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Opinião: Aquela história da Obra e do Fonograma

Peter Strauss, colunista POPline.Biz. Foto: Divulgação

Vamos falar sobre a diferença entre obra e fonograma?”. A pergunta é quase piada interna entre o pessoal que dá aula ou palestra sobre direitos musicais de tão repetida que é nesses eventos. Não é à toa. O universo dos direitos musicais já é complexo por natureza e fica ainda mais difícil de decifrar sem essa aulinha fundamental. Quando explicada, ela parece óbvia, mas muita gente que trabalha com música nunca fez essa distinção, e consigo entender o motivo. No mundo prático, as coisas não se organizam como previsto no direito.

Ok, então qual é a diferença? A obra musical é a criação, a ideia final de uma composição formada por letra e melodia conforme concebida pelos seus autores. Já o fonograma existe apenas no momento em que essa criação é fixada em uma gravação, seja em suporte físico ou digital. A distinção entre os dois conceitos para fins de entendimento dos direitos musicais é fundamental porque os criadores e titulares de direito são (ou melhor, podem ser) distintos para cada um.

Para colocar de forma mais direta, só existe uma “Norwegian Wood” composta por Lennon e McCartney, uma obra, mas existem centenas de fonogramas de “Norwegian Wood”, inclusive aquele gravado pelos próprios com os Beatles. O duo britânico recebe direitos de autor pelo uso de sua composição, mas quem recebe direitos pelo uso dos fonogramas são os cantores, músicos e selos que bancaram, produziram e lançaram essas gravações.

Pronto. Entendido esse conceito, já fica superada uma etapa que não dá pra pular para quem quer entender o estranho, profundo, confuso e às vezes indecifrável dos direitos da música.

Uma coisa é certa: o conceito é muito mais intuitivo para quem é compositor mais tradicional e que trabalha com canções. Compondo no piano ou violão, construindo melodias, letras, versos e refrões. Para esse compositor, a obra frequentemente existe muito antes do fonograma, e mesmo esse por muito tempo só existe como uma fixação temporária de uma demo, ou gravação de celular para não esquecer a ideia.

Mas vamos lembrar que existe toda uma categoria de compositores para os quais a obra e o fonograma são indissociáveis pois a criação de uma é simultânea à criação do outro. Ou seja, criar uma obra é gravar um fonograma.

Vamos começar por um exemplo bem claro e direto: artistas de improvisação. Por definição, o improviso musical é um evento único, instantâneo e espontâneo de expressão musical que não se repetirá no mundo real da mesma forma, salvo… se for gravada sua performance original. Eis o fonograma.

Outro exemplo: artistas cujas criações são montadas a partir de loops, trechos de performances, sequências programadas. Um universo enorme de criações que não trabalham dentro das regras gerais de canções e sim com foco maior em timbres, ruídos e sonoridades “não-naturais”, sintetizadas.

São processos muito mais semelhantes à construção usando blocos de montar, como aqueles que crianças usam para moldar suas fantasias e machucar os pés dos pais com peças soltas pela sala da mesma forma, o processo de criação da obra está ocorrendo de forma simultânea à criação do fonograma. Ou seja, na prática, a teoria é outra. De qualquer forma, entender a distinção é fundamental porque para fins de registro, obras e fonogramas seguem caminhos semelhantes, porém distintos.

Aqui na coluna, vamos nos aprofundar em temas ligados aos direitos de autor, direitos conexos, copyright, royalties internacionais, mercado brasileiro, mercado digital. Desafios, oportunidades, novos negócios, perigos. Desmistificar sempre que possível. Mais do que nunca, para quem quer trabalhar com ou viver de música, não existe fórmula mágica. Existem princípios e conceitos fundamentais que precisam ser compreendidos, e um preparo para lidar com a avalanche diária de novos negócios. Curiosidade, bom senso, ceticismo e amor genuíno pela música que você faz ou promove são os valores que vale a pena ter como guia. Espero poder ajudar um pouco aqui nesse canto.

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Peter Strauss é Músico e Gerente de Relações Internacionais, Distribuição e Licenciamento na União Brasileira de Compositores, com foco no relacionamento com sociedades de gestão coletiva a participação nos grupos técnicos da CISAC, organização global que reúne as sociedades autorais e define standards e formatos de intercâmbio de dados. Participa ativamente desses grupos técnicos para alavancar a implementação dos mesmos nas áreas relevantes da UBC. Iniciou a carreira no mercado em 2001 na EMI Music Publishing e faz parte do quadro da UBC desde 2009.

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