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Opinião: Cadê a Assessoria? Reflexões sobre o caso de Will, Jada Smith e Chris Rock no Oscar

Artigo de opinião assinado pelo novo colunista Zé Raphael, para o POPline.Biz é Mundo da Música

Will Smith agride Chris Rock no Oscar 2022
Foto: Getty Images / Uso Autorizado POPline

Os 15 segundos de fama, tão sonhados por muitos ao longo da vida, nem sempre são gloriosos. Por vezes, os holofotes vêm também com um grande grau de julgamento, especialmente para celebridades. Como costumo dizer, o problema do clichê é que ele funciona… Então, apesar de batida em nosso meio, a máxima que aponta para “a imprensa pode abençoar, mas também pode queimar”, nunca deve ser ignorada. Pelo contrário… é dever de casa de todo bom assessor lembrar aos seus assessorados que tal ditado será sempre verdadeiro – e atual.

Ainda falando de clichês, é oportuno relembrar que reputação é algo que demoramos anos para construir, mas que pode ser arruinada em um minuto de desatenção ou descontrole. O exemplo mais recente que o mundo pôde testemunhar foi o de Will Smith, que descontrolou-se na premiação do Oscar. Mais do que isso: ainda desestabilizado emocionalmente, teve discurso não muito adequado quando foi chamado ao palco para receber o prêmio de melhor ator. Por outro lado, entretanto, retratou-se quase que de maneira irretocável ao pedir desculpas pelo Instagram. Alguns dirão que o pedido foi tardio – cerca de 12h depois – o que eu não concordo. O que senti falta, de fato, foi um pedido de desculpas à sua esposa, Jada Pinkett Smith (mais detalhes no boiler abaixo). Dito isso, admito que preciso vociferar a pergunta que mais me inquietou em meio a toda essa história: onde estava o assessor de imprensa nos 40 minutos entre a agressão e o recebimento do prêmio?

Oscar 2022: Will Smith agride Chris Rock no palco (veja o vídeo!)
(Fotos: ABC)

Erroneamente, do ponto de vista estratégico da assessoria, Will manteve-se no mesmo lugar após o ocorrido, porém era o caso de ter saído e conversado mais com sua equipe. Penso que se o discurso fosse exatamente como foi, com o acréscimo do pedido de desculpas ao Chris, e a sinalização da questão machista, já que uma mulher não precisa ser defendida por um homem, Will estaria “absolvido”.

Poderia passar horas aqui debatendo e analisando “piadas” que tratam de gênero, raça, etc. Mas como o intuito desta coluna é ponderar a respeito da assessoria de imprensa – ou falta dela – no incidente, vou me ater aos cuidados que o assessorado deveria ter recebido diante deste turbilhão potencializado pela mídia. Neste sentido, o caso de Will é emblemático porque trata-se de uma confusão pública de um superstar, naquele que deveria ser o momento mais sublime de uma carreira admirável.

As nossas emoções são imprevisíveis. Então, o que os profissionais de assessoria de imprensa devem fazer quando aqueles que eles representam se comportam mal em um espaço público? A resposta é que não existe um manual absoluto, mas acredito haver procedimentos valiosos a fim de controlar a situação.

Retire o assessorado do local

Em um ataque físico, a segurança da parte atacada e dos convidados ao redor estão em questão. Permitir que a pessoa que se comportou mal permaneça no local pode agravar o problema e comprometer o evento. A meu ver, Will cometeu outro erro ao ter ido a um after-party, o que ressaltou um lado egóico e de pouca redenção.

Convoque toda à equipe; essencialmente com jornalistas de idade, etnias e gêneros diversos

As primeiras horas são momentos decisivos depois de uma crise. Reúna a equipe de assessoria para criar estratégias e agrupar os fatos. Registre o que você sabe e o que não sabe. A partir daí, defina a narrativa para que o público possa ter um contexto melhor.

Fale também com a equipe do agredido

Entre, imediatamente, em contato com os outros envolvidos. A parte lesada também tem voz. Estenda a mão e crie uma oportunidade para uma fala em particular entre ambos os lados. Uma reunião de mediação, em momento propício, pode ser útil.

Chamada jurídica

Em um cenário de conflito, é importante que isso seja legalizado em algum momento. Caso a parte lesada preste queixa, evite a confusão e notifique o advogado do seu cliente.

