O que acontece quando o autor de um livro é também um fã de música pop? Já no primeiro capítulo, aparecem as evidências, com citações a Lady Gaga e Katy Perry. É assim o livro best-seller “Enquanto Eu Não Te Encontro”, romance gay young adult escrito por Pedro Rhuas, que já vendeu dez mil cópias no país. “Quando comecei a escrever, eu tinha 19 anos e havia acabado de entrar na universidade. Eu era exatamente como a maior parte dos jovens ao meu redor: uma bicha viciada em cultura pop!”, o escritor conta ao POPline.
“Por isso, quando o protagonista Lucas surgiu em minha mente, eu sabia que ele não poderia ser outra coisa além de… uma bicha viciada em cultura pop exatamente como o autor! Eu consumia esses conteúdos nas redes sociais, defendendo minhas divas com unhas e dentes nos comentários das páginas no Facebook (POPLine entre elas, claro!), fazendo mutirão para premiações e toda uma vida de fandom. Porém, por mais que essa fosse a realidade de tantos jovens LGBTQIAP+ ao meu redor, nunca via isso representado na literatura”, completa.
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O livro conta a história do universitário Lucas, o maior fã de Katy Perry no Nordeste. Ele sai do interior do Rio Grande do Norte para a capital acompanhado do melhor amigo Eric, um little monster, e se apaixona por um francês na inauguração de uma balada chamada Titanic, mas os dois não conseguem se reencontrar nem se falar a partir do dia seguinte. No meio disso tudo, ainda rola um date com um fã da Taylor Swift.
“Olha, POPLine, vamos combinar, né? O livro se passa em 2015. Quem eram as MAIORES na época? Claro que não poderia faltar Katy Perry, Lady Gaga e Taylor Swift representando a trindade do pop internacional em ‘Enquanto eu não te encontro’. Brincadeiras à parte, eu sou katycat; meu melhor amigo em quem o Eric é inspirado é little monster; e meu ex-namorado era swifitie. Eu acho que… bom. A resposta do porquê tá na cara!”, conta o autor.
Daria para montar uma playlist com todas as músicas citadas no livro: “Bad Romance”, “Can’t Get You Out Of My Head”, “Team”, “S&M”, “Say It Right”, “Shake It Off” e por aí vai. Mas Pedro Rhuas ainda escreveu e gravou músicas próprias para acompanhar a história. O álbum entrará nas plataformas digitais em novembro, mas várias canções já estão disponíveis.
POPline – Houve alguma música que você ficou em dúvida ou chegou a colocar outra no lugar e depois trocou?
PEDRO RHUAS – Essa é uma boa pergunta! É engraçado porque sempre tive muita clareza do gosto musical dos personagens, e como eles expressavam esses gostos ao longo do livro. Algumas referências, porém, acabaram saindo no processo de edição. Por exemplo, em determinado ponto o narrador brinca com o “Artpop” ao comentar sobre um flop pessoal, mas em uma versão anterior do livro essa mesma referência era com o “Killer Love”, da Nicole Scherzinger! Já dá pra ver que o processo de escrita foi bem divertido, né?
POPline – De que maneira você acha que essas referências contribuem para a construção do universo dos personagens?
PEDRO – Meu protagonista vem de um plano de fundo pessoal muito específico: é um garoto gay afeminado do interior do Rio Grande do Norte, crescendo em uma cidade onde nem sempre pôde expressar sua sexualidade com a leveza que gostaria. Para muitos jovens queers como o Lucas, o universo pop foi um dos únicos escapes possíveis, um dos raros espaços de acolhimento. Foi assim para mim. Tanta a literatura quanto a música me salvaram em um período em que, não fosse pelas trocas que fazia sobre esses assuntos na internet, eu sentia que ninguém me entendia. Assim, todas as referências ajudam a pincelar esses personagens. Até porque, na minha vivência, referências são elementos que realmente ajudam a construir as identidades de jovens. Com os meus personagens não poderia ser diferente.
POPline – As músicas citadas, da mesma maneira que ajudam o público a se conectar com a história, podem afastar alguém que não conheça a maioria dos títulos. Isso foi uma questão para você?
PEDRO – As referências são muito específicas. Além disso, também são datadas; 2015 foi há seis anos, e o mercado musical se move tão rápido que isso já parece uma eternidade… Nem todo mundo conheceria a maioria das referências de qualquer modo, mas meu público-alvo principal, sim. Eu desencanei logo cedo sobre isso, sobre qualquer senso de unanimidade. Quem gostou bate palma, quem não gostou paciência, sabe? Esse era o livro que eu precisava escrever. É também uma máquina do tempo, e é uma delícia saber que, sempre que queira voltar a 2015, é só abrir essas páginas para sentir o gosto daquele ano.
