Em 2019, quando “Vingadores: Ultimato” se tornou a 2ª maior bilheteria da história do cinema, ninguém imaginava a crise pela qual a Marvel Studios passaria nos anos seguintes. Alguns dos sinais já estavam lá, como o desgaste da famosa “fórmula Marvel“, mas nem mesmo o melhor roteirista pensaria em tantas reviravoltas como as que estamos vendo na vida real. A situação é complexa, mas para melhor entender como chegamos num cenário de baixas bilheterias, demissões, críticas negativas, adiamentos e mais, nós preparamos um verdadeiro dossiê da crise. Dá só uma olhada:
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CGI ruim
Após encerrar a Fase 3 com “Homem-Aranha: Longe de Casa“, em julho de 2019, a Marvel estava pronta para iniciar a Fase 4 ano ano seguinte. Porém, a pandemia de COVID-19 virou tudo de cabeça para baixo, e a Casa das Ideias precisou replanejar seu calendário de lançamentos por completo. Com cinemas fechados no mundo inteiro, 2020 ficou marcado como o primeiro ano em mais de uma década sem estreias do estúdio.
2021 trouxe esperança para a indústria do entretenimento, e em janeiro chegou ao Disney+ a série “WandaVision“. Apesar de bem avaliada pelo público e crítica, conquistando inclusive três Emmy Awards, os lançamentos seguintes não tiveram a mesma recepção das duas comunidades. Enquanto isso, nos cinemas, “Viúva Negra” deu o pontapé inicial em uma crítica que perdurou por praticamente todas as produções da Fase 4: o CGI ruim. Para alguns, a justificativa na queda da qualidade dos efeitos visuais de longas com orçamento multimilionários era outro problema…
Muitos lançamentos vs. Pouco tempo
Num período de apenas dois anos (2021 e 2022), a Marvel Studios lançou 15 novas produções entre séries e filmes. Para efeito de comparação, a antecessora Fase 3 teve ao todo 11 estreias num intervalo de quatro anos (de 2016 a 2019). Com prazos cada vez mais curtos para as equipes de pós-produção, muitos títulos foram prejudicados em prol de uma agenda intensa que, na ânsia de expandir o Universo Cinematográfico da Marvel, expôs falhas e gerou desinteresse. Artistas do setor de efeitos visuais chegaram inclusive a denunciar as más condições de trabalho dentro do estúdio.
Do lado dos espectadores, uma boa parcela do público-alvo não conseguia dar conta de acompanhar todos os lançamentos no ritmo imposto pela Disney. Fatores como a constante necessidade de assistir várias produções antes de dar play em uma nova, para fins de contextualização da obra, e as confusões na cronologia, também contribuíram para o abandono de títulos pelo caminho. O que deveria ser uma experiência de entretenimento virou um esquema de pirâmide, e o resultado foi observado em números.
Baixas bilheterias e quedas de audiência
Mesmo com grandes campanhas de divulgação, títulos como “Doutor Estranho no Multiverso da Loucura“, “Thor: Amor e Trovão” e “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” não conseguiram ultrapassar a casa do bilhão na arrecadação internacional, algo que antes era fácil pra Marvel. “Eternos“, por exemplo, que contratou a diretora vencedora do Oscar Chloé Zhao, só arrecadou pouco mais de US$ 400 milhões no globo. Enquanto isso, no Disney+, as séries originais também patinaram.
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A estreia de “Gavião Arqueiro“, por exemplo, teve audiência 40% menor que o piloto de “Loki” segundo dados da Samba TV; ao passo que “Ms. Marvel” teve a pior audiência de uma série em live-action do estúdio na plataforma de streaming. No fim das contas, foi “The Boys“, do Prime Video, que teve a maior audiência de uma série do gênero de super-heróis em 2022, de acordo com números da empresa Nielsen, que mede audiências globais.
