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‘Classe média do pop’: como o streaming criou artistas que talvez nunca cheguem ao estrelato?

The New York Times aponta que mesmo sem sucesso comercial expressivo, artistas são tratadas como superestrelas graças as suas bases de fãs
Kim Petras, Ava Max e Sabrina Carpenter. Foto: Divulgação.

The New York Times publicou uma matéria sobre a chamada ‘classe média do pop’, termo cunhado para artistas que têm visibilidade na internet, com inúmeros seguidores, mas não alcançam as paradas de sucesso, como ‘The Loveliest Time’, o sétimo álbum da cantora Carly Rae Jepsen que, segundo o artigo, talvez seja considerado como o maior disco do ano. Mas é provável que o ouvinte médio das rádios que tocam só os 40 maiores sucessos das paradas americanas não o tenha ouvido. 

Na parada Billboard 200  publicada na semana seguinte ao seu lançamento, no mês passado, ‘The Loveliest Time’ não constava da lista. A base de fãs online de Jepsen, muito ativa, faz parte de um ecossistema conhecido como ‘Stan Twitter’. Um passeio por “contas de atualização” administradas com cuidado, como @PopCrave e @chartdata, gera a impressão de que estamos em uma era dourada para o pop puro, assim como  aconteceu no período dos anos 2010 em que Katy Perry, Lady Gaga e Rihanna dominavam o mercado da música.

Nas redes sociais, artistas como Kim Petras, Ava Max, Sabrina Carpenter, Bebe Rexha, Rina Sawayama, Rita Ora, Troye Sivan e outros, estão em constante visibilidade e muitas vezes se tornam “trending topics”. Para seus fãs fiéis, eles são estrelas pop – pelo menos de acordo com os critérios da internet, diz o artigo.

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Mas, o que acontece quando um artista pop não é tão popular?

Artistas pop não tão populares, segundo o artigo do The New York Times, são celebridades com número considerável de seguidores nas mídias sociais. Eles podem ter desfrutado de alguma forma a popularidade, como um sucesso no ranking Hot 100 da Billboard, um viral no TikTok ou alguns fãs que permite lotar shows em casas de espetáculos de médio porte. No entanto, ainda não conseguiram dar o salto para a corrente dominante da música comercial, ou não conseguiram manter seu espaço nela.

No lugar disso, esses artistas constroem carreiras, segundo o artigo, com base em um metapop viciante e de tom vívido, músicas que parecem abordar e brincar ativamente com as figuras de estilo da história do pop, com a ajuda de bases de fãs que as tratam como se fossem sucessos tão grandes quanto Taylor Swift. Para esses artistas, o estrelato pop não é uma categoria comercial, mas um som, uma estética e uma atitude.

O The New York Times aponta que a  economia do streaming criou estrelas pop que talvez nunca cheguem a obter o sucesso viral ou o apoio de grandes gravadoras necessário para atingir as paradas ou lotar estádios, mas que, mesmo assim, têm bases de fãs dedicadas e uma renda constante com turnês e licenciamentos, o tipo de modelo no qual os músicos independentes confiam há anos. Segundo o artigo, isso oferece um caminho em direção a algo que, durante décadas, se mostrou ilusório para muitos aspirantes a estrelas pop: uma carreira sustentável.

Algumas dessas cantoras, como Jepsen e Charli XCX, conseguiram um (ou alguns) sucesso(s) no início de suas carreiras, antes de se estabelecerem na classe média do pop. Já outras, como Rexha e Max, fazem sucesso em nichos musicais, em geral na dance music, mas ainda não conseguiram se consolidar como nomes conhecidos. 

Rita Ora,  por exemplo, um sucesso nas paradas de sucesso no Reino Unido, construiu uma base de fãs que a cultua, em parte com base no fato de que ela parece não conseguir se firmar nos Estados Unidos seu álbum mais recente, ‘You & I’, não entrou nas paradas de sucesso, após seu lançamento em julho. Ainda segundo o artigo, como acontece no caso de muitas dessas estrelas, os fãs de Ora a adoram exatamente porque ela não é bem-sucedida.

Artistas como Sawayama e Caroline Polachek fazem música com pouco impacto comercial, mas tem um som de tendência pop que lhes permite montar shows ao vivo em estilo e estética pop, aponta o artigo. Enquanto Sivan e Carpenter parecem estar à beira do estrelato genuíno e, ocasionalmente, encaixam um sucesso nos postos mais baixos dos 100 mais das paradas.

Petras apresenta seu trabalho como uma espécie de metacomentário sobre a natureza do estrelato pop propriamente dito, aponta o artigo. O seu álbum de estreia, ‘Feed the Beast’, que foi disponibilizado em junho, é construído em torno de batidas crepitantes de EDM, ‘hooks’ grudentos e o sucesso: ‘Unholy’, que chegou ao topo das paradas com Sam Smith e ganhou um Grammy em fevereiro. 

