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Rael visita a Casa do POPline, fala sobre o novo álbum “Capim-Cidreira” e exalta o amor como “cura”

Rael lançou na última semana o seu quarto álbum de estúdio. “Capim-Cidreira” traz parcerias inusitadas como o sambista Thiaguinho e a fofurice do trio Melim, o que mostra o quanto o rapper queria dialogar com outros segmentos musicais. E a sintonia foi total ao escolher tais participações que à sua maneira falam de amor. “Eu precisei ter pensamentos que não conseguia brecar para pra entender a importância de falar em amor próprio. É importante falar sobre isso, até mesmo para desmistificar. Acredito que as palavras têm poder de cura”, disse.

Em sua agenda de divulgação houve espaço para uma visita à Casa do POPline para um bate-papo bem franco e descontraído com a repórter Pamella Renha. Confira abaixo:

Rael visitou a Casa do POPline e fez um registro com parte da equipe do site

POPline – Eu estou super feliz em anunciar que teremos uma entrevista incrível com um cantor que eu gosto há muitos anos já. Ele se chama Rael e acaba de lançar um disco maravilhoso. Caso você não tenha escutado, escute. O nome do disco é “Capim-Cidreira” e no momento atual é um dos álbuns que mais me deixou feliz no ano de 2019.
RAEL – Que massa, Pamella. Muito obrigado pelo espaço por podermos falar de música. E eu fico muito feliz do álbum ter chegado dessa maneira em você. A intenção dele era essa mesmo. Uma coisa positiva, que trouxesse um pouco de calma, que nos fizesse respirar.

O álbum se chama “Capim-Cidreira”, que por sinal é um chá bem gostoso, mas por que você escolheu essa erva pra dar nome ao disco?
É uma história meio longa. Esse disco seria produzido pelo Miranda, mas ele faleceu, infelizmente. E aí me vi nessa missão de produzir o disco. Daí mudei meu estúdio, fiquei empolgado e tal. E daí precisava dar um nome. Dei o nome de “Horta”, estúdio Horta, Horta Music… E por conta disso me aproximei mais desse universo das plantas. Aí já lembrou minha avó, que quando a gente era criança e estava no quintal muito agitados, ela já chamava a gente pra tomar um chá de capim-cidreira. Então quando dava a hora dos nossos pais nos buscar, aquela agitação já tinha baixado. E aí no meio do caminho eu tive um pequeno traço de depressão e vi que era isso que eu precisava. Vi que na medicina popular o capim-cidreira tem propriedade anti-depressiva, abaixa o stress, é relaxante, é desintoxicante e vi que tinha tudo a ver. Era isso que eu queria passar através das músicas. Essa conexão com a natureza foi muito importante pra mim. Tenho sentido todo mundo muito disperso, as redes sociais nascem desse sonho de conectar as pessoas globalmente mas só tem feito o contrário. É muito discurso de ódio, polarização, meio que desconectado as pessoas. E eu não queria ser só mais um falando das coisas do mundo porque nem eu tô entendendo o que está acontecendo. Por isso queria falar de amor, que é a coisa mais real que a gente tem. Quando você começa a ver a gratidão, as coisas que a vida traz, você começa a ver beleza nas coisas. Isso me ajudou e hoje estou suave porque tive essas percepções sobre o quanto a vida é sagrada. “Bença Mãe”, que é a faixa de abertura do disco, é até uma oferenda, agradecendo todas essas forças da natureza e tudo que nos proporciona de bom e essencial pra gente viver.

