“Tem que sair de dentro do quarto e do YouTube pra expandir os horizontes”, ao analisar essa frase, fica claro que estamos diante de um produtor musical inquieto e em busca de construir sua história em escala global: Henrique Andrade. O engenheiro de som e produtor musical brasileiro vencedor de dois Grammys Latinos e com currículo que conta com trabalhos com Justin Bieber (“Purpose”), Zayn (“Mind Of Mine”, “Icarus Falls” e “Nobody Is Listening”), Fifth Harmony (“Reflection”), Juanes (“Mis Planes Son Amarte”), entre outros, volta a trabalhar com artistas em sua terra natal.
Henrique foi morar em Los Angeles em 2010, onde vive atualmente. Foi lá, graças aos reconhecidos estúdios Record Plant, que ele desenvolveu sua carreira e cresceu ao ponto de acumular trabalhos relevantes na música. Foi lá também que ele vivenciou, na prática, a disparidade entre os mercados musicais no Brasil e nos Estados Unidos.
O POPline.Biz é Mundo da Música entrevistou o produtor musical que contou sobre sua visão sobre a música Pop brasileira, o mercado e o que enxerga como diferencial artistístico, além dos seus novos projetos no Brasil.
Para Henrique, a construção da identidade de um trabalho artístico é pautada a partir da relação e verdade que o artista deseja transmitir.
“Música popular não tem cara. O System of a Down era pop. Além de muita conversa… O trabalho com o artista é como tentar escolher um outfit… colocar uma roupa e ir na frente do espelho e ver se ‘combina’ com o artista, se ele se sente bem e vai defender isso. Tem algo da estrutura de clássica de contar uma uma estória que acho que é universal e vai ficar por muito tempo. Dentro desses formatos e com muita permissão pra explorar, a gente constrói o álbum”, diz Henrique.
Sobre o atual momento da Produção Musical com: introduções cada vez mais curtas ou inexistentes, além da atual dinâmica dos algoritmos e a necessária fuga do “skip” nas faixas das plataformas de streaming, questionado sobre o quanto esses elementos interferem nas produções, Henrique é otimista e acredita que a música reflete a atual dinâmica rápida da sociedade.
“Acho que isso tudo é resultado das evolução tecnológica nas nossa vidas. Hoje as coisas são muito mais rápidas e condensadas. Dos emojis aos stickers do WhatsApp, a forma com a gente recebe, consome e troca informação determina essa expectativa do ouvinte. A ideia da música é contar uma estória e essas mudanças são reflexos de como a gente comunica essas emoções. Introdução mais curta, 147 caracteres aqui ou uma figurinha ali e a gente continua se expressando e retratando o presente”, analisa Henrique.
No Brasil, aos poucos, o Dolby Atmos tem ganhado cada vez mais adeptos, entre fãs e produtores musicais. Questionado sobre esse movimento, Henrique prefere entender melhor os desdobramentos dessa tecnologia.”O objetivo da mix em stereo é reproduzir a visão do ouvinte como espectador. Somente com dois canais, a gente tem vários níveis de posicionamento sonoro. Esse conceito de imersão (3D,8D) já tinha sido usado em peças da Disney e em outros musicais, mas, ainda acho que para o grande número de consumidores, o foco ainda vai ser em entregar a versão que “funcione” quase mono, a gente não quer perder algo importante caso o ouvinte tenha um sistema de som não tão completo”, reflete o produtor.
“As produções pop de hoje em dia já se reservam a ter pouca informação muito diferente de um lado só de uma caixa, de um lado do fone. Apesar de amar algumas releituras de musicas nesse formato Atmos eu ainda prefiro esperar pra entender melhor como a gente vai produzir pra isso”, revela Henrique.
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O pop brasileiro e o mercado global
No mercado, há muitas discussões sobre as “barreiras” que a música brasileira possui para ser escalonável a nível global como o Reggaeton, por exemplo. Para Henrique, a principal barreira é a a língua portuguesa. “Ela é linda, riquíssima e absurdamente musical. Mas, ter poucos países que dividem com a gente essa língua nativa coloca o Brasil dentro de um universo menor que o espanhol, por exemplo. O fenômeno cultural do reggaeton é absurdo. O Impacto de uma música em Espanhol no top charts dos EUA é uma revolução cultural sem precedentes”, observa Henrique.
“Acho que não estamos ainda na mesma corrida global que os países de língua espanhola estão. O brasileiro tem ainda que aprender a se admirar pra conseguir uma posição de destaque. Em geral, a gente ainda olha muito pra fora em busca de aprovação. O reggaeton com o “Despacito” invadiu os EUA e colocou a cultura Hispânica em evidência, mais que isso, trouxe orgulho pra esse estilo musical poder ser olhado como algo que chega ao topo e se mantém”, analisa o produtor musical.
O recomeço dos trabalhos de Henrique Andrade no Brasil vem a partir de uma parceria com a nova aposta do Pop, o cantor Rob Miranda. O produtor conheceu o artista por intermédio de Bruna Alves, assessora da imprensa da Lá Comunicação. De acordo com Henrique, o desafio de compor e produzir na pandemia e à distância, não amenizou com o tempo. Eles ficavam cerca de 8 horas por dia escrevendo e gravando remotamente. Com a chegada de Henrique no Brasil, os dois foram recebidos pelos produtores musicais: Papatinho, Liminha e Dudu Borges.
Sem esconder o desejo de trabalhar com artistas da cena “Soft Pop” brasileira, como Lagum, Giulia Be, Jão e Melim, o produtor musical fala sobre as características e potenciais que essa nova geração possui.
“Antes de mais nada é muito talento… Além disso, uma visão atual da música e do Mercado musical focado em produções com muita qualidade. Essa nova geração cresceu dentro das mídias sociais. A relação com a arte e com os fãs é algo genuíno e natural pra eles através dessas plataformas. Também trazem influências muito mais distintas por estarem em contato com tendências e culturas diferentes de forma instantânea. Isso tudo tem um resultado muito positivo na nova pagina do pop Brasileiro e eu adoraria ajudar a escrever”, conta Henrique.
Com uma carreira longínqua na música, Henrique reúne alguns elementos importantes para novos profissionais da produção musical e engenharia de som: “Ouvir muita música, conhecer muitos estilos, dar uma olhada no passado pra reescrever o futuro é um bom desafio criativo. Sair de casa e sentir a música, o ambiente e as pessoas é algo também não se pode evitar. Música é a representação da vida, tocar pessoas… tem que sair de dentro do quarto e do YouTube pra expandir os horizontes”, finaliza.