Prepare-se para as consequências

No caso de Smith, os patrocinadores podem abandoná-lo. E a imprensa não vai esquecer este caso nem tão cedo. Quando uma pessoa perde bastante respeito público ou capital social, ela também pode perder capital financeiro.

Reparar reputação

Encare sempre o problema de frente. Como já escrevi em colunas anteriores, a “era de Hollywood” acabou. Portanto, não funciona mais “maquiagens” ou fugir das responsabilidades. Deve-se observar, também, a próxima aparição pública do artista em questão. Nesta oportunidade, é imprescindível que se mantenha com um semblante sério, honesto e acessível. Planeje este passo rapidamente e com cuidado. Só para ressaltar, como observei acima, a primeira aparição pública de Smith após o incidente não deveria ter sido em um after-party.

O profissional da assessoria de comunicação deve definir um tom para avançar. O que está ao nosso alcance é criar estratégias para termos maior domínio sobre o futuro das pessoas e empresas que representamos, desde que haja a boa vontade de todos os envolvidos, pois acredite:  dependendo do gerenciamento de crise, o artista terá que investir muito TEMPO e DINHEIRO. E sem esmorecer, já que é um caminho tortuoso, mas que esbarra com absolvição pública se for trilhado com verdade.

BOILER / Opinião pessoal: há tempos acho o Oscar desnecessário e ultrapassado. Glamour e jóias caras em tempos de sustentabilidade e pós-pandemia? Durante anos excluíram os negros, gays e mulheres. E mesmo em momentos atuais cometem erros grotescos. Isso para não falar das atitudes patéticas, como a famosa selfie de milhões… No fundo, para falar a verdade, acredito que todos daquela foto ganharam um cachê enorme da Samsung. Se isso ocorreu, eticamente, deveríamos ser avisados que trata-se de uma PUBLI. Como se não bastasse todo esse cenário, não suporto piada de mau gosto. O humor deve mudar e se enquadrar aos novos tempos. Insultos, ataques e vingança são estímulos antigos, incabíveis, e aos quais as novas gerações já não reagem com os punhos. Não apenas porque a resolução de problemas por meio da violência não é um comportamento particularmente inteligente, mas sobretudo, entre outras coisas, porque mulheres não precisam mais ser defendidas por homens, em sociedades livres. Imagine, por um momento, que a própria ofendida, Jada Pinkett Smith, pudesse ter falado na noite do Oscar e dito – nem que seja – apenas uma frase sobre falsos ideais e a beleza dos corpos femininos mesmo sem cabelos compridos. E para finalizar, imagine também: e se Chris Rock revidasse o tapa? Sabe-se lá o que aconteceria… pois é.

Boilerplate: breve parágrafo apresentando quem você é, o que e como você faz, normalmente usado como o primeiro parágrafo em uma biografia ou o último parágrafo em um comunicado à imprensa.

 

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“A violência em todas as suas formas é venenosa e destrutiva. Meu comportamento no Oscar de ontem à noite foi inaceitável e imperdoável. Piadas às minhas custas fazem parte do trabalho, mas uma piada sobre a condição médica de Jada era demais para mim e reagi emocionalmente.”

Eu gostaria de me desculpar publicamente com você, Chris. Eu estava fora de linha e estava errado. Estou envergonhado e minhas ações não foram indicativas do homem que quero ser. Não há lugar para violência em um mundo de amor e bondade.

Também gostaria de pedir desculpas à Academia, aos produtores do programa, a todos os participantes e a todos que assistem ao redor do mundo. Eu gostaria de me desculpar com a Família Williams e minha Família King Richard. Lamento profundamente que meu comportamento tenha manchado o que tem sido uma jornada linda para todos nós,” concluiu.

Eu estou sempre querendo progredir / Eu sou um trabalho em andamento.

Sinceramente, Will.”

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Jornalista há 20 anos, Zé Raphael é especialista em Assessoria de Comunicação. Trabalhou em redações de impresso, TV e rádio e obteve destaques em funções como pauteiro de rede nos programas de entretenimento da Band. Foi Coordenador de Jornalismo nas rádios Paradiso FM e Jovem Pan, e num hiato distante das redações, realizou freelas para revistas, jornais e pesquisas de jornalismo em Madri (Espanha) e Califórnia (EUA). Na volta ao Brasil, direcionou-se profissionalmente para a assessoria. Zé acredita fielmente no diálogo verdadeiro com a imprensa.