Formada em Artes Cênicas, Heloisa Aidar nutre um amor gigante pela arte. Mas foi na música que ela encontrou moradia. Que bom! O mercado da música ganhou uma executiva de primeira que pensa estrategicamente, conhece toda cadeia produtiva da indústria e que sabe ser assertiva em tudo que se propõe a fazer.
Ela trabalhou em quase todas as áreas que a música a permitiu, fora dos palcos. Hoje, Helô (como o mercado costuma carinhosamente chamar a executiva, mesmo sem conhecê-la pessoalmente), é sócia e Diretora Executiva da Altafonte Music Publishing Brasil – uma das maiores distribuidoras do mundo, com sede na Espanha, onde aplica todos os conhecimentos acumulados na estrada, enquanto acompanhava artistas como Mariana Aydar e Tulipa Ruiz, para elaborar estratégias de lançamento de álbuns, curadoria de festivais e produzir eventos.
Por falar em estrada…
Helô começou no universo da produção com o Circo, ainda durante a faculdade. Mas foi ao lado da prima, a cantora Mariana Aydar, que se viu imersa na música e apaixonada por tudo que ela poderia lhe proporcionar (e vice-versa).
“Eu falava o tempo todo: ‘Mariana, pelo amor de Deus, me deixa trabalhar de qualquer coisa com você’. Eu ficava na porta, recebendo convidados, por exemplo. Mas um belo dia ela me ligou perguntando se eu queria ser empresária dela a partir do dia seguinte”, conta Heloisa.
Ela revela que nessa época ainda não tinha nenhum domínio sobre como ser uma empresária artística, mas aceitou sem pensar duas vezes. Seu primeiro desafio era conseguir um show para Mariana na Bahia. E prontamente soltou um “lógico que consigo”, mesmo sem saber por onde começar. “Eu lembro que foi um show no Pelourinho e que o Caetano Veloso foi. Esse foi o primeiro show que produzi dela. Acabei ficando em São Paulo e durante o show eu só chorava de tanto nervoso que eu passei”, conta.
Depois disso, ela decidiu que, para o modelo de produção que ela estava construindo, estar presencialmente nos shows e acompanhar as turnês da Mariana, era condição sine qua non para desenvolver um bom trabalho. “Eu ia em todos os shows e as pessoas que falavam só por telefone achavam que eu era mais velha, e eu só tinha 23 anos. Foi daí que entendi a importância de estar nos shows para minha maneira de produzir”, revela.
“É muito legal estar próxima da artista, estar no backstage. Nesse sentido foi muito bom ter feito a faculdade de artes cênicas, ter estado no palco para decidir não estar, sabe?”, comenta Helô.
A empresária trabalhou com Mariana Aydar por 4 anos, de 2006 até 2010. “Mariana já tinha muita experiência, muitos contatos, foi uma escola. Ela me solicitou muito. Ela já estava na estrada, já tinha gravadora, então ela exigia muito de mim sem dó nem piedade. Ela leva a carreira dela muito a sério”, conta. Ser exigida fez com que Helô tivesse que correr muito atrás, mas também a fez amadurecer profissionalmente.
Porém, chegou um momento em que, por serem primas, melhores amigas e até comadres (ela é madrinha da filha de Mariana), as coisas começaram a ficar muito misturadas. “Sempre que estávamos juntas, estávamos falando de trabalho… eu sentia muito falta de estar com ela só pessoalmente”, confessa. Foi aí que Tulipa Ruiz entrou na sua vida.
Tudo culpa do Gustavo
Quando o Gustavo Ruiz, guitarrista da Mariana e irmão da Tulipa Ruiz, soube que a Helô estava saindo do trabalho com a prima, começou a insistir para ela conhecer a irmã dele. A primeira vez que Helô assistiu um show da Tulipa foi de perder a fala. “Só conseguia olhar para Tulipa, foi uma paixão. Saí do show e só conseguia dizer: ‘Me espera que eu estou chegando’”, conta.
