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(Opinião) Evitando o desastre: o que a indústria da música pode aprender com a crise das empresas de tecnologia

Foto: Maxim Hopman/ Unsplash
Os meses que seguiram o início da pandemia foram uma era de ouro para as empresas de tecnologia:
  • $671 bilhões investidos (KPMG)
  • 46% mais contratações (LinkedIn)
  • 660 novos bilionários (Forbes)
  • 0,25% taxa básica de juros nos EUA (Investing)
  • 133% de crescimento no índice da Nasdaq (Yahoo Finance)

Índice de Nasdaq mais que dobra entre mar/20 e nov/21

Aí, 2022 chegou e foi tudo por água abaixo:

  • 35% menos investimentos (TechCrunch)
  • 290 mil demissões (Layoffs)
  • $2 trilhões (com T) a menos no bolso dos bilionários da tecnologia (Forbes)
  • 47% das falências devido à falta de capital (Skynova)
  • 35% de queda no índice da Nasdaq (Yahoo Finance)


Índice de Nasdaq despenca entre nov/21 e out/22

(Explico os motivos da crise neste outro artigo).

A indústria da música pode aprender com esta crise para evitar construir uma própria.

Não é porque o mercado segue crescendo em ritmo acelerado ou porque saiu de uma crise de quase 20 anos há pouco tempo que as decisões podem ser tomadas como se não houvesse o amanhã.

Observando o que as centenas de clientes atendidos pela minha empresa, noodle, estão fazendo — de pequenas iniciativas a negócios líderes — consigo traçar paralelos preocupantes com o que vem ocorrendo entre as empresas de tecnologia.

A indústria da música não é à prova de balas.

Leia Mais:

Estas são as 5 ameaças que merecem atenção para evitar produzir uma crise nos próximos 5 anos:

1) Adiantamentos e investimentos

Adiantamentos e investimentos secaram por anos. Hoje, voltaram a ser uma parte importante em negociações entre artistas/selos e gravadoras/distribuidoras.

Os cheques estão cada vez maiores. Os prazos, mais extensos. As taxas, mais agressivas…

… e os riscos, cada vez mais expressivos.

Enquanto a indústria estiver gerando caixa em excesso, como agora, o risco está coberto. Mas nem todo crescimento dura para sempre.

Empresas de tecnologia gastaram e contrataram como se o capital nunca fosse acabar:
o volume atual dos adiantamentos e investimentos me parece depender de que o crescimento da indústria seja permanente.

Bem, ele não é. Tampouco é tão previsível quanto se assume.

2) Concorrência aperta o cerco

O mercado independente cresceu, mas a concentração de mercado ainda é grande. Assim como na camada dos grandes conglomerados, no próprio mercado independente existe uma segunda camada de concentração.

Mas com o mercado aquecido, as maiores empresas vem adotando estratégias de M&A (”comprando empresas menores”) e as intermediárias, realizando ofertas bastante agressivas (por exemplo, 6, 7 anos de adiantamento).

Todo mundo quer aproveitar esta crescente. Mas quando a concorrência fica intensa demais, surge a ideia de crescer a qualquer preço. Aos poucos, o crescimento saudável se torna uma casa de papel e, quando a primeira empresa cair, a casa inteira pode ir por terra abaixo.

3) Menor poder aquisitivo dos consumidores

A inflação espremeu o poder aquisitivo das pessoas e das empresas no mundo todo. Um período de baixo crescimento (ou recessão) já está em curso. Ciclos econômicos não acontecem da noite para o dia e fatores delicados (pós-pandemia, guerra, EUA x China, cadeia produtiva…) merecem atenção.

Tudo isso parece distante e descorrelacionado com o mercado da música. Na prática, nem tanto: a gravidade e duração deste ciclo pode desacelerar (ou reverter) as projeções de crescimento do mercado, podendo dar um revés nos negócios que contavam com esta curva positiva para suas contas fecharem.

4) Dinheiro mais caro

Dinheiro barato (2009-2021) acelerou o crescimento da indústria, deu vida a fundos e negócios inovadores e contribuiu para tornar a música num ativo atrativo. A realidade agora é outra. Dinheiro mais caro significa menos investimentos, margens menores, cordas de salvação mais raras, aversão a risco.

Isso impacta dos grandes conglomerados que se alavancam com dinheiro institucional aos artistas que podem ter suas margens reduzidas pois o aumento de custo está sendo transferido para o final da cadeia.

Se a margem for baixa o suficiente para tirar o incentivo da base, a indústria poderá ter que lidar com um fato inédito.

5) AI: aliada ou ameaça?

A inteligência artificial deixou de ser mais um hype e já está mexendo com muitas indústrias. Apesar de muita gente se sentir ameaçada, é bem possível que esta revolução tecnológica se torne uma importante aliada. Mas não dá para negar que o grau de incerteza sobre o futuro e a velocidade das transformações trazem dúvidas sobre a substituição de mão de obra pelo avançados algoritmos.

Otimista ou pessimista, qualquer palpite aqui seria puro chute. Ainda assim, coloco como um fator de grande importância para o futuro da indústria. Porque, entre empresas de tecnologia, vence quem se adapta mais rápido. E na música, vale a pena nadar contra a maré?

Resumindo, a indústria da música pode evitar produzir uma crise nos próximos anos prestando atenção em cinco ameaças:

  • adiantamentos e investimentos excessivos
  • concorrência crescente
  • queda no poder aquisitivo dos consumidores
  • dinheiro mais caro
  • inteligência artificial

Se a crise da música nos anos 2000 foi provocada por fatores externos (novas tecnologias e mudança no padrão de consumo), vejo o risco interno — de como o próprio mercado lida com o crescimento diante de transformações tão rápidas e ciclos econômicos tão intensos — como a causa mais provável de uma potencial crise.

Não torço para que isto aconteça. Muitas crises são previsíveis e evitáveis.

Principalmente, quando podemos estudar de perto uma indústria infinitamente maior que tem sofrido por insistir nos mesmos erros do passado.

___________
Igor Bonatto (@igorbonatto) é fundador da noodle (noodle.cx), o primeiro banco digital para artistas e empresas musicais. Antes, Igor fundou a produtora audiovisual Claraluz Filmes, a agência de inovação criativa THT, dirigiu e produziu filmes publicitários, videoclipes, curtas e longas.

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