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Entrevista: “Kat Torres foi feita de eras como Lady Gaga”, diz Chico Felitti

Presa para responder sobre tráfico humano, Kat Torres vira tema do novo podcast de Chico Felitti, criador de “A Casa da Mulher Abandonada”.

(Fotos: Divulgação)

Candidata à Miss. Rosto de outdoor e capas de revistas. Meme viral. Atriz de filmes que nunca existiram. Suposta namorada de Leonardo DiCaprio. Influencer de life style. Guru espiritual. Coach. Traficante de seres humanos. Esses são alguns dos rótulos usados para falar de Kat Torres, brasileira que está presa para responder sobre tráfico de jovens para os Estados Unidos.

Ela é tema de “A Coach”, novo podcast do jornalista Chico Felitti, o mesmo do fenômeno “A Casa da Mulher Abandonada”. Cada episódio se dedica a uma faceta da mulher que ascendeu socialmente distorcendo a realidade ao seu bel prazer. “Sabe as eras da Lady Gaga e das cantoras pop? A Katy também foi feita de eras”, Chico Felitti explica ao POPline, “o que mais me surpreendeu foi o quanto tinha de verdade nessa vida de mentira”.

(Foto: Divulgação)

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“Ela mostra a verdade de um ângulo para que pareça muito maior do que é, mas ela [a verdade] está lá. Por exemplo, a foto com Leonardo DiCaprio é inegável. Eles estiveram no mesmo ambiente. Tem até uma foto em que eles estão um encostando no outro. Se você não vai fazer nada com isso ou se você vai fazer disso o início de uma carreira internacional como a suposta modelo que está namorando Leonardo DiCaprio, isso vai de como você vai lidar com os fatos. Ela sempre optou por lidar com os fatos num lustre que é muito da Internet, em que você finge que uma coisa é muito mais legal do que é. Post de Linkedin, sabe? Quando você é demitido e faz parecer que foi uma conquista maravilhosa ter sido demitido”, comenta Chico Felitti.

Ele dedicou seis meses à reportagem do podcast, que será dividido em nove episódios. Os dois primeiros estão em todas as plataformas digitais, o terceiro e o quarto já se encontram exclusivamente no Amazon Music. “Foi uma história pela qual me apaixonei e fiquei completamente obcecado. Primeiro como usuário do Twitter, depois como repórter”, diz Chico. E ele não se engana. Imagina que ela poderá transformar esse limão em mais uma limonada.

“Quem faz documentário, podcast e reportagem tem que assumir que a gente influencia a história que conta. Eu sei que, se esse podcast for bem sucedido, vai levar o nome e a vida da Kat Torres para muito mais gente. O que ela vai fazer com esse reconhecimento, que pode ser celebridade ou infâmia, vai depender dela”, pontua.

(Foto: Camila Svenson)

Confira os melhores momentos da entrevista com Chico Felitti!

POPline – Como a “A Mulher da Casa Abandonada” afetou seus novos projetos? Tem mais gente querendo apoiá-los agora?

Chico Felitti – Antes tivesse (risos)! Não, mentira. Acho que abriu portas, e portas com o público também. Hoje em dia, eu sei que, dificilmente o que eu fizer, não vai chegar a bastante gente – se for uma história mais ou menos parecida. Tem uma questão que é muito grande: não adianta eu fazer um podcast como o que fiz recentemente, o “Gente”, com histórias singelas de pessoas comuns, e achar que vai chegar a cinco milhões de pessoas por episódio. Não vai. Tem uma questão de demanda de “casos reais” no mercado.

POPline – O que mais te atraiu na história de Kat Torres?

Chico Felitti – Era eita atrás de porr* atrás de eita. Leonardo DiCaprio, ela teve um caso com ele? Ela foi Miss, mas ninguém sabe como foi Miss. Aí, numa foto, ela aparece morando com um tigre no Four Seasons em Nova York... Sabe quando parecem histórias de 18 pessoas diferentes e não a de uma pessoa só? Acho que meu maior desafio foi costurar e explicar como uma pessoa só viveu tanta coisa. É uma vida que cabe em 12 biografias. Ela parece mudar de identidade de tanto em tanto tempo. A influencer de riqueza, de repente, vira influencer de bruxaria e banhos alienígenas com gilete. Ela muda completamente.

POPline – Eu conheci o caso de Kat Torres por conta da história de tráfico humano. Mas, até o quarto episódio do podcast, você conta várias outras histórias de trambique dela. Como que você definiu a estrutura narrativa?