POPline – O livro vendeu mais de dez mil exemplares. O que você acha que atrai tanta gente para essa história?
PEDRO – Caramba, eu ainda não me acostumei a esse dado: dez mil exemplares é livro demais, né? Eu sinto que as pessoas são atraídas por “Enquanto eu não te encontro” por muitos motivos. Por ser um livro viadérrimo que não esconde isso; pelo protagonismo nordestino; pelo uso de clichês românticos que pessoas LGBTQIAP+ raramente veem sobre si mesmas; pela capa icônica; pelas referências; pelo senso de comunidade e acolhimento que se formou ao redor da história; pelo gosto de casa; e pelo escapismo rumo a um universo que parece mais leve do que esse que a gente vive hoje… O romance é algo que muitas pessoas no Brasil esperavam. Fico feliz de ter proporcionado a concretização dessa obra!
POPline – Eu vi que o personagem tem algumas coisas suas – como ser katycat. Para a história em si, de onde veio a inspiração?
PEDRO – O Lucas, protagonista de “Enquanto eu não te encontro”, tem muito mesmo de mim. O que faz sentido quando coloco em perspectiva que comecei a escrever a história aos 19 anos, em um período em que ainda trabalhava minha escrita. A inspiração em si veio de tudo que eu queria viver. O livro se iniciou como uma projeção particular. Eu queria um romance, eu queria um romance com um francês, e como minha vida era baseada em baladas à noite e universidade de dia, precisava acontecer em uma boate. Mas o mote inicial para criar o Pierre, o boy francês que o Lucas conhece na boate Titanic, veio quando conheci um intercambista francês – hétero – em um ônibus na UFRN e fiquei caidinho por ele. O resto é história!
POPLINE – Ele é classificado como young adult. Como é escrever para esse público?
PEDRO – É o público mais divertido do mundo! Sério, eu amo escrever para o público jovem, pessoas de 13 a 26 anos, porque é onde me sinto mais à vontade. Por ser jovem (eu tenho apenas 25), me sinto em casa. É um público antenado, e você precisa estar antenado também; saber o que gostam, o que estão falando, como estão falando… Além disso, é uma galera muito passional, que vira fã mesmo e cobra terapia do autor depois de terminar a leitura chorando (eu sei disso porque já estou devendo UM BILHÃO DE REAIS em terapias, sabe?). Meu plano é continuar escrevendo Young Adult e New Adult pelo futuro breve!
POPline – Você é muito musical e, no fim do livro, o público é apresentado ao álbum com a trilha sonora. Como surgiu essa ideia incomum de criar músicas para acompanhar um livro?
PEDRO – Quantos filmes e séries com trilha sonora original já não acompanhamos? Era como se houvesse um abismo nisso em relação aos livros. Foi quando veio a tal ideia incomum: e se eu unisse minha carreira musical à literária, construindo um álbum inteiro com faixas que se relacionam ao romance? A primeira música surgiu em 2018, mas o restante do álbum foi composto em 2020, em plena pandemia. Foi incrível poder me debruçar nessas possibilidades, e quanto mais imergia no processo de produção/composição da trilha, mais percebi que esse era um movimento pioneiro não apenas no cenário literário brasileiro, mas internacional também. Afinal, é uma participação e entrega completa do artista em todas as etapas de divulgação e criação.
POPline – Gostaria de adaptar o romance para o audiovisual e usar sua trilha sonora autoral?
PEDRO – Essa é a pergunta de um milhão de dólares cuja resposta é sempre SIM! É meu sonho, de verdade, ver essa história traduzida para as telas. A própria trilha sonora autoral já nasceu com o objetivo de tornar esse caminho de transporte para o audiovisual ainda mais pleno, proporcionando a experiência de imersão aos leitores enquanto um filme, por exemplo, não fosse produzido.
POPline – Já está escrevendo outro livro? O que podemos esperar?
PEDRO – POPLine, por aqui brincamos que o rhuasverso nunca para! No momento, estou trabalhando paralelamente em projetos diferentes, agora especialmente focado em retomar a um universo que meus leitores já conheceram e amaram… Em resumo: muito amor e boiolice, com bastante representatividade LGBTQIAP+ e a certeza de se sentir abraçado!