A gestão municipal do Recife está em falta com os pagamentos devidos aos compositores pelas execuções públicas de suas obras durante os festejos carnavalescos, conforme apontado pelo Escritório Central de Arrecadação e Disctribuição (Ecad). Paralelamente, o governo estadual vem adotando práticas questionáveis ao incluir cláusulas em suas convocações para o carnaval, eximindo-se do pagamento dos direitos autorais e transferindo essa responsabilidade aos próprios artistas premiados nos editais. Esse cenário prejudica os compositores em duas frentes distintas.
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No que diz respeito à prefeitura do Recife, não há informações disponíveis sobre os prejuízos, uma vez que os contratos entre a administração municipal e os artistas envolvidos nos eventos não são divulgados publicamente. Além de notificar a administração do prefeito João Campos para regularizar a situação e quitar os débitos pendentes, o Ecad, anunciou que este ano realizará gravações dos blocos famosos, dos palcos de shows e de outros eventos para verificar quais músicas estão sendo executadas.
A inadimplência por parte da prefeitura recifense não se limita apenas ao carnaval, estendendo-se também aos festejos juninos de 2022 e 2023, bem como às festas de réveillon de 2023 e 2024, de acordo com o Ecad.
“Por conta das pendências dos anos anteriores, o Ecad acionou a Justiça para cobrar os valores pertencentes a autores e compositores das canções tocadas nos festejos, conforme prevê a legislação brasileira. O Ecad vem ainda reunindo todos os esforços no sentido de chamar atenção para que produtores de eventos, sejam eles públicos ou privados, tenham certeza de que o direito do autor foi pago. A instituição alerta para que os patrocinadores tenham o cuidado de associar sua marca a quem respeita a legislação, e não aceitem, de maneira alguma, apoio a eventos musicais que não pagam o autor”, afirmou o órgão em nota.
Quanto ao governo estadual, desde pelo menos 2019, havia a prática de inserir cláusulas irregulares nas convocações para o carnaval, que transferiam a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais para os artistas contratados, em vez de cumprir com a obrigação legal estabelecida. Essa prática persistiu nos anos seguintes, com pequenas variações no texto.
Em 2020, uma convocatória da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) foi ainda mais explícita, colocando a responsabilidade de pagar os direitos autorais sobre os artistas e intérpretes, em vez de cumprir com a obrigação legal: “Todos os encargos e obrigações trabalhistas, previdenciários, tributários, comerciais, de direitos autorais e outras de natureza legal, ficando a FUNDARPE isenta de qualquer responsabilidade nesse sentido.”
“O desrespeito do poder público quando não atento ao direito autoral é aviltante e preocupante por si só. Mas, quando isso avança na busca de fórmulas para camuflar o não pagamento aos milhares de autores que contribuem decisivamente para a festa do carnaval, já passa de todos os limites de um suposto desconhecimento ou desinformação (…) É um grande teatro de hipocrisia que acredita que tudo acaba numa quarta-feira. Mas não. Não começa ali e nem acaba lá”, afirma Marcelo Castello Branco, diretor-executivo da União Brasileira de Compositores (UBC), uma das sete associações que representam o Ecad.
Até o momento, não houve pronunciamento por parte de nenhuma das instituições mencionadas.