – Tiago Valente
Diferentemente dos cantores, autores não são obrigados a aderir à plataforma
Além de booktoker, Tiago Valente também é escritor e percebe o quanto o aplicativo ajudou a impulsionar suas vendas. Seu conto e audiobook “Conselhos de Natal” saiu pela editora Burn Books depois de seu boom no TikTok e vendeu mais que os livros anteriores. Ele já prepara outro livro, com a Editora Nacional. “Acho que, para o autor em si, estar nas redes sociais não é uma obrigação, mas se deseja ter sucesso nas vendas é importante que sua obra tenha visibilidade em algumas das diversas redes que reúnem uma comunidade de leitores”, opina.
Para Raffaela Machado, é “extremamente indicado” que escritores de livros do segmento jovem estejam no TikTok. Mas isso é uma decisão de cada autor. As editoras veem com bons olhos os autores com grande engajamento nas redes sociais, mas isso não é cobrado nem sugerido. “É diferente do que a gente tem visto com as gravadoras, né?”, ressalta Talitha Perissé, “o autor é livre para divulgar como quiser, e se quiser. Não tem obrigatoriedade”.
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O norte-americano Ryan Douglass, por exemplo, assistiu de longe seu livro “Jake Livingstone Vê Gente Morta” viralizar no TikTok. Os vídeos postados acumulam 31 milhões de reproduções, e o livro se tornou um best-seller instantâneo do New York Times. Mas o escritor mesmo nem era familiarizado com a plataforma.
“Eu tenho uma conta, mas ainda estou aprendendo a usá-la, porque a interface me confunde. Nao uso muito redes sociais, mas aos poucos estou tentando me familiarizar mais com o app”, diz ao POPline.
Para ele, motivos que fazem um livro viralizar vão desde uma capa atraente até uma premissa de alto conceito. “Eu aprecio o amor que a comunidade do TikTok deu ao livro”, comenta Ryan, “eu não tinha ideia do que esperar quando publiquei. Espero que os leitores no Brasil possam se relacionar com as questoes do livro, apesar de ele se passar em um país diferente”.
Casos como o de “Jake Livingstone” estão no radar das editoras. Olhar o que dá o que falar no TikTok lá fora se tornou mais uma função para editoras de aquisição no Brasil. “A gente está de olho em tudo o tempo todo. Mas, na Intrínseca, uma das nossas diretrizes sempre é: o livro precisa ser bom”, ressalta Talitha Perissé. Mas, se há tantos leitores falando que é, vale sempre prestar atenção, é claro.