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Criolo traz discurso potente no álbum “Sobre Viver”: “São muitas camadas de emoção”

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

Já nos primeiros versos do novo álbum de Criolo, o “Sobre Viver”, lançado nesta quinta-feira (5), é possível perceber o mix de emoções que trabalho propõe. Transitando brilhantemente no contraste entre o amor e o caos, o rapper paulistano coloca o dedo na ferida sobre pautas tão urgentes quanto invisibilizadas, de forma poética, potente e acolhedora.

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

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E o disco chega como fruto de uma trilogia iniciada há onze anos, com a estreia do acalmado “Nó Na Orelha”, de 2011. Agora, Criolo traz o foco para o momento presente com relatos tanto autobiográficos quanto coletivos. Afinal, muito bem acompanhado, ele soma sua voz aos discursos de grandes artistas contemporâneos como Mayra Andrade, cantora de Cabo Verde, com quem divide o palco do Rock in Rio 2022, e em colaborações diversas com Liniker, MC Hariel, Jaques Morelenbaum, Tropikillas, Maria Vilani e Milton Nascimento.

Sem rodeios, mas com firmeza e ternura, Criolo versa sobre tempos difíceis e tristeza, com a perspectiva de quem acredita numa transformação positiva. Contrapontos que intrigam e conquistam no somatório de letra e música.

Alinhando-se ao “Nó na Orelha”, e o “Convoque Seu Buda”, de 2014, “Sobre Viver” fecha a trilogia de forma densa, abrindo pontes para diálogos sobre educação, racismo estrutural e religiosidade. Em entrevista exclusiva ao POPline, o artista, de 46 anos, falou sobre o construção do novo trabalho.

A ideia, segundo ele, é trazer luz sobre fé e resiliência. Criolo escancara o abismo social brasileiro na raiz de seu rap em pura poesia. “Nada foi racional, minhas emoções foram donas de tudo. As músicas são fortes, falam muito de mim, da minha família, recordei coisas lá de trás, de 1982, coisas que passei. Tem um tanto de uma rotina do que a gente já passou, de todas as barreiras que a gente conseguiu quebrar e as barreiras que se apresentam todos os dias”, conta.

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

São muitas camadas de emoção que juntas vão dando cor, ritmo, jeito, forma a essas poesias. Tem um sentimento de gratidão enorme”, avalia ele, que começa versando sobre o “Delírio do Kaos”, que seria a priore o título do álbum, inicialmente, até desaguar em Aprendendo a Sobreviver”. Canções que ganharam força com o tempo. Tudo isso após um período de incertezas.

“Fiquei durante um tempão sem escrever coisas, fiquei me questionando muito se eu lançaria um outro álbum. Porque é um recorte de muitos sentimentos e histórias. Em paralelo tem a sua vida, as suas historias”, reflete. O último álbum de inéditas, “Espiral de Ilusão”, de 2017, totalmente dedicado ao samba, traz um artista solar, numa época bem distante das tristezas de uma pandemia.

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

E, apesar das dúvidas acerca de seu caminho na música, as ideias, aos poucos, se transformaram em letras, que apontavam para a dura realidade ao qual a sociedade atravessa, com um espiral de esperança. Tanto que o trabalho se chamaria “Diário do Kaos”, mas ganhou um novo significado aos 45 do segundo tempo.

“A gente se deu conta de que o caos existe antes da pandeia e nosso povo está nos ensinando a viver em meio a toda essa tristeza e essa dor. Então, a mudança do nome do disco, o que sugere cada musica, cada título, sugere uma abertura de dialogo, já é um manifesto a partir do nome”

A aproximação com Tropikillas, e uma sequência de outros fatos, o fizeram externar percepções engasgadas até chegar ao estúdio. “Esse encontro, de um ano e meio para cá, também foi dando tempo de eu voltar para minha escrita. Os sentimentos me atravessam, mas não desaguavam, e, então, aconteceu de começar essa pulsação, de um modo muito natural começaram as primeiras construções do que seria esse álbum“, diz.

