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Pride POPline

Pride POPline: Kaya Conky fala em expandir seus horizontes na música e combater preconceito com trabalho

A gente já apresentou aqui o objetivo da série de entrevistas Pride POPline que começa oficialmente agora. É hora de darmos voz ao primeiro nome convidado a participar de um papo inclusivo, aberto e militante – porque sim!

Nascido em Fortaleza (Ceará), mas residente em Natal (Rio Grande do Norte), Igor ou Kaya Conky vem aos poucos beliscando um pedaço da atenção de quem vive fora do mundo LGBTQ. Como muitas artistas do meio, Kaya descobriu o que queria fazer com a ajuda da série “RuPaul’s Drag Race” e vem usando também a música para expandir seu trabalho. Em 2016, Kaya lançou a música “E aí Bebê” como uma espécie de teste e a boa recepção acendeu a ideia de partir para um EP. “Sabe Que Vai, Pt. 1” entrou nas plataformas de streaming no ano seguinte e a repercussão de mais uma música tirada do projeto, “Bumbum Tremendo”, deu gás para que os planos aumentassem este ano. É sobre esse assunto, a arte drag, críticas, preconceito e superação que ela abre o jogo logo abaixo.

Primeiramente, oi Igor! A gente queria começar perguntando detalhes sobre você, apresentar você para os leitores do POPline. Você nasceu em Fortaleza, mas se mudou para Natal aos 10 anos. Como a Kaya surgiu na sua vida e quais foram suas maiores influências?
Eu sempre tive um certo contato com o mundo drag no geral, enquanto fã daquele trabalho, mas depois que eu conheci “RuPaul’s Drag Race”, a identificação que eu tinha com aquele mundo aumentou muito e aí começou a crescer dentro de mim uma necessidade enorme de me expressar através do drag, e foi ai que surgiu a Kaya. Na época era um mix louco de muitas coisas que eu gostava com outras que eu sempre quis fazer, que somava com o que eu tinha e resultava na personagem que eu levava pra noite. Fiquei bem a vontade pra criar e recriar o que eu queria pra minha drag do zero (trago isso até hoje), então sempre foi um processo muito divertido e engrandecedor pra mim enquanto Igor também!

Vimos alguns depoimentos seus e você comentou que tem o apoio dos seus pais, o que deve ter facilitado um pouco as coisas durante seu crescimento, na questão da homossexualidade como também na criação da Kaya.
Ter o apoio da minha família foi crucial pro crescimento da minha drag, a minha mente não precisava ficar se preocupando com ter que esconder de alguém tudo aquilo que vinha pensando e fazendo. Pelo contrário, com o apoio dos meus pais, eu acabei ficando sempre muito à vontade pra tentar tudo que eu queria e isso com certeza foi muito favorável pra mim.

Mas sua história, podemos dizer, é uma exceção na regra. Por mais que o papo esteja mais aberto atualmente, a sexualidade é ainda tratada como tabu e com olhos agressivos de preconceito. O quão difícil é romper essa barreira e ser levado a sério como pessoa e profissional?
A galera não está acostumada a ver pessoas como a gente ocupando lugares de grande visibilidade e reconhecimento como vem acontecendo agora. Nosso trabalho foi ganhando muita força dentro do nosso meio, e com isso a gente acabou transbordando e conseguiu continuar levando nossa cultura e nossa história para mais pessoas. Só que muitas dessas pessoas não estão acostumadas a ver gente como a gente chegando e ocupando lugares como nós temos feito, e isso parece assustar eles, que por sua vez tentam a todo custo invalidar nosso trampo e colocar a gente de volta no “armário” de onde a gente veio, mas é uma pena (pra eles) que não vão conseguir! Hahaha

No últimos dois anos a gente viu uma abertura maior da massa brasileira para a cena LGBTQ com personagens expoentes na música, no teatro, nas artes em geral. Mas sabemos que o que chega ao grande público é muito pouco do que realmente é produzido.
Sim, e eu acho que isso acontece também porque muito do que a gente produz relata nossa realidade, nossa vida, nossos gostos, costumes, e é importante que seja assim: pessoas LGBTs produzindo conteúdos que gere identificação pra outras pessoas LGBTs. Logo, vivendo numa sociedade preconceituosa como a nossa e em meio a uma parcela de sexualidade tão frágil como o homem hétero, é perceptível de onde vem toda essa resistência em consumir nosso produto. Mas é tudo uma questão de tempo.

“A galera não está acostumada a ver pessoas como a gente ocupando lugares de grande visibilidade e reconhecimento como vem acontecendo agora.”


Você enxerga que você tem sim um papel nessa militância?

Com certeza! Recebo muitas mensagens de manas do nordeste falando sobre terem passado a acreditar mais em si depois de ter assistido o meu crescimento na cena nacional. E se perceber enquanto esse tipo de inspiração pra outras pessoas é muito importante pra mim também.

E como você vê artistas que não são LGBTQ mas, digamos assim, utiliza desse meio para um trabalho artístico?
Então, no geral, é possível sim que artistas héteros tenham o que oferecer pro público LGBT quando se trata de produtos midiáticos, mas a forma que eles vão fazer isso é o que vai diferenciá-los e o que vai mostrar se existe um respeito e uma real identificação com aquele público ou se está sendo feito só por interesse mesmo. E as gay sabem quando é real e quando não é, a gente sempre sabe! hahaha

Você acredita que a música pode ser/está sendo um grande canal de discussão?
Sempre digo que a música é uma ótima forma de dialogar com o público e de falar sobre si, sobre sua história, então sim! Sem dúvidas.