Chico Felitti – Ela se impôs muito conforme fui investigando. Sabe as eras da Lady Gaga e das cantoras pop? A Kat também foi feita de eras. Teve a era Miss, a era modelo, a era atriz, a era influencer, a era autora. Tanto que esses são os títulos dos episódios. Não foi uma coisa que tive que quebrar a cabeça para fazer um outline em post-its. Ela mudava de cidade a cada vez que mudava de profissão. Era uma história tão bem vincada, como se fosse o capítulo de um livro, que essa estrutura meio que se impôs. Era muito fechadinho. Ao mesmo tempo que é uma série, parece um produto episódico porque cada episódio se sustenta por si só.

(Foto: Camila Svenson)

POPline – O que mais te surpreendeu no meio do caminho?

Chico Felitti – Quando eu comecei, achei que fosse tudo inventado e que a genialidade dela era ter inventado tudo nas redes sociais, mas que nada disso tinha existido de verdade. Quando descubro que ela de fato participou de “Velozes & Furiosos” e que ela de fato foi capa da People, eu fico tipo “caralh*! Tinha verdade”. Ela mostra a verdade de um ângulo para que pareça muito maior do que é, mas ela [a verdade] está lá.

POPline – Kat está presa e você já inicia o podcast avisando que ela não aceitou falar com você. Mas você teve acesso a Desirrê Freitas e Leticia Maia, as supostas traficadas por ela?

Chico Felitti – Tive acesso a todas as pessoas, inclusive a Kat. Contato direto ou indireto. No caso da Kat, indireto, mas falei muito com ela através da defesa dela e da família dela. Essa entrevista quase aconteceu algumas vezes. Essa vez que começa o podcast foi a vez que “era pra ir”. Foi o último dia de gravação do pocast. Vai, vai, vai, vai, vai… não vai. Eu acho um bom começo, porque mostra como essa história é de idas e vindas e como é complexa. Nada impede que ela fale. O podcast vai sair, talvez as pessoas comecem a falar a respeito, e ainda dá tempo de incorporar uma entrevista. O advogado dela sabe disso. A série tem nove episódios, mas podem ser 11 episódios, quantos forem precisos. Nada impede que ela fale no final, porque acho que seria do interesse dela elucidar e esclarecer tudo que aconteceu.

POPline – No podcast, você fala com um magnata de quem Kat Torres se aproximou por conta do Ayahuasca. Mas você opta por não dizer o nome dele, por medo de processo. Pelas histórias que você se envolve, a impressão que passa é que você é uma pessoa destemida. Do que mais você tem medo?

Chico Felitti – Inconsequente é a palavra! (risos) Não, mentira. Eu juro que avalio tudo e peso tudo. Meu advogado está aqui dando risada. Neste caso específico, optei por não dizer o nome desse herdeiro de Hollywood porque não faria falta à história. Se ele fosse alguém muito famoso no Brasil, o filho do Michael Jackson, eu teria dito. Mas ele é filho de alguém que só é famoso nos Estados Unidos. Não falei para evitar esse desgaste, e para contemplar o pedido dele. Ele me dá a entrevista, não sabe o que aconteceu com ela e, depois de um mês, ele me escreve “puta que pariu! Ela foi presa acusada de tráfico de pessoas!”. Eu respondi: “ué, porque você acha que eu estava fazendo um documentário sobre ela? Porque ela é bonita?”.

(Foto: Camila Svenson)

POPline – A Kat Torres sempre pega algo e transforma em algo muito maior. Agora ela tem um podcast só sobre ela. O que você acha que ela vai fazer com isso?

Chico Felitti – (faz um longo silêncio) Cara, te dou um spoiler, mas o final do último episódio do podcast é meio esse. O quanto o podcast pode servir para ela como uma ferramenta narrativa para ela conseguir outra reviravolta e outra volta por cima na vida dela. É não ser ingênuo. A gente está perdendo essa ingenuidade de que contar a história de uma pessoa não tem efeito nenhum. Você não conta uma história no vácuo. O caso da Margarida Bonetti teve efeitos tanto positivos, como o aumento das denúncias de suspeita de trabalho análogo a escravidão no Brasil, quanto efeitos negativos de gente que foi levar flor e dizer que era fã dela. Quem faz documentário, podcast e reportagem tem que assumir que a gente influencia a história que conta.

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