Isso é ótimo. Quando você fala de amor próprio, a gente acaba esquecendo porque a gente é obrigado a amar tantas coisas, pessoas e a gente não é tão educado a se amar. E aí acabou virando quase um sinônimo de egoísmo e não é. E é lindo quando você consegue ver isso na arte, que tá no seu disco. Está bem na cara, o amor próprio, o amor ao próximo, o amor à natureza. Isso é muito bonito. Parabéns mesmo. O álbum foi gravado nesse período complicado pra você que foi esse da depressão. E coincidentemente estamos em setembro e é super importante falarmos disso. Pode ser contraditório, mas é um álbum que você gravou enquanto estava ‘na bad’ e você se transformou numa coisa positiva. É um álbum ‘good vibes’. Como você conseguiu puxar essa energia toda? Porque é muito mais fácil falar de tristeza quando a gente está triste…
Na verdade eu estava indo pra esse caminho. Mas eu vi que algumas músicas iriam atrapalhar na hora do show. E vi que não era esse o caminho. Eu não estava conseguindo me conectar. As instrumentações eram mais pesadas, mais dark. E daí comecei a me lembrar de momentos que estava mais feliz. Lembrei de um show do Jorge Ben Jor fazendo trenzinho com pessoas que eu nem conhecia durante “Taj Mahal”. Daí pensei que teria de ser algo assim. E tem um pouco disso no disco também. A música “Sempre” fala disso. Mas eu talvez tenha conseguido fazer esse disco desse jeito porque passei por esse processo. Eu tinha que viver isso. Serviu para um autoconhecimento. A gente que vem de quebrada é muito durão. A gente não pode falar que vai fazer terapia ou que tá depressivo e os caras mandam a gente se foder. Então a gente acaba não resolvendo questões internas e uma hora isso tudo aparece. Comigo aconteceu assim, procurei ajuda, mas vi também que existe vários tipos de capim-cidreira. Não são apenas os remédios. Depende muito de você, da sua cabeça. Achei várias formas de capim-cidreira. Colocar um fone no ouvido e correr, cuidar do corpo e da mente e não ficar só ali maquinando. Música também foi importante. Daí consegui me conectar com essa vibe. Uma vez eu tava na Tailândia, de férias, e pensando “tenho que gravar um single, tenho que gravar um single”. Não curti as férias porque eu só pensava em chegar no Brasil e já gravar. É isso que acontece. A gente não está vivendo o agora e está muito preocupado e tenso.

Vi que você fez uma viagem a três países na África. Isso influenciou no processo criativo?
Total. Fui primeiro pra Luanda, capital da Angola. Já tinha ido à África do Sul, mas lá não é necessariamente a parada da África. Tem muita influência inglesa, holandesa. Você não consegue absorver a energia da música africana. Daí fui pra Luanda e foi muito massa. eles falam português, o que facilitou bastante. Depois fui pro Zimbabwe e pra Tanzânia. E o que me pegou foi o lance da música e da dança deles. A faixa “Beijo B” tem essa influência. Foi a única que eu não produzi. Foi produzida por um cara chamado 2B, acho que ele é nigeriano. Eu achava que no início o som tava meio parecido demais, meio trap e tal e eu queria ouvir outras coisas. Daí descobri o afrofusion, que é uma vertente do afrobeat e eles misturam coisas atuais, eletrônico, timbres, e isso toca em tudo que é lugar. Voltei pro Brasil com isso e tinha tudo a ver. Consegui mesclar esse som com a música brasileira. A “Beijo B” ficou uma parada que não parece com o que faço e nem com o que o Thiaguinho faz e surgiu uma coisa nova.

Já que você falou no Thiaguinho, você é muito conhecido por fazer o rap flertar com outros estilos musicais. Você gravou com o Melim a faixa “Só ficou o cheiro”. O que fez você escolher esses dois artistas?
Foi muito natural. Quando você começa a fazer um disco, você não sabe o que vai vir. Não rola de começar um projeto já com fulano como convidado. As participações nesse disco rolaram da seguinte forma: com o Thiaguinho começamos a ter aproximação por causa da música. Gravamos algumas coisas, colei no “Tardezinha” pra cantarmos uns sambas juntos. Temos o mesmo gosto de grupos de samba dos anos 90. E aí quando comecei a gravar o disco avisei a ele que quando aparecesse algo eu chamaria ele. Admiro ele como fã e como pessoa. O Melim foi o mesmo princípio. Eles me chamaram pra fazer um som e eu tava começando a fazer o “Capim-Cidreira” e então eu estava com a cabeça cheia, embora tivesse gostado da música. Daí encontrei eles na estrada e pegamos uma sintonia. Eles ficaram pra ver um show meu, eu vi parte do show deles também. E achei que eles tinham tudo a ver com o disco porque o som deles é good vibes também. Os clipes são sempre bonitos, solares. Tinha tudo a ver.