E já chegou mostrando serviço. O primeiro show produzido pela Helô foi o “Efêmera”, um dos álbuns mais queridos e elogiados da Tulipa. As duas seguiram juntas até o “Dancê” (2015). “Foi muito legal com a Tulipa porque era um caso diferente. Ela estava começando, não tinha a mínima noção de produção e eu já vinha com uma bagagem”, revela.
“A Tulipa me apresentou o desafio de ‘quero ser independente’, que é um caminho muito bonito de se traçar, mas ao mesmo tempo é um outro desafio, sentíamos que a gente era o nosso próprio projeto piloto”.
Durante o bate-papo leve, honesto e descontraído com o POPline.Biz é Mundo da Música, a empresária revelou que essa foi uma época em que se transformou muito como pessoa e profissional. “No começo da Tulipa eu ainda achava que ia ganhar o mundo sendo grossa, que eu tinha que me impor como mulher. Também foi um caminho de amadurecimento para entender que eu podia ser menos grosseira e me colocar de uma outra maneira”, contou.
Se intitulando “neurótica por organização e limpeza”, Helô decidiu melhorar a distribuição da Tulipa com o lançamento de “Tudo tanto” (2012). “Eu já tinha a Pomm_elo Produtora, que era a minha empresa do coração, aí eu montei a Pomm_elo Distribuidora, para distribuir os discos da Tulipa e editar as obras dela”.
Como empresária, Helô revela que não conseguia se dividir para atender mais de uma artista. “Eu tinha minha cabeça muito focada no artista e eu não conseguia pegar outro, era até injusto com outros artistas. Na distribuidora eu consegui”.
A distribuidora começou a crescer. “O Fióti, meu irmão, meu melhor amigo, chegou para mim e falou: vou lançar o disco do Emicida, pode fazer por aí?”. A empresa lançou o aplaudido “O Glorioso Retorno de Quem Nunca Esteve Aqui” e, a partir daí, começou a entender que poderia ter outros artistas.
“Contratei uma pessoa que é fundamental na minha história chamada Khadija Alves, uma mulher com quem eu aprendi muito. Ela também foi junto comigo depois para Secretaria, para a Altafonte, e agora a gente tá trabalhando separadas, mas ela virou muito a alma da distribuidora. Foi ela que levou os artistas de rap para a empresa”, conta.
Mãos na música, pézinho na política
Com nome consolidado, uma larga experiência de produção de grandes festivais, turnês internacionais e artistas consagrados, Helô recebeu um convite de Juca Ferreira, à época Ministro da Cultura, para fazer uma consultoria para o Ministério Público.
“Era uma ação voluntária, éramos um grupo de pessoas de diferentes áreas, rádio, empresários…tínhamos a missão de fazer um projeto de uma Agência Nacional da Música, baseado um pouco no que era a Ancine para o audiovisual”, lembra.
Isso foi em 2016. Ela ainda estava com a Tulipa. O projeto não foi concluído, mas foi um passo muito importante para a carreira de Heloisa. “Foi para mim um momento que eu abri um pouco minha cabeça de que eu queria estar envolvida com coisas maiores, não no sentido artístico, mas de uma grandiosidade onde eu esteja em contato mais com o mercado, com meus pares e não mais diretamente com artista. E foi assim que eu decidi então sair do empresariamento da Tulipa”, conta.
Foi nesse momento que ela abriu uma empresa chamada Brisa – que é o nome da sua afilhada, filha da Mariana -, ao lado da cantora e do seu marido, o músico Marcio Arantes – produtor musical que já trabalhou com Maria Bethânia, Emicida, Mariana Aydar, no qual ganhou o Grammy pelo disco “Veia Nordestina”. A empresa era focada em produção de trilhas sonoras para audiovisual.
“Aí foi uma empresa que a gente teve por um tempo que foi muito legal. A Brisa só deu coisas boas para a gente. A gente fez campanhas da Schin, Farm, Natura, Facebook, uma série de campanhas muito massa”, conta.
Mas chegou uma hora que Helô estava super envolvida na produção de grandes festivais e desenvolvendo o seu outro lado, agora como contratante. Assim, as atividades individuais dos sócios acabaram “engolindo” o tempo de dedicação para Brisa e ela deu um tempo nas atividades.
