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Opinião: Beyoncé é country? Sobre quebrar a internet e revolucionar a indústria

Capa "Texas Hold 'Em". Foto: Divulgação/Beyoncé

Meu último texto para o POPline.Biz foi sobre as premiações musicais e sua relação com artistas negros, em especial os de estilos musicais urbanos. Então vocês podem imaginar como minha cabeça ficou com o discurso do Jay-Z ao receber o Dr. Dre Global Impact Award no Grammy 2024 no dia 04/02. Ele simplesmente usou seu momento no palco da maior premiação musical do mundo para fazer críticas à mesma. Naquele momento pensei: vou escrever um texto sobre isso, mas ainda bem que não o fiz porque a bomba real ainda estava por vir…

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Durante seu discurso, Jay-Z questionou o fato de Beyoncé ser a maior ganhadora de Grammys da história, porém nunca ter ganhado Álbum do Ano. Mas duas falas em específico me pegaram muito durante o discurso: “alguns de vocês vão hoje para a casa com a sensação de terem sido roubados, e alguns foram mesmo” e “você tem que continuar aparecendo até que eles deem a você todos os reconhecimentos que você acha que merece.“… Esse discurso, somado ao look country de Mama Bey, eram o prenúncio do que aconteceria uma semana depois.

Dia 11/02, final do Super Bowl e dia de maior audiência da TV americana, foi a data escolhida por Beyoncé para fazer história mais uma vez. Com uma publicidade para Verizon e um cachê estimado em 30 milhões de dólares, a artista roubou toda a atenção e quebrou a internet (como assim já anunciava a publi) com um comercial hollywoodiano que, no final, anunciava o lançamento de uma nova música. Depois disso, não teve jogo de futebol americano, Halftime Show do Usher ou nada mais que fosse suficiente para tirar os holofotes de Queen B naquela noite. 

Foto: Divulgação/Beyoncé

Na sequência da veiculação do comercial, foram disponibilizados 2 novos singles da artista nas plataformas digitais (Texas Hold ‘Em e 16 Carriages) e todas as suas redes foram atualizadas com a data de lançamento do seu novo álbum, o segundo ato (o primeiro foi o Renaissance lançado em 29.07.2022) a ser lançado no dia 29.03.2024. O que o mundo não esperava é que Beyoncé simplesmente fosse lançar um álbum COUNTRY. Sim… Isso mesmo que você tá pensando… O “sertanejo” americano! E essa escolha tem tantas camadas que eu mal consegui dormir depois do dia do anúncio.

Primeiro porque, esteticamente, ela já vinha anunciando essa fase sem que a gente nem imaginasse. Muita gente comentando que agora tinha entendido o look dela no Grammys e no Super Bowl, mas galera, vale lembrar que Beyoncé está usando um cavalo, a vibe “cowgirl” com chapéu e estética sulista americana desde o Act I: Renaissance. Tudo bem que esses símbolos estavam disfarçados com espelhos de um globo de boate, risos, mas estavam lá… 

Segundo o fã-clube Beyoncé Brasil, o álbum está pronto já há algum tempo porque Tina Knowles, mãe da artista, postou no insta “Eu amo esse disco há anos, agora estou tão feliz que vocês possam ouvir. É incrível!” . Ou seja, está tudo conceitualmente interligado e muito bem amarrado desde 2022 (pelo menos pra gente, o planejamento todo deve vir da época da pandemia) porque ela tem dado spoilers, agora bem óbvios, do resgate de suas raízes/origens e, acreditem ou não, o country faz parte disso tanto quanto a cultura ballroom e house music.

Para quem viu o filme “Reinassence”, fica evidente a conexão familiar que Beyoncé tem com a cultura ballroom graças ao seu tio Johnny e a importância do movimento para a comunidade preta e LGBT+. E aí tem muita gente se questionando: qual a relação da artista com a música country?

Bom, vale lembrar que Beyoncé é nascida no Texas. No seu visual album Lemonade ela já afirma seu lugar de origem e suas raízes, especialmente nesse verso traduzido de Formation:

Papai é do Alabama; mamãe, Louisiana
Você mistura esse negro com aquela crioula e faz uma texana revoltosa
Gosto do cabelo do meu bebê, com cabelo de bebês afro
Gosto de meu nariz negro com as narinas dos Jackson Five
Ganhei todo esse dinheiro, mas nunca tirarão o country de mim
Tenho molho picante em minha bolsa, legal”

Esses três estados fazem parte do sul dos Estados Unidos, região conhecida mundialmente pela música (e cultura) country. Apesar do estilo musical ser vendido como a “única música popular branca” surgida em território norte-americano e ser consumido pela classe mais conservadora do país, há estudos que mostram que vários símbolos da cultura sulista dos Estados Unidos foram embranquecidos ao longo do tempo e, com isso, figuras negras importantes da região (assim como as referências que ajudaram a criar o estilo musical) foram sumariamente ignoradas e não tiverem suas contribuições reconhecidas.

Para quem não sabe, o sul dos Estados Unidos é uma região extremamente racista, mas aprofundar nisso levaria mais um texto porque é algo que precede a Guerra Civil do país e dura até hoje, então melhor dar um Google aí.

No seu Act II, mais uma vez, Bey resgata musicalmente algo que foi apagado da história como parte da cultura afro-americana. Ao mesmo tempo, ela revoluciona duplamente por vir com um álbum que não poderá mais ser encaixado em categorias de Rap e R&B do Grammy, popularmente conhecidas como categorias para premiar/contemplar artistas negros.