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

Na faixa “Pequenina”, por exemplo, Criolo canta com MC Hariel e Liniker, além da participação luxuosa da mãe, Dona Maria Vilani. Na faixa ele ainda celebra o arranjo do maestro Jaques Morelenbaum. O desabafo, chega em tom autobiográfico, levando ele a memórias de sua trajetória.

“São parcerias inimagináveis. Eu acho que foi incrível o rap conseguir unir Jaques Morelenbaum, Hariel e Liniker numa só canção. Hariel é muito incrível, já conheço de um tempão, é um menino incrível, é pureza e talento. E a doçura e, ao mesmo tempo, forte da Liniker traz uma temperatura para aquele texto, que tem um refrão provocativo, e ela conseguiu, uma maestria impar dar vida a esse refrão. Sem falar do arranjo de Jaques… É uma canção muito especial”

As colaborações são muito celebradas por Criolo. Apesar da costumeira parceira do artista com Bituca, da qual ele garante nunca tratar com naturalidade essa linda aproximação, os feats com o artista são sempre muito inesperados para ele. Fã declarado de Milton, ele se diz muito grato pela “generosidade”.

Criolo e Miltons Nascimento ficam em alta nas redes sociais após lançamento de clipe com releitura de “Não Existe Amor em Sp”. Foto: Fred Siewerdt / Divulgação

“Com o Milton é diferente, nunca vai haver naturalidade. Não dá, por mais que ele seja generosos e crie um ambiente para que você se sinta super acolhido… é algo surreal. O coração dele é gigante, o sorriso dele é o sorriso do Brasil, O Milton renova sua fé na humanidade. É muito amor envolvido”, declarou o rapper, que divide vocais com Bituca na faixa “Me Corte Na Boca do Céu a Morte Não Pode Perdão”.

Reafirmando seu nome entre os grandes do rap nacional, Criolo mostra que as feridas podem ser transformadas em algo positivo e coletivo. Em arte. As claras denúncias do racismo estrutural, da intolerância religiosa e até da negligência educacional passeiam pelas faixas, mas não em tom de amargura, mas como forma de construção de pontes.

“Então, infelizmente, é sobre nós: eu e minha família, a gente é o tema. Somos o tema central. É natural que seja a repulsa desse pulso. Então eu digo, a gente é o tema. Infelizmente, 2022 isso não acabou. Tem um tanto de gente que está comprando essa ideia, perdendo o pudor, a vergonha, e mostrando a cara. O país que mais mata gente preta e também a comunidade queer, e as pessoas agem como se nada estivesse acontecendo. É cruel. a ideia é levar, amor, esperança e afeto. Para gente reequilibrar essa balança”.

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

E foi através do rap, que o artista se viu mais do que acolhido, incentivado a falar de suas dores e delícias. “O rap sempre foi essa energia motora. Sempre me trouxe uma colhimento, me trouxe a noção de que você existe, tem sentimento e que o outro também tem sentimento. A arte tem essa delicadeza. A música é uma moldura e vocês são a tela”, conta Criolo.

Mas será que aquele menino que começou versando, e posteriormente dialogando sobre o amor em “essepê” um dia imaginou que seria indicado ao Grammy Latino, em 2019, e alguns anos depois seria convidado para cantar no palco do Rock in Rio?! É isso mesmo!

Criolo. Foto: Helder Fruteira / Divulgação

Em um dia totalmente dedicado ao rap, o festival confirmou  grandes nomes do gênero como atrações do Palco Sunset, para o dia 03 de setembro. Além do compositor de “Sobre Viver”, Racionais MC’s, Mayra Andrade, Xamã, Brô MC’s, Papatinho, L7nnon, MC Carol e MC Hariel se apresentam por lá. Em seu show, ele convida a cantora de Cabo Verde Mayra Andrade, que também está no seu álbum na canção  “Ogum Ogum”. Um omento apoteótico em sua carreira.

“É uma honra participar desse momento histórico do rap no Brasil. Eu nem acredito que fui convidado. Tem muita gente boa, o Brasil tinha que ter dez Rock in Rio por ano de tanta gente boa que tem. Eu fiquei honrado, e ter um dia todo dedicado ao rap, dar minha contribuição nesse dia… Eu estou doido pra ver como que vai sair”

 

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