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À frente do seu tempo, Gloria Maria fez história no jornalismo e no Brasil

Mulher preta pioneira no jornalismo brasileiro, ela não tinha medo de nada – e se jogou na vida e na profissão por 73 anos

Glória Maria foi pioneira e histórica (Foto: TV Globo / Zé Paulo Cardeal)

“Tudo o que eu quis fazer, eu fiz”, disse Glória Maria em entrevista ao Roda Viva em março de 2022. Nesta quinta-feira (2), foi confirmada a morte da jornalista, aos 73 anos. Famosos e colegas de trabalho foram às redes sociais prestar condolências e homenagens. Mas mais do que falar da morte da repórter, é relembrar sua vida e principalmente os feitos incríveis conquistados pela profissional, mulher preta e pioneira no jornalismo.

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Glória Maria fez história no jornalismo brasileiro (Foto: TV Globo)

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“Glória marcou a sua carreira como uma das mais talentosas profissionais do jornalismo brasileiro, deixando um legado de realizações, exemplos e pioneirismos para a Globo e seus profissionais”, diz o comunicado emitido pela Globo. Filha de um alfaiate e uma dona de casa, a repórter foi a primeira mulher preta no Brasil a conquistar tal cargo, lutou contra o racismo dentro e fora das redações e ainda participou de coberturas históricas do jornalismo brasileiro.

Pioneirismo & empoderamento da mulher preta

O Brasil teve sua primeira repórter de televisão negra, Glória Maria Matta da Silva, apenas em 1970, na Rede Globo – emissora onde a profissional se manteve até os últimos dias de vida – em uma época em que homens e, sobretudo mulheres pretas, encontravam muitas barreiras para ocupar espaços.

Pioneira de muitas coisas, a jornalista ainda foi a primeira repórter a aparecer no “Jornal Nacional” ao vivo em cores, em 1977. Realizou a primeira transmissão em HD da TV nacional durante o “Fantástico”, em 2007. E passou por muito, muito racismo ao se estabelecer em grandes espaços da comunicação.

(Foto: TV Globo)

Glória foi exceção durante muito tempo entre mulheres pretas ocupando cargos de prestígio na mídia. Era inspiração e lutava para dar espaço à semelhantes. Sempre evidenciava os obstáculos, há muito tempo vigentes, que o racismo colocava (e coloca) no caminho de pessoas negras.

Em março de 2015, depois que Maria Julia Coutinho, à época encabeçando previsão do tempo no “Jornal Nacional”, sofreu ataques de racismo pela internet, Glória Maria cedeu entrevista para um colunista da Revista Época:

Essa é a prova do que eu sempre disse, que o racismo nunca vai acabar. O que ela está passando hoje, eu vivi no Fantástico. Recebia os comentários por cartas e, depois, por e-mails. Não era uma declaração pública e vinha diretamente a mim, atingia a minha alma e meu coração. Hoje atinge o Brasil. A diferença é essa. Eu tinha que aguentar o tranco sozinha. Isso que ela está vivendo é a normalidade do brasileiro“.

Dentre as homenagens realizadas para a jornalista nesta quinta-feira (2), inúmeras profissionais evidenciam a importância de Glória como inspiração para jovens e mulheres.

Histórica na luta contra o racismo brasileiro

Em 2019, Glória Maria compartilhou uma publicação no Instagram em que dizia ter sido a primeira pessoa no Brasil a usar Lei Afonso Arinos — primeira norma do país que considerava a discriminação racial contravenção penal, criada na década de 1950. A jornalista foi barrada, nos anos 70, por um gerente de entrar pela porta da frente de um hotel de luxo no Rio de Janeiro.

Eu tenho orgulho de ter sido a primeira pessoa no Brasil a usar a Lei Afonso Arinos, que punia o racismo, não como crime, mas como contravenção. Eu fui barrada em um hotel por um gerente que disse que negro não podia entrar, chamei a polícia, e levei esse gerente do hotel aos tribunais. Ele foi expulso do Brasil, mas ele se livrou da acusação pagando uma multa ridícula. Porque o racismo, para muita gente, não vale nada, né? Só para quem sofre”, relatou ela no Globo Repórter.

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Icônica na profissão

Glória Maria lutou, mas também viveu e trabalhou muito. Durante sua carreira, viajou mais de 100 países. Ficou muito conhecida, desde cedo, pelas matérias especiais, entrevistas e visitas a lugares exóticos.

“Eu sou uma pessoa movida pela curiosidade e pelo susto. Se eu parar pra pensar racionalmente, não faço nada. Tenho que perder a racionalidade pra ir, deixar a curiosidade e o medo me levarem, que aí eu faço qualquer coisa.” – Glória Maria

Em 2010, esteve no Grand Canyon, nos Estados Unidos, quando andou de balão e desceu de bote o Rio Colorado. No mesmo ano, apresentou o especial de Roberto Carlos na Praia de Copacabana. Em 2011, ela repetiu o ato no show do Rei em Jerusalém. Em 2012, a jornalista mostrou o Oásis da Paz em Omã e fez um passeio com camelos pelo deserto.

E quando falamos de entrevistas icônicas, Glória Maria também foi histórica. Em 1996, Michael Jackson veio ao Brasil para gravar o clipe da música “They Don’t Care About Us” e a jornalista foi a única da imprensa com quem ele falou.

“Todo mundo dizia que ele tinha nojo de tudo. E eu era um micróbio. Estava toda suada, imunda, subi o Dona Marta a pé. Eu fiquei apaixonada por ele. A gente conversou duas horas sentados no chão e eu ganhei talvez o maior prêmio de toda a minha vida”, disse Glória Maria no “Meu Vídeo é um Show”, em 2017.

(Foto: Globo)

Em 1984, fez uma entrevista exclusiva com Mick Jagger, dos Rolling Stones. Também conversou com Freddie Mercury (1985), Elton John (2001) e Madonna (2005) – a última, Glória disse ser um amor de pessoa e que a adorou.

Glória Maria não tinha medo de nada. E mostrava para milhares de mulheres que elas também não precisavam ter. Viajava, dava a cara tapa e se jogava na vida e na profissão que exerceu por mais de 50 anos, deixando um legado que fica para a história da comunicação brasileira. É muito mais fácil sonhar com aquilo que existe e a gente pode ver. Glória foi essencial em inspirar e mostrar que você pode fazer o que quiser, independente de qualquer opinião contrária.

“Pois digo a você que não se deixe levar pelos seus pensamentos ruins, pois momentos ruins aparecem, mas os bons vem logo em seguida” – Glória Maria

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