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“Minha vida pode ser dividida em antes e depois de Clebson”, diz Lulu Santos ao lançar novo álbum “Pra Sempre”, inspirado em sua relação com marido


Personalíssimo! Não há como esbarrar em Lulu Santos sem sair impactado com a sua presença! Sem medos, papas na língua ou reservas, ele surge com um look despojado rosa, exalando amor já visualmente pelo tom da sua roupa para conversar com o POPline! O assunto? Justamente o lançamento do mais recente álbum, “Pra Sempre”, dedicado ao relacionamento com o seu marido, Clebson Teixeira.

Durante a entrevista com mais de 30 minutos, Lulu é sereno e assertivo sobre a sua carreira, nos enche de sentimentos ao falar sobre o relacionamento com o companheiro, nem foge de assuntos mais polêmicos como política e também sobre pontos não tão gloriosos da sua extensa trajetória. Enquanto somos inundados com as mais diversas mensagens da nossa impermanência humana, Lulu Santos relembra que “seja eterno enquanto dure”, mas de um modo bem diferente de clichês! Até porque, para o poeta, o amor está longe do lugar comum e se concentra no espaço regido pelos estágios intensos.

Sem nenhuma modéstia, eu estou diante de um dos maiores hitmakers deste país. Qual é o segredo para fazer músicas que tocam tão profundamente o imaginário das pessoas há quatro décadas?

Eu dei sorte. Um pedaço disso é sorte. Tanta gente tem talento, mas por uma conjuntura de fatores acaba não tendo o espaço que eu tive e venho tendo. Além disso, eu passei por várias mídias. Tive um período muito forte de rádio durante os primeiros 20 anos da minha carreira e nos últimos oito tenho tido esse espaço da TV que te confere uma plataforma muito sólida. Agora também há as mídias digitais. Acredito que acompanhei o progresso do suporte material da mídia. Acho que dei sorte por estar sempre “em cima da prancha” e também jogo de cintura para que se cair, saber levantar de novo! Outro dia vi o discurso de Mariah Carey no Billboard Awards e aquilo foi tão próprio, “acho que nunca vai ser liso”, como ela falou.

Quando você está no “The Voice Brasil”, isto se inverte e são os participantes que, além da técnica, precisam te emocionar. O quanto este processo influencia no seu trabalho?

Não acho que houve uma reinvenção de Lulu Santos para o The Voice, mas apresentou o mesmo para o novo entendimento. Preciso creditar a edição do programa porque boa parte não é ao vivo e somos salvos pela edição (risos). Ela extrai o melhor da gente. Eu poderia não ser adequado ao papel, Boninho me fez um convite que muito me honrou e se mostrou viável, sem bicho de sete-cabeças.

Acho que acontece mais o inverso. Os dois últimos anos foram muito importantes. Por exemplo, no caso de Priscila Tossan, da última edição, buscávamos alguém com personalidade, que simplesmente fosse próprio. E ela representou isso. Ela era muito ela mesma e a minha aposta sempre foi originalidade. No ano anterior também quando escolhi Day Lima, ela me pareceu muito interessante e adequada ao mercado. Eu enxergo aquilo com a qualificação que tenho como profissional do mercado e vejo naqueles artistas uma maior ou menor aplicabilidade independentemente do concurso. Eu assisti, por exemplo, o musical “Elza” e encontrei Kessia Estácio, que foi do meu time e também a Cristal, que compôs o time de Claudia Leitte. Ambas se defendendo como artistas, estabelecidas. Nesse sentido, acho que acontece mais o contrário, eu uso o meu entendimento do mercado para entender a melhor forma de montar o meu time e encaminhar os meus artistas.

Este ano completam 25 anos desde que você e o Memê colaboraram pela primeira vez e explodiram em vendas. Fale um pouco dessa relação de parceria e o que ele preparou neste novo disco.