Tem outra música que achei bem interessante que foi “Greenga”. Não só pela musicalidade, mas pela brincadeira do “verde” e pela sonoridade. Porque você misturou essas duas coisas. Você canta em inglês, inclusive.
Tem uma história nos EUA sobre o green card. Às vezes os caras que mais tentavam fazer eram os mexicanos, que tentavam levar maconha pra lá e ficou essa coisa do green, green card. Daí misturei as coisas. O disco tem essa cara de natureza e daí quis me conectar com essa parada. Foi uma história que vivi na minha primeira turnê em 2008, com o Pentágono. A gente jovem lá, vendo as meninas, elogiando elas mas em português e elas não entendiam nada. Era sobre isso.

A gente tava falando sobre parcerias antes. E eu tenho uma pergunta que acaba sendo mais pessoal mesmo. Em 2017 você foi indicado ao Grammy Latino com o projeto “Língua Franca”. A música “A Chapa é Quente”. Apesar dessa troca que a gente acaba tendo musicalmente com a galera europeia, americanos, enfim, sinto que a nossa música latina não é tão explorada a ponto de um trocar com o outro. E tem vários rappers super interessantes na América Latina. Você tem curiosidade de um dia fazer uma parceria com um rapper que seja latino-americano?
Conheci o trabalho do Residente. Ele é muito grande lá. Esse ano do Grammy foi da hora. Estava indicado com o Emicida nisso e meu álbum também foi indicado em outra categoria. Fui pra lá e comecei a conhecer a cena. Eles são gigantes lá. Mas acho que é um esquema que a gente pula no caminho. O mundo inteiro se espelha no mercado europeu e norte-americano. Mas a gente deveria fazer mais conexões com eles sim.

Também acho. A língua é uma barreira já que falamos português e eles espanhol, mas eles conseguem se comunicar entre si, mesmo um sendo de Porto Rico e outro do Chile.
A comunidade latina é muito forte nos EUA. Hoje a música deles está dominando tudo por lá. Eles tem as labels nos seus devidos países e dominam nos EUA. De ver os out doors, as propagandas e tudo mais. Fui numa festa que teve um dia antes da premiação e vi show da Karol G, do Bad Bunny, J Balvin tava lá. E eles são bem unidos.

O disco fala muito sobre os orixás. Isso tem a ver com sua viagem pra África ou é um jeito de agradecimento? Você cita muito sobre Ogum e o capim-cidreira é uma das ervas de Ogum. Então achei interessante essa analogia.
Eu não tenho nenhuma religião na verdade. Minha tia tinha um terreiro. Minha mãe é católica. Ia à igreja até os 12 anos. Minha mãe e as amigas dela achavam que eu seria padre. E eu falava que não era isso. Mas já fui em reuniões budistas, vou no terreiro de vez em quando tomar uns passes, porque acho que existe um preconceito muito grande sobre as religiões de matriz africana. Então isso é um modo de eu mostrar às pessoas que cada orixá representa um elemento da natureza. Falo muito de orixás porque foi a maneira que conheci mais sobre a natureza. Uma outra forma. Como se fosse a mitologia grega, que também tem essas co-relações. No mesmo período que eu tava produzindo e gravando esse disco, eu estava fazendo shows com músicas de Vinicius de Moraes. É o poder da palavra entrando no papo de novo. Se você fica repetindo aquele nome da entidade várias vezes, dos orixás, isso começa de certa forma a fazer parte de você. É um lance de você ficar louvando. Os afro-sambas é do começo ao fim falando disso. E inevitavelmente acabou vindo para minha música.

Por fim gostaria muito de agradecer por você ter feito um disco desse porque em 2019 temos passado por tempos muito difíceis e ter um álbum que é tranquilo, gostoso de ouvir em qualquer situação é muito bom porque a gente fica ouvindo tanta coisa ruim por aí, não musicalmente, mas que te abala de alguma forma. Esse é o meu motivo de ouvir seu álbum. Mas e você? Se você pudesse deixar uma mensagem para que as pessoas ouvissem seu disco, qual seria o motivo?
O “Capim-cidreira”, em fusão com a sua mente e seu coração, pode ser consumido através de música. Espero que gostem. Mas se não gostarem, não tem problema. Podem indicar ao inimigo, [risos]. Se amem cada dia mais. Eu estou numa fase que pego o jornal e nem leio as notícias. Vou direto pra parte de shows, vejo meu signo… E às vezes a gente precisa viver. Temos que absorver o que ela nos traz de bom. Por que se a gente só ficar vendo notícias ruins e fomentando essa parada, a gente fica mal. Precisamos agir e pedir forças pra mudarmos essas coisas.

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