Quanto vale uma foto com seu maior ídolo? Não, não é força de expressão. Não diga “vale tudo”, porque poderá ter que pagar isso. Na real: quanto? R$ 300? R$ 1.000? R$ 2.000? R$ 10.000? Tem gente que paga caro. E tem empresas especializadas em oferecer esse serviço – o Meet & Greet. O número de pessoas com acesso ao artista é limitado, e a quantidade de gente que quer entrar no camarim é enorme, então é pura lei da oferta e da procura: quando a procura supera a oferta, o preço de um produto ou serviço tende a subir. É a comercialização do afeto, do sonho de tirar uma foto, que ainda é algo relativamente novo na cultura pop.
Basta lembrar que, quando a banda brasileira Restart passou a cobrar para receber fãs nos bastidores dos shows, em 2011, foi um escândalo. E isso tem só quatro anos. Na época, Tico Santa Cruz, dos Detonautas, disse que o Restart estava “se aproveitando do fanatismo, do amor, do carinho e da ingenuidade dos pré-adolescentes e de seus pais para obter lucros de forma ridícula” e que “nenhum outro artista nesse país faz esse tipo de negócio”. Os meninos, na verdade, eram visionários, porque a prática se tornou corriqueira e comum, tanto no Brasil quanto no mundo. P9, Manu Gavassi e Fly são exemplos de brasileiros que cobram ou já cobraram por Meet & Greet – que é o famoso “oi, foto, tchau”, cheio de regras, que podem ir da proibição de pegar autógrafo ou entregar presentes diretamente até não abraçar, não beijar e… não tocar. Quem paga por esse serviço para artistas internacionais inevitavelmente ouve algo como “don’t touch” ou “no kiss, no hug”.
Mas dinheiro não é a única moeda de troca. Recentemente, Claudia Leitte se envolveu em uma polêmica ao dizer para fãs seguidores de Natal que não tiraria fotos com eles, para não prejudicar os usuários do Fanation. O que é isso? É outra forma de acesso ao camarim. Ela e o Psirico aderiram ao site, que promove gincanas mensais, onde os fãs acumulam pontos respondendo, curtindo e compartilhando os posts do artista. Ou seja: trabalha para bombar a rede social do ídolo. Em troca disso, pode conseguir o acesso. Para ir no camarim da Claudia, é necessário acumular 25 mil pontos. Por enquanto, a plataforma não envolve dinheiro, mas os termos de uso do site adiantam que haverá a possibilidade de “comprar pontos” no futuro.
É importante ressaltar que o Meet & Greet ou o Fanation, para os fãs, é uma medida opcional. Ninguém é obrigado a participar. Compra quem quer, fica 24 horas na Internet quem quer. É óbvio dizer isso, mas também é importante lembrar. A questão é que, em alguns casos, o artista deixa claro que se trata da única forma de chegar perto e tirar foto com eles. Claudia Leitte fez isso, no fatídico vídeo (na íntegra acima). Justin Bieber, em sua última passagem pelo Brasil, também. O pacote de Meet & Greet dele custou R$ 2,8 mil em 2013 (e esgotou em poucas horas). Quando fãs cariocas seguiram seu carro de madrugada pelas ruas do Rio, dizem ter sido maltratados. O cantor só tirou foto depois de muita discussão. Primeiro, disse que estavam invadindo sua privacidade. Era 4h da manhã. Naquele momento, então, ele condicionou o acesso: era só no Meet & Greet.
Há esse ponto também: os fãs seguidores. Muitos são conhecidos dos artistas pelo nome, porque estão em hotéis, aeroportos, porta de eventos, tudo. Sandy, Wanessa, Anitta, Biel e Ivete Sangalo são alguns brasileiros que lidam com esse tipo de fanatismo: o de colecionador de fotos. Claudia Leitte, por exemplo, disse que tinha intimidade com aqueles fãs que mendigaram fotos, autógrafos e abraços e ouviram “não” como resposta. Até que ponto é absurdo dizer “não” para uma pessoa que já tem um álbum cheio? É um caso a se pensar.
O fato é que o sonho dos fãs de conhecer o ídolo passou a receber mais barreiras. Seguidores, como esses do parágrafo anterior, recebendo não é a maior representação disso. Há diversas empresas especializadas na mercantilização do afeto: W+ Entertainment, Adventures In Wonderland, VIP Nation, entre outras. A foto, no caso, passou a ser o item básico, que pode custar alguns milhares de reais ou dólares. Há experiências ainda maiores. A turnê americana de Demi Lovato e Nick Jonas vende uma sessão de ping pong com o cantor por US$ 3,5 mil. Há pacotes de Meet & Greet de outros artistas que incluem transporte em limusine e um brinde de champanhe, entre outros excessos para tornar o momento mais especial. “Convenções” de séries de TV, por exemplo, acabam não passando de desculpas para vender a oportunidade dos fãs tirarem fotos com os ídolos. É tudo construído em volta desse único desejo.
E a “convivência”? Esse passou a ser o nome dado para almoços ou jantares de até 100 pessoas com um ídolo. Ex-RBDs vem ao país com regularidade realizar esse tipo de evento, que não sai por menos de R$ 1 mil. Às vezes, o artista nem almoça de fato com os fãs e só aparece depois que a refeição já terminou para responder uma pergunta de cada um e tirar as fotos do serviço contratado. Os lugares na mesa, mais próximos ou distantes do ídolo, podem ser sorteados. No Rio de Janeiro, uma vez um fã conseguiu entrar no hotel e pedir uma foto com a Anahí e ela disse que o Meet & Greet era só no dia seguinte.
Forte crítico do condicionamento do acesso dos fãs ao camarim, Tico Santa Cruz já escreveu vários textos sobre o assunto. Segundo ele, “aquele que gosta do seu trabalho deixou de ser alguém que nutre algum sentimento por ti e passou a ser uma potencial fonte de renda. (…) Esses artistas que adotaram tal prática resolveram dar preços a coisas que não tem preço. E, como as gerações mudam e os costumes também, centenas de milhares de pessoas passaram a pagar para receber alguma atenção. (…) Não parece saudável associar respeito e consideração a valores financeiros. No entanto… na sociedade atual, a mercantilização do afeto parece ser algo aceitável. Pensem como quiser. Se vocês jovens acham justo pagar para ter algo que não se vende… comprem sem medo. Mas lembrem-se… Num mundo onde tudo se vende – nada se vale”.
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