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Opinião: Hits do Verão – Os desafios da assessoria de imprensa

Artigo de opinião assinado pelo novo colunista Zé Raphael, para o POPline.Biz é Mundo da Música

Zé Raphael_Colunista POPline.Biz MM
Foto: Divulgação

É inegável a existência de uma fina simbiose entre música e verão. Embora uma composição de sucesso possa acontecer em qualquer estação, seja ela inverno, outono ou primavera… o fato é: todo verão tem um hit. Muitos pensarão que tal prática é exclusiva do Brasil, mas posso afirmar que não é bem por aí.

Por exemplo, nos Estados Unidos, um país considerado frio para os nossos padrões, há uma cultura fortíssima dos summer hits. É impossível escutar “Despacito”, do Luis Fonsi (feat. Daddy Yankee), e não se imaginar, de imediato, no verão. Outros bons exemplos são “I’ll Be Missing You”, do Puff Daddy & Faith Evans (ft. 112), “In My Feelings”, do Drake, e “California Gurls”, da Katy Perry (feat. Snoop Dogg).

Mas voltando ao Brasil, que é o ponto central desta coluna, um questionamento adequado é: o que faz uma música se tornar um hit de verão? Entre as muitas respostas possíveis, pode-se dizer que, em tempos passados, as rádios ditavam a canção que nutriria os nossos dias de sol. Na atualidade, porém, os números dos players digitais são um bom termômetro. Engana-se, no entanto, quem acredita que somente streams são capazes de fazer esse fenômeno acontecer.

Em terras tupiniquins, existem duas palavras que regem este processo: família brasileira. É ela a responsável pela mágica. É ela que tem o poder do xeque mate.

Entre as tantas experiências variadas que vivo enquanto assessor de imprensa, muito me orgulha dizer que possuo no currículo dois hits do verão. O primeiro foi “Tudo OK”. “Maquiagem OK, a sobrancelha tá OK…”, é bem provável que você, leitor, tenha cantado esse trecho no verão de 2020. À época, o Thiaguinho MT e o JS Mão de Ouro foram a todos os programas de TV e conseguiram números estrondosos. O mesmo acontece agora com Xamã por conta de “Malvadão 3”.

Para que as coisas não se misturem, é importante explicar que “Tudo OK” foi um hit de verão e do carnaval. “Malvadão 3”, por ora, marcou “apenas” a estação mais desejada dos brasileiros. O potencial da faixa é tão intenso que a fez figurar por dois meses como o single líder do Top 50 Brasil do Spotify. Por consequência, com 9.9 milhões de ouvintes mensais, Xamã, em fevereiro, também se tornou o cantor mais ouvido do país.

Agora, misturando um pouco de “Tudo Ok” com “Malvadão 3”, vale pontuar que ambas, além de terem deslanchado, em um primeiro momento, na internet, fazem parte de gêneros musicais que antigamente não funcionavam para hits do verão. Falo do funk e do rap. Existia uma hegemonia de faixas pertencentes ao axé, lambada, rock 80, pop e sertanejo. O hit do verão marca uma época, uma era. E quando vem de gêneros não tão férteis, para essa finalidade, adquire ainda mais impacto, pois fixa lugar especial nos indivíduos que já são fãs daquele segmento artístico, bem como se apresenta como novidade para outros nichos.

Talvez seja surpresa para alguns, mas a verdade é que o rap e o funk ainda sofrem muita discriminação, especialmente em programas de TV. Isso quer dizer que o desafio da assessoria, quando se depara com um hit do verão oriundo desses segmentos, é provar para a família brasileira que tais artistas merecem ocupar espaços, programas e veículos de grande alcance.

A batalha é árdua, porque outros cantores de gêneros mais prestigiados aos olhos da mídia também estão em produção, ou seja, mesmo no momento do ápice é dever do assessor brigar para que o destaque ao dono do hit dure o tempo devido. A estratégia para que isso aconteça gira em torno de três pilares. São eles: gatilho, transformação e glória.

Em outras palavras, é preciso elaborar um storytelling para demonstrar ao grande público a trajetória por trás do hit. Dessa forma, é possível enfatizar a diversidade cultural da nossa música e consolidar a importância dos gêneros periféricos enquanto arte de extrema qualidade.

BÔNUS TRACK:

Como mencionei ao longo da coluna, muito me honra ter no currículo dois “hits do verão”. Então, nada mais justo de minha parte para com você, leitor, contar um pouco do que sei sobre os bastidores de criação desses dois hits. Afinal, saber o processo de criação de uma obra é sempre instigante.

A letra de “Tudo OK” surgiu quando Thiaguinho MT viu no Twitter um post de uma pessoa falando que o ex ia pagar por todo o mal que tinha feito a ele. Em outro momento, o cantor e compositor recebeu uma mensagem de um fã dizendo que “o cabelo já tá OK, minha sobrancelha tá OK”. A canção estabelece uma conexão direta com os ‘challenges’ de maquiagem que se popularizaram no Brasil. Por isso, a música cresceu organicamente nas pistas e nas plataformas digitais – ultrapassando mais de 100 milhões de vídeos feitos no TikTok.

Como a maioria dos hits do verão, tem refrão simples, letra fácil e melodia imediata nos quadris. “Tudo OK” preenche estes requisitos, mas tem como grande diferencial temáticas atuais, que são o empoderamento feminino e LGBTQIA+ e um “não” à masculinidade tóxica.

Sobre “Malvadão 3”, Xamã escreveu a música em um estúdio, no Rio, na presença de amigos. Em meio a drinks, conversas e freestyle, o artista colocou no hit uma energia de espontaneidade, transportando para o single a alegria e leveza do momento. Deu no que deu. Sucesso total.

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Jornalista há 20 anos, Zé Raphael é especialista em Assessoria de Comunicação. Trabalhou em redações de impresso, TV e rádio e obteve destaques em funções como pauteiro de rede nos programas de entretenimento da Band. Foi Coordenador de Jornalismo nas rádios Paradiso FM e Jovem Pan, e num hiato distante das redações, realizou freelas para revistas, jornais e pesquisas de jornalismo em Madri (Espanha) e Califórnia (EUA). Na volta ao Brasil, direcionou-se profissionalmente para a assessoria. Zé acredita fielmente no diálogo verdadeiro com a imprensa.