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OPINIÃO: Obsessão dos fãs em números pode deixar música pop efêmera e saturada?

É comum ver artistas serem criticados ao não atingir as expectativas numéricas de parte dos seus fãs
OPINIÃO: Obsessão dos fãs em números pode deixar música pop efêmera e saturada?
(Foto: Beyonce.com; Divulgação/Lady Gaga; Instagram/@anitta)

A velocidade e o dinamismo da indústria musical atual são inegáveis, especialmente com a força das redes sociais. Essas plataformas se tornaram vitais para a promoção de artistas e suas obras, mas também criam um ciclo intenso de demanda por conteúdo. Enquanto isso, os fãs, cada vez mais ávidos por novidades, parecem viver em um estado de expectativa constante, com um foco que deixa o produto de lado e valoriza os números.

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(Foto: Instagram/@sabrinacarpenter; @linikeroficial; @billieeilish)

Essa busca incessante por lançamentos e resultados astronômicos pode levar à saturação do mercado, tornando a música pop efêmera. Afinal, esse desejo insaciável por mais e mais acaba criando uma pressão para que os artistas entreguem constantemente novos produtos. Não apenas isso, mas também uma torcida, às vezes desleal, para que conquiste resultados positivos.

Um exemplo recente dessa pressão aconteceu na última semana, com Lady Gaga. Mesmo com críticas positivas à música, parte dos little monsters expressavam seu descontentamento com a forma como a cantora decidiu divulgar “Disease”. Olhando de fora, parece que os números são mais importantes do que a faixa em si.

Toda essa pressão não apenas desafia a criatividade dos músicos, mas também transforma a maneira como a música é consumida. Ao invés de se conectar profundamente com uma obra, muitos fãs acabam passando rapidamente de uma tendência para outra, resultando em sucessos que têm uma vida útil cada vez mais curta.

Cobranças por números não pode infectar os artistas

Além disso, essa cultura de produção em massa pode desvalorizar as músicas que merecem tempo para serem apreciadas. Recentemente, Beyoncé foi uma das defensoras dessa cautela ao lançar uma música. A cantora, que apostou em um álbum em 2014, quando a indústria voltava suas atenções apenas para singles, defendeu o respeito que o som, unido à voz, deve ter.

Para a GQ, a cantora desabafou sobre sua escolha de não lançar visuais para os seus dois últimos álbuns e explicou que o público precisa dar mais atenção às músicas por si só. “A música é tão rica em história e instrumentação. Leva meses para digerir, pesquisar e entender. A música precisava de espaço para respirar por si só”, comentou.

“Os anos de trabalho duro e detalhes colocados em um álbum que leva mais de quatro anos! A música é o suficiente. […] Houve um tempo em que eu me esforçava para cumprir prazos irrealistas, sem tirar um tempo para aproveitar os benefícios do motivo pelo qual eu estava trabalhando tanto. “, disse ela.

Beyoncé também se mostra, em diversos momentos, uma cantora que já não se preocupa mais com números avassaladores, pelo contrário. Há alguns anos, a cantora aposta em uma forma de divulgação simples de suas novas faixas. O último álbum a ter performances em premiações, por exemplo, foi o “LEMONADE”.

“Houve um tempo na minha vida em que os charts e as vendas me animavam e motivavam. Depois que você se desafia e coloca cada grama da sua vida, sua dor, seu crescimento e seus sonhos na sua arte, é impossível voltar atrás”, afirmou.

Pressa por números desvaloriza a arte e o trabalho alheio

Numa realidade onde parte do mercado produz músicas pensando se elas darão certo no TikTok, vivemos uma era de desvalorização da arte. Se nos anos 2000 era comum uma faixa ter mais de três minutos, hoje o padrão é pouco mais de dois. A ideia é que o público possa consumir cada vez mais em menos tempo.

A diferença, no entanto, está nos bastidores. Afinal, uma música não é feita em dois minutos. Enquanto divulgada o álbum “Call Me If You Get Lost”, em 2022, Tyler, The Creator desabafou sobre esse “desespero” e “esquecimento” da importância dos lançamentos.

Para o rapper, a indústria tem forçado os artistas a serem “preguiçosos” com o seu trabalho. “Com sede ou sem orgulho, eles lançam uma música, colocam-na em seu story [no Instagram] e pronto. Você passou por um momento, escreveu palavras. Você descobriu o formato estrutural [da música]. Na maioria das vezes, você a gravou”, comentou.

“Você não faz isso em uma única gravação, você vai e volta, corrige algumas partes e repete outras. Essa é a que você toca para as pessoas, você a mixa. Eles fazem a capa do álbum. É uma coisa completa e você quer me dizer que vai ser omisso com o seu próprio álbum e simplesmente colocá-lo em seu story?”, questionou.

É em meio a essa “obsessão” que quem anda por fora da curva se destaca. Liniker, por exemplo, experimenta um sucesso diferente em sua carreira. Com “Caju”, a cantora atingiu bons resultados nas plataformas de streaming e ainda esbanja uma turnê de shows esgotados – com direito a datas extras. “Estou muito realizada, é a primeira vez que alcanço o Top 1”, disse ela ao Jornal O Globo

Tudo isso, é claro, sem perder sua essência ou adotando as estratégias impostas pela indústria. Pelo contrário. A cantora, atualmente, figura com um álbum que possui faixas de mais de sete minutos. As pessoas estão respeitando o trabalho, respeitando o tempo da música, ouvindo o trabalho inteiro. A gente sabe o quanto isso é raro atualmente e eu não poderia estar mais feliz”, adicionou.