‘Unholy’ transformou Kim Petras em uma estrela pop? Não exatamente, de acordo com The New York Times. Isso porque ‘Feed the Beast’ estreou na 44ª posição da parada Billboard 200, vendendo o equivalente a 17 mil cópias. O disco saiu da parada depois de apenas duas semanas. Já o single ‘Alone’, que conta com a participação de Nicki Minaj, ficou uma semana no Hot 100 em maio.

O single de estreia de Ava Max, uma faixa sintetizada e dançável chamadaSweet But Psycho, alcançou a 10ª posição em 2019. Desde então, ela vem seguindo uma fórmula semelhante, mas com retornos decrescentes, segundo The New York Times.

O último álbum de Max, ‘Diamonds & Dancefloors’, só ficou uma semana na parada de álbuns. Carpenter alcançou a fama como estrela do Disney Channel e se estabeleceu como um sólido sucesso pop de médio porte com ‘Emails I Can’t Send’, que foi lançado no ano passado. É seu quinto álbum e, até agora, o com maior recepção, e traz ‘Nonsense’, single que alcançou a 56ª posição no Hot 100

Rexha tem 11 milhões de seguidores no Instagram, uma multidão de ‘Rexhars’ dedicados, online, e um single recente no Top 5, ‘I’m Good (Blue)’, em colaboração com David Guetta. Mas, como acontece com tantas outras estrelas pop que estão trabalhando atualmente, sua visibilidade parece estar completamente dissociada de seu desempenho comercial.

O artigo explica que o ponto em comum que une esses artistas é o fato de não tratarem a ‘música pop’ como uma categoria comercial, mas como uma linhagem musical separada, dotada de códigos e convenções próprios a serem explorados e reinterpretados. É um ponto de vista que se tornou possível graças ao tipo de fama que a internet cria e promove: a ideia de que o termo ‘popstar’ é uma medida de influência ou reconhecimento de nome, não um distintivo diretamente relacionado ao sucesso comercial.

“Essas estrelas do pop produzem basicamente canções de nicho”

Essas estrelas do pop produzem basicamente canções de nicho, observa o artigo. Ao contrário de predecessoras que pilhavam o underground em busca de novos sons para levar ao mercado comercial, parecem viver uma fixação pela própria história do pop. De muitas maneiras, faz sentido que sejam consideradas como Estrelas Pop (com letra maiúscula), pelos habitantes de um mundo tão obcecado por referências quanto o Twitter, grande parte de sua música parece ter sido feita por e para fãs fervorosos.

O recente single de Sivan, ‘Rush’, que alcançou a 76ª posição no Hot 100 no mês passado, combina um house inebriante ao estilo dos anos 2000 com um refrão irônico que lembra o Village People. Os três álbuns completos de Petras funcionam como pesquisas sobre o pop dançante ao longo dos tempos, menos preocupados com sons de ponta do que com homenagens carinhosas. A bricolagem pop de Sawayama faz referência a Shania Twain, Lady Gaga, Linkin Park e à lenda do J-pop Utada Hikaru.

De muitas maneiras, o pop mesmo está encolhendo, de acordo com o artigo. Atualmente, o Hot 100 é povoado por músicos country, como Morgan Wallen e Luke Combs, criadores de sons regionais, um exemplo de Rema e Peso Pluma, e estrelas do rap, Travis Scott e Gunna. Com exceção de alguns artistas, como  Taylor Swift e Miley Cyrus, relíquias de uma época em que a música convencional era dominada por estrelas pop reluzentes, há poucos cantores pop nas paradas de sucesso atuais.

Para outras estrelas pop contemporâneas, o próprio ato de lançar música parece pouco relacionado ao seu status como celebridades. Nos últimos anos, Kesha — uma das forças comerciais dominantes da década de 2010, depois de garantir 10 sucessos no Top 10 em seus primeiros quatro anos de carreira – se tornou conhecida menos por sua música do que por sua longa batalha judicial com o produtor Dr. Luke.

Ainda uma figura fixa no ‘X’, anteriormente conhecido com o Twitter, e nos jornais sensacionalistas, a música de Kesha é frequentemente a coisa menos discutida sobre ela. Seu último álbum, Gag Order, estreou em 187º lugar em maio, vendendo o equivalente a 8,3 mil cópias em sua primeira semana.

E ainda há Charli XCX, que passou grande parte de sua carreira gravando discos com uma série de colaboradores do mundo do hiperpop e da música eletrônica experimental. No passado, uma cantora com potencial comercial claro —durante os primeiros anos de sua carreira, Charli obteve sucessos no Top 10 do Hot 100, incluindo uma colaboração com Iggy Azalea, ‘Fancy’, que chegou ao primeiro lugar.

No seu quinto álbum, ‘Crash’, lançado no ano passado, foi descrito pela própria Charli como seu “principal momento de garota pop” e estreou em sétimo lugar, sua posição mais alta no Billboard 200. Neste mês, o single ‘Speed Drive’, escrito para a trilha sonora de Barbie, se tornou seu primeiro lançamento a chegar ao Hot 100 em nove anos. O artigo diz que isso deixou bem clara a situação: ela pode perfeitamente ser uma grande estrela pop, se assim escolher.

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