Ele é o DJ residente, foi a primeira pessoa que eu procurei quando me interessei por música eletrônica. Procurei o músico que tivesse trabalho na produção do primeiro disco do Gabriel O Pensador, na música “Tô feliz, matei o presidente”. Aí descobri que era o Memê. Liguei pra ele e foi muito receptivo, capaz de trocar, toda informação que eu buscava, ele estava disponível. Com o decorrer do trabalho fomos muito vitoriosos, cada um no seu patamar de mercado. Para determinados aspectos do meu trabalho eu sempre recorro a ele porque sei que ele entende as minhas necessidades.

Na faixa “Lava” você mergulha um pouco no universo sonoro do trio paulistano O Terno e tem até uma mensagenzinha dos caras no final da faixa. Como rolou essa aproximação com o Tim, Biel e Guilherme

Acredita que não gravamos pessoalmente? Eu já vi o Tim no backstage no meu show no Tom Brasil ano passado. Eu gravei em guitarra e voz, mandei pra eles e disse: “A música é assim” e pedi alguns elementos de arranjo. Quando mandei pra eles, sabia que era a canção mais excêntrica do disco e eu não queria que o meu tratamento domesticasse ela. Sabia que o “Terno” tinha tratamentos que dariam o frescor que eu queria. Nesse álbum eu deleguei para muita gente o encaminhamento. O meu entendimento nesse trabalho foi esse.

A única regravação é “The Look of Love”, um clássico de Burt Bacharach e Hal David. Tem alguma história curiosa por trás dessa escolha?

Tudo nesse disco está ligado às estações da paixão da minha relação com Clebson Teixeira, a quem esse trabalho é dedicado. Na verdade, aconteceu um episódio bem romântico, mais uma vez, promovido por ele, dentro de uma instalação em Inhotim, que foi um dos primeiros que ele me proporcionou. Tinha muita vontade de conhecer, mas nunca tinha ido. Nesta primeira ida entramos num local que era no alto de uma colina e era uma instalação fechada. Quando entramos dentro era escuro e com uma espécie de luz de boate todo forrado de espelho. Lá tocava “The Look Of Love”.

Você é o mestre em refletir sobre as transitoriedades da vida em suas canções. De onde surgiu a ideia de fazer um álbum chamado “Pra Sempre”?

Isso chegou agora, com a entrada de Clebson na minha vida. Comecei a escrever as músicas em maio do ano passado e a última foi justamente “Pra Sempre”, que compus em fevereiro. Cada uma das canções retrata um dos estágios do relacionamento – da paixão até a confirmação. Eu sei perfeitamente que nada é pra sempre, nem gente, nem civilização, nem sistema solar, nada é permanente, mas é poeticamente uma negação disso e uma insistência de que esse momento que estamos vivendo é para a eternidade.

No clipe de “Pra Sempre” me chamou atenção alguns livros que aparecem em cima da mesa. Um deles em especial é “O artista desaparecido”, sobre história da arte e que traz algumas ilustrações antigas sobre Lagoa Santa, uma cidade de Minas Gerais que você e o Clebson visitaram no início do ano. Foi apenas uma coincidência ou tem um propósito para estar ali?

Nem todos os livros são escolhidos. Por exemplo, teve o do Jô, que estava lá em casa e foi escolhido pela diretora de arte que estava lá em casa. O livro que estava no topo, de fato, era o “Artista Desaparecido”, que conta a história do Peter Lund. Clebson fez um roteiro de Minas Gerais com todos esses aspectos e essas minas são muito importantes. Eu gosto muito de geologia, deste aspecto das coisas, e a primeira gruta que fizemos foi a da Lapinha, que é justamente na Lagoa Santa. Aí comecei a comprar livros de Peter Lund, que evidencia a força da natureza e estranheza da natureza brasileira para um europeu! Se não fosse ele, o Brasil não conheceria a geologia de Minas Gerais.

E se o disco nasceu “de um amor em BH”, nada mais justo que começar a turnê em BH, certo? Quais são suas melhores lembranças da capital mineira ao longo da sua carreira?