Quanto mais se consome, mais querem produção

Quando um novo sucesso viraliza nas redes sociais, ele pode rapidamente ofuscar canções que, por sua profundidade e qualidade, deveriam ser celebradas por mais tempo. Essa realidade levanta questões sobre o futuro da música pop e o impacto que a obsessão dos fãs em números pode ter sobre sua autenticidade e longevidade.

Enquanto isso, alguns artistas acabam cedendo à pressão externa e se inserem em ciclos incansáveis para o público, mas nocivos para quem os produz. Billie Eilish, por exemplo, não esconde ser contra o consumo excessivo focado, exclusivamente, na obtenção de mais números e recordes.

Neste ano, a artista criticou como alguns cantores trabalham, lançando uma enxurrada de produtos de merchandising e ou versões diferentes do mesmo disco, apenas com olhos no lucro. “É um desperdício tão grande e é irritante para mim que ainda estejamos em um ponto em que nos preocupamos tanto com os números e em ganhar dinheiro”, disse a cantora à Billboard.

E depois do sucesso?

Ao olhar para a indústria, é possível notar uma sede pelo sucesso. Este, no entanto, pode ser interpretado de diferentes formas. Alguns enxergam como sucesso os números positivos em charts; outros, já consideram um artista de exitoso quando ele consegue lotar um estádio – e nada menos que isso.

Mas, afinal, se isso é tão importante, o que acontece quando se chega lá? O artista – incentivado pelos fãs – se torna uma máquina, que deseja repetir aquele mesmo sucesso infinitamente, como um caminho sem volta. O ciclo se torna vicioso, com pessoas trabalhando não mais pela música, mas sim pelo resultado que se alcançará com ela.

No ano passado, Anitta falou sobre isso durante o “Saia Justa”. Em uma comparação ao Monte Everest, a brasileira questionou sobre essa busca incansável pelo topo. Continuo cantando, se bombar tá ótimo, vou ficar muito feliz, mas se não bombar, gente, eu já fui número um no mundo, já fui, sabe?”, disse ela.

“Você quer subir até o topo. Você subiu, chegou lá no topo do Everest. É aquela sensação… cheguei! Uau! Você tem que se preparar pra você subir e pra você descer. Porque você tem que chegar vivo embaixo, né? Tem que passar por tudo isso, e a maioria das pessoas não morrem na subida, é na descida”, pontuou ao comparar o sucesso com o Monte Everest.

À época, o discurso da Anitta foi considerado vexatório por parecer que ela, na verdade, estivesse aceitando que nunca mais faria sucesso. Mas, será que é possível – ou saudável – se manter no topo em uma indústria que vive novas tendências em questões de semanas, ou dias, e que consome mais música do que nunca?

Existe tempo para chegar – ou ficar – no topo?

Imagine como Beyoncé ou Taylor Swift seriam vistas se optassem, depois de lotar estádios em todo o mundo, por realizar turnês menores, com shows em arenas ou teatros? A fama e a carreira dos artistas são vistas como uma escada em que só pode subir. Caso contrário, é taxado como um grande fracasso.

Madonna, por exemplo, já testou essa mudança de escala. Em sua turnê “Madame X”, em 2019, ela trocou os estádios e grandes arenas por teatros menores, buscando uma proximidade maior com o público. Contudo, a decisão foi vista por muitos como uma admissão de “queda de status” e recebeu diversas críticas, apesar de representar uma escolha artística e íntima.

Essa mesma classificação é dada para artistas novos que não fazem a “roda girar” rapidamente em busca do seu primeiro grande sucesso. Caso não aconteça, infelizmente, sua carreira é vista pelo público como fadada ao fracasso. Agora, pense, por exemplo, se a Lizzo tivesse desistido em seu primeiro álbum e nunca tivesse lançado “Truth Hurts”.

Ou então, se Sabrina Carpenter tivesse aceitado que a música não era o seu lugar antes de experimentar o sucesso de “Espresso”. Até mesmo Charli XCX, que só furou a bolha e conheceu um “sucesso mainstream” em 2024, 17 anos depois de iniciar sua carreira.

A pressão para permanecer em ascensão constante também coloca um peso descomunal nos artistas novos, que, muitas vezes, se veem obrigados a fazer tudo ao mesmo tempo, lançando músicas e colaborações ininterruptamente para garantir relevância. Aqueles que não atingem o sucesso imediato, no entanto, acabam rapidamente desacreditados.

Busca incessante por resultados é a ruína da longevidade artística

No fim das contas, a busca incessante por resultados pode ser a ruína da longevidade artística. Em uma indústria que se reinventa constantemente e um público que espera novidades diárias, a pressão para sempre estar no topo só desafia a resistência dos artistas.

Além disso, essa movimentação excessiva transforma a experiência dos fãs, que cada vez mais vivem de picos momentâneos em vez de conexões duradouras com a música. A questão permanece: será que estamos, na verdade, empurrando nossos ídolos a uma jornada sem descanso e deixando a arte para trás?

Enquanto fã, deve ficar a reflexão: você é fã do artista ou dos números que ele conquista?

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