Você foi batizada de “Dona de Natal” e alguns apontam você como uma das grandes promessas do cenário na atualidade. Era o que buscava desde o início?
Isso é muito louco pra mim e ao mesmo tempo muito satisfatório, sabe. Porque tipo, desde que eu comecei, eu sempre almejei muito por tudo isso e sempre acreditei muito em mim, mas ainda assim não conseguia projetar tudo que vem acontecendo agora, por exemplo. Então foi de certa forma uma surpresa estar conseguindo chegar onde eu sempre quis, porque de onde eu tava, eu não imaginava que fosse possível. Inclusive fica aqui o lembrete: tudo depende de você e do quanto você acredita no que você faz! Corra atrás, aprenda tudo que for preciso pra ser tornar um profissional melhor, que hora ou outra sua vez vai chegar!

E aí Bebê” 1,3 milhão de reproduções no Spotify, outros 1 milhão e 200 no áudio no Youtube e quase 5 milhões no clipe. E logo depois veio “Bumbum Tremendo” também chegando a 1 milhão de visualizações. A gente vê sua agenda e números nas redes sociais crescendo. Como está a carreira no momento?
Tudo vai caminhando muito bem, as peças vem se encaixando como num quebra-cabeças e eu tô muito empolgada com a produção de coisas novas! Quero muito mostrar pras pessoas mais das minhas referências e do meu som!

É escolha de algumas pessoas LGBTQ escolher a arte Drag para conseguir se expressar criativamente. Se você não tivesse criado a Kaya, de qual outra forma você acha que iria extravasar essa criatividade? 
Olha, eu realmente não faço ideia! Porque quando eu olho pra trás eu vejo como os signos do mundo drag sempre me cercaram de alguma forma, desde criança quando eu aproveitava todas as oportunidades possíveis pra vestir uma roupa da minha mãe e usar maquiagens dela, até depois quando eu me assumi gay e me senti a vontade pra inserir roupas e acessórios do vestuário feminino no meu dia a dia. Brincar de amarrar uma camisa na cabeça e fingir que era cabelo, colar adesivo na ponta dos dedos pra usar como unhas, fazer lençol virar vestido e todas essas outras coisas hahaha. Então quando eu vi tudo aquilo que eu sempre brincava de ser, como uma real POSSIBILIDADE, não pensei duas vezes e agarrei à ideia. Foi tipo amor a primeira vista, e esse amor segue invicto até hoje e com certeza vai durar por muito tempo! 🙂

“Vivendo numa sociedade preconceituosa como a nossa e em meio a uma parcela de sexualidade tão frágil como o homem hétero, é perceptível de onde vem toda essa resistência em consumir nosso produto.”

Há alguma novidade sendo preparada depois do lançamento do clipe de “Bumbum Tremendo”, tipo a parte 2 do EP “Sabe Que Vai”? Se tiver, dá para adiantar algo?
A gente não vai ter mais singles do primeiro EP, daí agora estamos trabalhando na segunda parte dele, que ta vindo com uma vibe bem funk, contando com umas parcerias bem legais e eu acho que o pessoal vai curtir! Tô animada! Hahaha

Falando em funk, o estilo é muito criticado no Brasil pelo conteúdo de suas letras. E as suas próprias músicas também são assim. Fala sobre balada, paquera, sem papas na língua, sem ser contido na linguagem. Você já sofreu alguma crítica pelo conteúdo de suas letras, pela sua forma de compor?
SIM! A galera tende a achar que toda música tem necessariamente a intenção de ser um HIT que vai tocar na rádio, passar na TV e agradar a todo mundo. Mas não é assim que funciona, esse não é o único papel da música. As pessoas são muito diferentes umas das outras, e cada uma tem seus gostos, suas preferências etc, e cada artista vai escolher com que público ele quer dialogar e de que forma ele quer que esse diálogo se dê. Não é só o público clean-mainstrem que consome música, pelo contrário! Existem vários outros perfis consumidores de audiovisual, no geral, basta a galera meio que entender que nem tudo é feito necessariamente pra que TODO MUNDO goste.

Para dar uma continuidade nessa corrente positiva de novas drag queens, trans cantoras no Brasil, qual nome ainda não tão conhecido pelo público que você acha que vai se destacar em 2018? 
Tem muitos nomes na cena drag musical que eu acredito que tem muito pra oferecer e que ainda vão dar o que falar por aí! A Mia Badgyal, a Electra McKlein, a Only Fuego com a Butantan e a Khloe Lov são as que eu mais escuto e adoro! Torço muito por elas <3

Para terminar, qual é seu conselho para outros meninos que, assim como você, viu em drags uma inspiração?
Corram atrás das suas vontades, se esforcem pra aprender e serem melhores no que vocês gostam e querem fazer, saibam filtrar os comentários negativos e críticas que vocês vão receber e não deixem que isso faça vocês desistirem.

Por Amanda Faia e Kavad Medeiros

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