Enfim, Altafonte
Nesse período, a Pomm_elo virou um selo, e o Fábio Silveira (atual Gerente de Produto Podcasts no Grupo Globo), que na época estava na Altafonte, entrou em contato para organizar a distribuição da Tulipa e dos demais artistas do selo por lá. “Eu estava com a cabeça meio cheia, já tinha uma outra distribuidora e achava meio terra de ninguém. Achava um negócio meio solto, sem estratégia, era um lugar que eu não gostava nem um pouco”.
“Aí um dia ele me ligou e falou o Nando Luances, dono da Altafonte, tá aqui, você quer conhecê-lo? Foi então que conheci ele e a esposa, Inma Grass. São duas pessoas com princípios muito parecidos com os meus e com um jeito muito disruptivo de pensar. Uma vontade muito grande de fazer fora da caixa, que é minha natureza. E eu me apaixonei por eles, foi uma sinergia maravilhosa”, conta.
“Comecei a distribuir a Pomm_elo com eles e a perceber que existia sim estratégia, mas mesmo assim eu não dava muita abertura. Porém, toda vez que o Nando vinha para o Brasil a gente se encontrava. Até que chegou um dia e ele falou: “Helô, não sei como, mas a gente precisa trabalhar junto. Entra para Altafonte e a gente vai vendo o que vai acontecer”.
Ela topou. Entrou para Altafonte em 2018 e começou a trabalhar na distribuidora levando grandes artistas para a empresa. A entrada de Helô foi no mesmo período que o Alex Schiavo, ex-presidente da Sony – onde atuou por 10 anos, foi anunciado na Altafonte. “Quando vi a matéria da entrada dele e mandei uma mensagem para o Nando na mesma hora, no auge da minha arrogância: “Nando você está trocando seu caminho. Boa sorte, um beijo”. Ele respondeu: “Heloisa pelo amor de Deus, calma. O Alex vai aí”.
O Alex foi até ela e a Helô descobriu um dos maiores parceiros profissionais que já teve na carreira. “O Alex é um poço sem fim de aprendizado. É um absurdo, ele é um gênio! É inacreditável trabalhar com ele, uma sorte muito grande”, revela.
Em janeiro de 2019, o Nando comprou a Pomm_elo. Em fevereiro ela recebeu o convite para assumir a coordenação de programação da Secretaria Municipal de São Paulo, e promover um dos maiores eventos da capital, que foi a Virada Cultural de 2019.
“Como eu era sócia da Altafonte, não corria um problema jurídico em relação a isso e eu fui trabalhar na Secretaria de Cultura. Foi o maior desafio da minha vida. Eu ainda não sei o que aconteceu naquele ano, foi o único ano da minha vida que eu perdi a rédea do tempo. Me afastei de tudo e de todos, eu não conseguia falar com ninguém”, desabafa.
Ela lembra que acordava às 6 horas da manhã, às 8 horas já estava na secretaria, às 18h saía de lá e ficava trabalhando na Altafonte até às 22h, chegava em casa e dormia. “2019 foi um ano completamente à parte para mim… Acho que quando eu tiver 60 anos eu vou olhar para trás e falar: Gente, que loucura!”, brinca. Em fevereiro de 2020, quando eu ia completar um ano e poder tirar férias, ela pediu demissão.
“Estar na Secretaria colocou minha arrogância no chão. Eu pensei: ‘quantas vezes eu não tratei pessoas da secretaria que eram minhas contratantes de uma maneira arrogante?’. E é muito legal quando a gente se coloca no lugar do outro”, revela.
Ao sair da Secretaria, Heloisa mergulhou 100% na Altafonte. Assumiu a Diretoria Executiva da Altafonte Music Publishing Brasil, que cuida das obras de importantes autores como Arnaldo Antunes, Gilberto Gil, Marina Lima, Alok, Lenine, Letrux, Rubel e Duda Beat, entre tantos outros.
Por toda essa trajetória, Heloisa Aidar é convidada frequentemente para palestras e eventos e mostra como seu pulso firme, sua mente aberta, sua coragem e vontade de fazer diferente, a transformou na mulher inspiradora e empresária de referência no mercado que é hoje.