Ela não tem uma supervoz, não é linda – na verdade tem algo de esquisita -, e também não é uma exímia dançarina. Por que, então, a gente gosta tanto da Camila Cabello? Sim, eu me incluo nessa. Por muito tempo, Camila foi a única integrante do Fifth Harmony da qual eu sabia nome e sobrenome – e isso não tem nada a ver com desmerecer as outras. É só que algumas pessoas nascem com luz e outras não. Carisma é algo inexplicável e inapreensível: ou tem ou não tem. Quando Camila está enquadrada pela câmera, é difícil alguém não simpatizar com ela. Recentemente, traduzindo a entrevista que a cantora deu ao POPline, nossa editora-chefe disse: “quero ser amiga dela. Pronto, amei”. Se eu pudesse resumir tudo em uma frase, seria isso: dá vontade de ser amigo dela. Ou melhor: todos sentimos que poderíamos ser amigos dela, porque nos vemos um pouco nessa garota, graças a sua simplicidade.
Eu me lembro de quando o Fifth Harmony foi ao “Caldeirão do Huck” e minha mãe, que nunca havia ouvido falar naquelas garotas, disse: “gostei dessa aqui, é muito simpática”. Ou quando o grupo ainda estava no “X Factor US” e, após uma apresentação, a jurada Demi Lovato disparou: “só a Camila brilha no Fifth Harmony”. Todo mundo sempre notou isso. Não foi exatamente uma surpresa quando ela saiu em carreira solo. Talvez tenha sido uma surpresa nesta semana, quando ela ocupou simultaneamente o topo das paradas de álbuns (com “Camila”) e singles (com “Havana”) nos Estados Unidos, o que é muito difícil de acontecer. Digo, chegar ao 1º lugar de qualquer uma dessas paradas não é fácil. Em início de carreira, menos ainda (o próprio Fifth Harmony nunca conseguiu). Fazer isso nas duas listas ao mesmo tempo é para poucos. Britney e Beyoncé conquistaram o mesmo feito, nos anos 1990 e nos anos 2000. Uma a gente chama de Princesa do Pop e a outra de Queen B. Isso deve significar algo.
Mas então é só isso? Camila tem carisma? Pode ser. Mas eu sou racional demais para me deixar levar por uma qualidade tão pouco clara. Preciso de justificativas mais consistentes e a verdade é que – por mais difícil que seja para qualquer um acima dos 25 anos admitir – Camila tem músicas bem legais. “Bad Things”, que ela lançou com Machine Gun Kelly, quando ainda estava no Fifth Harmony, é muito gostosa. Eu não me incomodava de ouvi-la sempre que tinha que entrar no Youtube para pegar o código do clipe para inserir em alguma matéria. E, como todo mundo que me acompanha no Instagram (@falaleonardo) sabe, eu sou o maior fã de “I Have Questions”. Divulguei e enalteci muito dublando no Stories. É viciante! “Crying in the Club” – uma parceria com ninguém menos que Sia – não me impressionou, mas aí veio “Havana”! Oh na na.
Precisamos falar sobre “Havana”. Lançar um single como esse em plena era Trump é um gesto político. Se fosse uma música chata, já seria um gesto louvável. Mas Camila Cabello veio com o “oh na na” que gruda como chiclete e faz todo mundo cantar contra a xenofobia enquanto se diverte. Os discursos dela, uma legítima cubana e imigrante nos Estados Unidos, ao falar sobre o assunto são autênticos – e estamos sempre em falta de autenticidade no mercado pop de produtos pré-fabricados. “Havana” era a música certa no momento certo. Percepção e estratégia são fundamentais na indústria. E Camila, que sempre teve um timbrezinho irritante, se cercou de grandes profissionais para ajudá-la a evoluir em tempo recorde. A lista de colaboradores de seu disco inclui Frank Dukes, Skrillex, Pharrell Williams, Ryan Tedder e Justin Tranter, nomes conhecidos por qualquer interessado em música pop. Dá para ouvir o álbum inteiro sem querer atirar o pau no gato. Gosto até de “Never Be the Same” – mesmo com aqueles falsetes miados. É um bom disco, mais maduro do que as canções da girlband. Permite que eu, que nunca fui o target do Fifth Harmony, também possa desfrutar sem me sentir retardado (porque às vezes a gente tem aquele guilty pleasure, mas não é o caso).
Também admiro o movimento de trocar o conforto pelo risco, que foi o que ela fez no fim de 2016. Ela e Zayn nunca sonharam em fazer parte de grupos pop, mas souberam usá-los como porta de entrada e catapulta para suas carreiras. É preciso inteligência emocional para saber a hora certa de mudar de rumo – com o networking estabelecido – e muita segurança para bancar as caras feias e narizes torcidos de quem preferia que tudo continuasse igual. Aprecio a coragem, que é de família: o imigrante no geral é corajoso, sonhador e batalhador. Rola um vídeo na Internet da Camila contando como teve que convencer Simon Cowell a deixá-la fazer a audição do “X Factor US”. Assistindo, você entende um pouco de sua persistência – e porque ela está onde está e tantos outros, mais ou igualmente talentosos, não. Ultrapassar barreiras e vencer resistências com um sorriso no rosto: esse é o segredo de Camila em busca de seus sonhos. Não é legal que nunca a tenhamos visto reclamar ou maldizer alguém? E não vou nem falar das performances, que estão cada vez melhores e bem produzidas… Suas apresentações na TV, cada vez melhores, também passaram a incluir uma guitarra, mais um plus. Vou só jogar as que mais gosto aí embaixo. Divirta-se.