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Entrevista: ‘Hoje o estúdio é considerado um templo sagrado da música’, diz Constança Scofield, diretora da Toca do Bandido

Constança Scofield. Foto: Divulgação

Com pais ávidos consumidores de música, Constança Scofield fez sua iniciação musical em uma escolinha baiana, que levava os alunos para tocar para artistas em turnê na cidade. Foi ali, aos 7 anos, que a ‘sementinha’ foi plantada. Ela só germinou depois, em uma greve da faculdade de Direito, quando ela começou a tocar com Érika, parceria da banda Penélope.

O ‘Abril Pro Rock’, em Recife, foi o festival que revelou a banda Penélope e, com menos de dois anos de formação, o grupo assinou com a Sony Music

Banda Penélope. Foto: Divulgação

“Ouvimos falar do Tom Capone pela primeira vez quando estávamos buscando o produtor do disco e o conterrâneo Márcio Melo garantiu que o Tom era um bom nome, apesar da pinta, era sensível. O Tom chegou no estúdio uma semana depois de iniciada a pré-produção com o Antoine Midani. Foi amor à primeira vista, uma coisa sapiossexual, ficamos todos encantados com a genialidade dele, inclusive o Midani”, conta Constança Scofield sobre o seu encontro com Tom Capone, Produtor Musical.

Constança Scofield. Foto: Divulgação

No final daquele ano, Constança estava de mudança para morar com Tom Capone no Rio de Janeiro. À época, o Tom era a mais nova aposta do André Midani, que o contratou para ser o Diretor Artístico da Warner Music.

“Foi muito interessante como o estúdio veio. O Tom trouxe de Nova Iorque um grande amigo e parceiro dos tempos de Brasília, Alvaro Alencar, para ser seu braço direito. Alvaro é engenheiro/produtor formado na Berklee, hoje ganhador de 13 prêmios Grammy Latino. Ao lado de Álvaro visitei e dentre outras decidi pela casa no Itanhangá onde construímos o estúdio singelamente chamado de Toca do Bandido”, conta Constança Scofield.

Estúdio Toca do Bandido. Foto: Divulgação

Por 7 anos, Constança diz que viveu momentos extraordinários de surgimento e consagração de artistas produzidos por Tom Capone. Dentro e fora do estúdio, ela fala que testemunhou a excelência da direção artística e produção musical realizadas por ele. 

Constança Scofield e o desenho de Tom Capone. Foto: Foto: Gustavo Pellizzon/Agência O Globo.

Em 2003, Constança deu uma nova guinada na sua vida, só que desta vez na contramão da música. Ela saiu da banda Penélope, estudou e passou no exame de Ordem dos Advogados (OAB) e engravidou. 

No ano seguinte, no auge da carreira e com o maior número de indicações da noite, o Tom Capone morreu em um acidente de moto depois do Grammy Latino, em Los Angeles.

“Nosso filho tinha acabado de nascer. Foi um choque que durou alguns anos até eu encontrar um papel central à frente da Toca do Bandido. A certeza de que o show tinha que continuar e que um projeto com a minha cara iria ser construído ali só veio depois do meu encontro e casamento com o produtor musical Felipe Rodarte”, revela.

Constança Scofield. Foto: Divulgação

Ao entrar na vida de Constança, Felipe trouxe estrutura, segurança e raízes cariocas. Juntos, os dois tiveram mais um filho, retornaram e ampliaram o selo Toca Discos, um laboratório de desenvolvimento de novos artistas, lançaram duas edições da Aceleração Musical Labsonica Toca do Bandido, em parceria com Oi Futuro, e ainda tiveram 4 indicações ao Grammy Latino. 

Felipe Rodarte e Constança Scofield. Foto: Divulgação

“Hoje nosso catálogo beira mil fonogramas e estamos passando por uma estrutura para receber um grande parceiro investidor”.

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Em entrevista para o POPline.Biz é Mundo da Música, Constança Scofield, instrumentista, compositora, diretora artística, empresária, produtora musical e diretora da Toca do Bandido e do Selo Toca Discos, conta sobre a sua carreira e a sua visão sobre o mercado da música. 

POPline.Biz – Palco de gravações memoráveis para a música brasileira, Toca do Bandido possui inúmeras histórias. Quais aspectos você acredita que sejam diferenciais para o estúdio e as gravações que acontecem atualmente?

CS: O estúdio foi construído e equipado para ter capacidade de produzir os maiores nomes da música nacional e internacional. O projeto acústico foi assinado por Renato Cipriano, diretor de design da WSDG, na época e hoje  fundador e presidente da Sonic Arts.

A despeito do rigor com equipamentos, cabeamento todo projetado e executado pela Ground Control, do Paulo Lima, do arsenal de instrumentos e amplificadores, os materiais de demolição não tradicionalmente usados e o projeto arquitetônico da fachada foram inusitados e uma atitude inédita na época. 

Estúdio Toca do Bandido. Foto: Divulgação

O estúdio entrou em listas internacionais: “Breathtaking”, “Rubber Tracks”, sendo anunciado ao lado dos 12 mais icônicos do mundo por ninguém menos que Iggy Pop. Virou referência. A razão de ser desse projeto diferentão, orgânico, uma bioconstrução feita de tijolos de Adobe, era a mesma para todos os envolvidos: a criação de um espaço inspirador, livre, menos controlado e mais divertido. 

Hoje o estúdio é considerado um templo sagrado da música e as pessoas rendem muito respeito a toda a sua história e a forma como ele foi preservado e colocado à serviço da música.