Foi totalmente sem querer. Total e completamente circunstancial. Já estávamos marcados para a estreia no Rio de Janeiro e eu tive que fazer uma operação cirúrgico dentária e ficar 15 dias de molho. Por conta disso movemos e esses 15 dias deram justamente em Belo Horizonte! Eu conheço muito a cidade, os bairros pelo nome, os caminhos, as pessoas. Eu moro no Rio de Janeiro e ele mora em BH. Estamos juntos o tempo que é possível, nem sempre porque ele trabalha em T.I em Belo Horizonte, ele tem o trabalho dele e eu o meu.

A sua vida pode ser definida antes de Clebson e depois de Clebson? Ele me parece um importante componente das suas revoluções internas

Foi, totalmente. Várias das fantasias, aos desejos, aos sonhos, que eu pudesse ter e que não tivesse satisfeito ainda, ele trouxe esse elemento. Sobretudo a sensação de você se apaixonar por quem está apaixonado por você. Isso era uma novidade pra mim. É diferente você permitir que uma paixão aconteça ou por outro lado lutar ingloriamente para que uma paixão prevaleça pra outra pessoa, o que nunca vai acontecer, por mais acordos que se faça. Isso, por incrível que pareça, foi novo pra mim! Já tivemos o estágio da insanidade da paixão, que foi o primeiro ano, sabemos do que esperar um do outro, o que não esperar e o melhor modo de equacionar o que seja excelente pros dois agora nesse segundo ano que estamos casados de papel passado e tudo mais.

A gente sabe que os clássicos vão estar lá, algumas músicas do disco novo também, claro. Mas tem alguma surpresa no repertório que você esteja preparando pros fãs mais “radicais”? Resgatar algum som que você não toque há muitos anos ou de repente recuperar alguma música mais “lado-B”…

Entrou seis músicas do novo álbum. Já estava cantando “Orgulho e Preconceito”, “Hoje em Dia” e “Gritos e Sussuros” desde que elas existiram. Como o show é extenso e tem muitas músicas parecidas, eu acho que conto sobretudo com isso, acho que são as melhores que fiz nos últimos 15/10 anos. Porque eu tenho um motivo para compor que é muito mais orgânico do que você “ter que” encontrar um.

Lado B eu não faço (risos). Porém, no repertório tem uma canção que nunca cantei, que é “Lua de Mel”, que é uma canção do “Tudo Azul”, um bolero legítimo, que fez muito sucesso em Portugal, que foi trilha sonora da novela Sassaricando, mas não consigo considerar um lado b porque foi sucesso no Portugal.

Você não parece ter medo de errar. Há algo na carreira que você teve vontade de fazer, mas ainda não fez?

Eu tenho muito medo de errar, mas não evito agir por medo de errar. Receio de dar errado é saudável para resguardar um pouco. às vezes eu sou salvo pelas circunstâncias de fazer algo que eu achava que queria muito, mas seria um tiro na água. Eu já pensei em fazer um disco instrumental, mas isso não iria acrescentar nada na minha carreira. 15 pessoas iriam achar o máximo. Aprendi isso com muita clareza quando fiz duas apresentações no “Estrela do Lapa”, completamente lado b. Ensaiamos horrores, 1h20 do show, lá não tinha camarim, então, passamos pelo meio do público, quando saí, eu andei pela plateia e ninguém quis falar comigo. Senti a sensação do pessoal de lesado (risos). Como é que alguém iria assistir um show de Lulu Santos e não tinha sequer “A Cura”? Aquele caminhar pelo meio da plateia era palpável o desapontamento. Então, nunca mais na minha vida eu cometo uma estupidez dessa. Foi lado b total! Fiz para nada!

Você recentemente se posicionou ao lado dos estudantes em manifestações contra o governo. Como um artista, para você, qual é a importância desta “voz pública”?

Eu me coloquei ao lado dos estudantes no pleito deles. Entre a educação e qualquer outra coisa, eu fico com a educação, então dia 15, estou com vocês! Eu acho que você não pode evitar de ter uma opinião e demonstrar qual é a sua adesão pelo que você acha justo por qualquer receio.