Críticas negativas
Com efeitos visuais a desejar, tramas repetitivas com excesso de personagens, falhas de roteiro e soluções simplórias, não demorou muito para que a crítica e o público em geral demonstrassem seu descontentamento. Na plataforma Metacritic, por exemplo, que reúne avaliações de filmes e séries de profissionais especializados e usuários comuns, mais da metade dos longas da Fase 4 tiveram aprovação medianas. Porém, o pior ainda estava por vir…
Em fevereiro de 2023, a Marvel Studios iniciou oficialmente a Fase 5 com a estreia de “Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania“. Dirigido por Peyton Reed e com roteiro escrito por Jeff Loveness, o terceiro filme solo do super-herói serviu para introduzir o sucessor de Thanos no cargo de principal vilão do MCU: Kang, o Conquistador (interpretado por Jonathan Majors). Contudo, a nova ameaça não foi párea para o real desafio enfrentado pelo longa-metragem: o bombardeio de críticas negativas. Empatado com “Eternos” como o filme mais mal avaliado da Marvel no Rotten Tomatoes, o título também foi o que menos arrecadou da trilogia.
Demissões, adiamentos e até prisões
Iniciar uma nova etapa de seu universo compartilhado com tamanha baixa adesão do público e da mídia acendeu um sinal de alerta na Marvel. No entanto, alguns meses antes o estúdio já enfrentava outros problemas. Em setembro do ano passado, foi noticiado que Bassam Tariq havia abandonado a direção de “Blade“, estrelado por Mahershala Ali. O roteiro do longa também precisou ser revisto. Já a série “Armor Wars” foi convertida num filme, para diminuir as horas de trabalho das equipes.
Depois, em outubro, vários títulos tiveram suas datas de estreia adiadas, incluindo o vindouro “Vingadores: Guerras Secretas“; que só chegará às telonas em 2026. Em fevereiro desse ano, “The Marvels“, que chegaria aos cinemas em julho, foi empurrado para novembro, mas ainda em 2023 (pelo menos por enquanto).
A cereja do bolo da crise chegou nos últimos dias. Na semana passada, Victoria Alonso, uma das produtoras mais antigas da Marvel Studios, foi demitida pela Disney. No início de sua carreira, ela ocupava o cargo de chefe de efeitos visuais e pós-produção, mas depois de “Vingadores” (2012) se tornou produtora executiva; e em 2021 virou presidente de pós-produção, efeitos visuais e animação. Segundo sua advogada, a demissão se deu pelo fato de Victoria se recusar a borrar uma bandeira LGBT em “Homem-Formiga 3“, para que o filme tivesse sua exibição aprovada no Kuwait. Contudo, rumores afirmam que ela tinha um comportamento tóxico com seus funcionários.
Depois, no fim de março, Isaac “Ike” Perlmutter, executivo da Marvel Entertainment, também foi demitido como parte de um plano de corte de gastos. Ele atuava como presidente dos produtos de consumo do estúdio desde 2015, mas estava dentro da empresa desde 1993. Sua presença em altos cargos incomodava uma parcela do público e da diretoria da Marvel, já que ele tinha uma postura conservadora e se recusava a aprovar filmes protagonizados por mulheres, negros e outras minorias.
Por fim, os filmes “Thunderbolts” e “Quarteto Fantástico” tiveram que contratar novos roteiristas, numa tentativa desesperada do estúdio em evitar erros recentes e voltar a agradar a crítica e o público. Além disso, Jonathan Majors foi preso acusado de agressão, colocando a Marvel Studios num dilema interno se deve ou não contratar outro ator para assumir o papel de Kang.
E o futuro?
Mesmo com todos os problemas, e com mais chances de dar errado do que certo, ainda não é possível cravar com 100% de certeza se a Fase 5 do UCM será um sucesso ou um fracasso. A estreia de “Guardiões da Galáxia Vol. 3“, no mês de maio, deve indicar o que virá pela frente. O filme marca o último trabalho de James Gunn na Marvel Studios, que agora ocupa o cargo de co-CEO da DC Studios; mais um sinal da crise dentro do setor de super-heróis na Disney.
No entanto, uma coisa é definitiva: o gênero de super-heróis precisa se reinventar. O público já está saturado de produções genéricas que reutilizam a mesma fórmula, vilões mal-construídos com motivações fracas, e histórias sem profundidade que dependem de cenas pós-créditos para valer a ida ao cinema. Se há pouco mais de dez anos a Marvel descobriu a receita do sucesso com a exploração de um universo compartilhado, hoje ela sofre com as limitações de sua própria estrutura e a maneira que ensinou o público a consumir seus títulos.