Felipe Rodarte e Constança Scofield. Foto: Divulgação

POPline.Biz – Como uma influência global e pelas mudanças nos padrões de consumo, alguns aspectos são notados.

O primeiro deles é o “hibridismo musical” hoje, definir um gênero musical em um single, por exemplo, é cada vez mais difícil, pelas múltiplas influências. Como você enxerga esse cenário, sobretudo aqui no Brasil e com os novos artistas?

CS: O Tom gostava de dizer: “Quanto mais trabalho com música, menos acredito em fronteiras.” Isso no início dos anos 2000, hoje, esse cenário é ainda mais líquido não só no Brasil, como no mundo.

Vários fatores contribuem, como o fim do gargalo da produção, deixando o artista direta e livremente no controle da produção musical, além da possibilidade de uso de samples e reverência à produção musical da era de ouro da indústria incentivando releituras e uso de referências. 

No caso do Brasil, que tem uma cultura mais antropofágica, fazemos essa mistura há mais tempo, no entanto, nunca foi tão livre e perseguida a apropriação de estéticas musicais associadas ao sucesso. O aspecto ruim dessa mistura é um achatamento da criatividade. Precisamos sair pela tangente das fórmulas que funcionam, criar espaço para um novo novo. Uma nova música e não só uma troca de roupa. 

POPline.Biz – Em paralelo, se observarmos as faixas musicais, elas possuem cada vez mais introduções reduzidas, ou nenhuma introdução. Você acredita que a dinâmica do streaming, com as “taxas de skip” entre outros parâmetros de algoritmos, estão impactando na indústria musical? Como equilibrar a arte, dentro desses parâmetros?

CS: Com o mindset de A&R e Produção Musical fortes, profissionais capazes que auxiliem o artista em decisões como essas e dosem o uso com estratégia de concessões ditadas por algoritmos e padrões de consumo sem prejuízo à arte. 

Como funciona a atuação do Selo Toca Discos? O que você acredita que sejam oportunidades para o trabalho de um Selo, hoje em dia, e como funciona a prospecção de novos nomes artísticos?

CS: Um selo pode ser apenas o prestador de um serviço, sem nenhuma construção de catálogo. O label service é a terceirização dos departamentos artístico e de marketing do antigo modelo de gravadora. 

O Toca Discos, por sua vez, é um selo de produção que conta com quase mil fonogramas no catálogo e que se dedica ao desenvolvimento artístico e que tem como missão uma forte atuação junto a artistas  periféricos e aceleração da carreira de novos artistas mediante projetos. 

A seleção desses artistas ocorre após chamamento por edital, mas, em paralelo, produzimos trabalhos como The Baggios, Chico Chico e João Mantuano, Chal, dentre outros, que nos renderam 4 indicações ao Grammy latino, sincronização em filmes, séries e o jogo mais famoso do mundo: O FIFA Soccer.

Hoje acontece uma estruturação importante no selo que nos oferecerá a oportunidade de trabalharmos com artistas em um patamar diferente dos que temos trabalhado até então.

Selo Toca Discos. Foto: Divulgação

POPline.Biz – Ao lado do seu trabalho com a Toca do Bandido, você possui uma parceria com o Oi Futuro em um projeto de aceleração musical. Como iniciou essa parceria e quais os resultados você consegue elencar dessa experiência? 

CS: Na parceria com Oi Futuro, eu consegui reposicionar a Toca do Bandido como protagonista e não mais mero espaço de locação. Sinto muito orgulho e muita gratidão.

O Oi Futuro foi uma das primeiras instituições a nos apoiar e potencializar o nosso trabalho. Aprendemos muito e desenvolvemos metodologias com esta oportunidade. Além de colhermos resultados incríveis, como a sincronização no FIFA Soccer e no programa Falas Negras de canções do Caio Prado produzidas na Aceleração Musical Labsonica. Já está aprovado o 3° que acontecerá em 2024.

Foto: Unsplash

POPline.Biz – Um dos principais modelos de negócios do mercado musical, hoje em dia, são os festivais. Como você analisa esse mercado e pretende ter algum projeto similar?

CS: Com o forte patrocínio à cultura nas eras dos governos Lula e Dilma, o mercado de festivais independentes cresceu muito e permitiu a circulação e consolidação em um patamar midstream de artistas que não puderam ter gravadora. A curadoria desses festivais foi uma espécie de grande departamento de A&R em uma época em que as gravadoras estavam fazendo a longa transcrição entre o CD e os tocadores digitais. 

Hoje, no pós-pandemia, vemos uma sociedade ávida por viver o aqui e agora e nenhuma outra experiência é mais vibrante do que estar em um público de festival. O jornalista Antônio Carlos Miguel, por outro lado, analisou em artigo recente o esvaziamento e banalização da música nesses festivais, quanto maiores, pior a experiência musical. 

Conhecer esse ano a Sara Loiola, vice-presidente da Abrafin, e realizadores de festivais no ‘seminário Futuração’ do Oi Futuro reviveu o sonho de realizar um festival independente com a música no centro da Toca do Bandido no Rio de Janeiro.

POPline.Biz – Quais os novos projetos e iniciativas que você está envolvida? Quais as novidades do seu trabalho em 2023?

CS: O nosso foco este ano está totalmente voltado para o Toca Discos. Estamos estruturando para crescer e produzir projetos de artistas em outro patamar. Chegaram novos e velhos parceiros e juntos estamos preparando a casa para receber esse investimento. Ampliar nossa atuação no mercado tem a ambição de retomar a missão de celeiro musical do Estúdio Toca do Bandido, de abrigar uma música do futuro, diversa e plural. E já temos lançamentos importantes este ano, grandes apostas.

Foto: Unsplash

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