A questão aqui é que Beyoncé está furando a bolha mais conservadora dos EUA através de sua música e as polêmicas já começaram de todos os lados. Azealia Banks (nossa Kanye West versão feminina) já foi logo pras redes dizer que Beyoncé será ridicularizada com esse novo trabalho. Do outro lado, uma rádio americana em Oklahoma teve que voltar atrás ao negar tocar Texas Hold ‘Em em sua programação. Quando receberam a solicitação de um fã para reproduzirem o single, a resposta por e-mail foi “Não tocamos Beyoncé na KYKC porque somos uma estação de country”.

Porém o email caiu no X (antigo Twitter) e logo a frase BEYONCÉ IS COUNTRY estava no trending topics mundial da rede e vídeos defendendo a artista no TikTok já estavam viralizando. Um desses foi o do cantor e compositor country americano Joel Adam Russell que, além de dizer que essa fase de Queen B no gênero é ótimo para a música country, afirmou que os dois singles lançados por ela soam mais country do que a maioria das músicas do estilo tocadas nas rádios atualmente. 

@joeladamrussell Should country radio play Beyonce’s new song? #beyonce #countrymusic #hottake #musichistory #realcountrymusic #beyoncetexasholdem #popcountry #countryradio ♬ original sound – Joel Adam Russell


Não sei se foi uma resposta aos haters, mas na última quarta-feira, ela simplesmente disponibilizou a acapella e instrumental de Texas Hold ‘Em em todas as plataformas. Além dos memes que invadiram a internet nos últimos dias, o que vai surgir de remixes, mash-ups não está escrito! Seria uma estratégia agressiva para ampliar ainda mais o alcance desse lançamento (e aumentar todo o burburinho em torno do Act II)?

Bom, o fato é que os números não mentem: com poucas horas de lançamento dos dois primeiros singles do Act II no dia do Super Bowl, Beyoncé se tornou a primeira artista negra a alcançar o topo da parada country da Apple Music nos EUA. Ela também é a primeira artista negra feminina a ocupar simultaneamente a 1ª e a 2ª posição da parada. Já no Spotify, Texas Hold ‘Em está entre as 10 músicas mais ouvidas do mundo desde o seu lançamento.

Ou seja, é muito provável que a artista bata outros recordes, ganhe prêmios em categorias dominadas por artistas brancos e crave mais um feito histórico na indústria musical. Ela provavelmente será a primeira artista a acumular prêmios em categorias dos mais diferentes estilos porque Beyoncé já tem Grammys de Pop, Urban, Dance/Eletronic, R&B, Rap e agora, provavelmente, terá de Country. 

Será que a estratégia de Queen B é abocanhar todos os estilos até que seja impossível para a academia não reconhecer o seu legado e finalmente lhe conferirem um Grammy de Álbum do Ano? Com 32 vitórias e 88 indicações, ao que me parece, Beyoncé está fazendo na prática exatamente o que Jay Z falou em seu discurso: mesmo sendo “roubada” ao longo dos anos, ela continua “aparecendo até darem todos os reconhecimentos que ela merece”. E o que ela nos mostra é que nenhum artista até hoje conseguiu entregar a versatilidade e a qualidade musical que Beyoncé tem apresentado desde o início da carreira como integrante do Destiny’s Child.

Se os rumores dos fãs estiverem certos, a Queen B resgatará outro estilo que foi totalmente embranquecido, ao longo dos anos, no Act III: o Rock. Se ela fizer isso, meus amigos, agradeçam de terem vivido na mesma época de Beyoncé porque essa mulher está revolucionando a indústria musical!

De duas uma: daqui um tempo, ou Beyoncé será conhecida como a artista que fez a academia se curvar diante dela ou será conhecida como a artista mais genial e injustiçada de todos os tempos… De qualquer forma, mesmo com um sistema que insiste em nos fazer perder, ELA JÁ GANHOU E ELA SABE DISSO! 

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A arte sempre esteve no caminho da mineira Ana Paula Paulino. Dançarina desde os 3 anos, a atual empresária e produtora se envolveu com o meio cultural de Belo Horizonte bem cedo, mas foi apenas após sua ida definitiva para o Rio de Janeiro em 2014, que ela descobriu sua verdadeira vocação para o gerenciamento artístico e planejamento de carreira musical.
Bacharel em Relações Públicas pela UFMG e indicada à categoria “Profissional do Ano” do WME Awards 2022, Ana Paula é uma das sócias da Ubuntu Produções, juntamente com a irmã Isaura Paulino.
Criada em 2015, a Ubuntu objetiva ser força motriz, alavancando iniciativas, carreiras, talentos e gerindo sonhos, além de pensar estrategicamente em projetos e ações que agregam valor e possibilitam a visibilidade de segmentos, pessoas e anseios, que merecem mais palco.
Além das áreas de produção e gestão cultural, planejamento e gestão de carreiras artísticas, a Ubuntu Produções é também uma editora/ gravadora, responsável pelos lançamentos e gerenciamento das produções musicais e audiovisuais de seus próprios artistas.
Além de desenvolver grande parte das estratégias relacionadas aos artistas ligados à empresa – como a funkeira @mccarol -, Ana Paula Paulino também atua como curadora, tendo participado de projetos como Red Bull Music Pulso; os festivais Rider #DáPraFrazer, Conexidade, entre outros; além de ter integrado a curadoria do Edital Natura Musical 2021. Já atuou na direção e/ou concepção de clipes de artistas como Heavy Baile, MC Carol e Abronca.
É também ativista, palestrante e foi speaker do TEDx São Paulo, sob o tema #ideiassnegrasimportam, em novembro de 2020.

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