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First Listen: Baco Exu do Blues narra uma história de amor devastada em “Paris”, seu novo single

Para chegarmos à “Paris”, o novo single de Baco Exu do Blues, é preciso voltar um pouco no tempo e entender como um dos artistas mais incensados do momento construiu sua breve carreira. O baiano Diogo Moncorvo apareceu em 2016 ao lado de Diomedes Chinaski no single “Sulicídio”, onde questionava agressivamente a desvalorização do rap feito do Nordeste em detrimento da música produzida no Sudeste. Ao questionar esta segregação, Baco incomodou muitos dos grandes nomes da cena e, ao mesmo tempo, ganhou notoriedade. Os fãs apareceram aos montes. As ameaças também. O combo “amor e ódio” o levou à uma depressão que o fez pensar em suicídio. Foi sob esta ótica que muitas das faixas de Esú (2017), seu primeiro álbum, foram concebidas.

Filho de uma professora de Literatura, Baco abandonou os estudos para se dedicar à carreira de MC. Pela vivência que teve, consegue agregar à sua música elementos de escritores como Jorge Amado, temas como racismo, desigualdade social, empoderamento, mitologia e até mesmo distúrbios psicológicos sem soar elitizado. Por isso chama atenção a escolha inteligente de Baco ao imprimir uma linguagem “chula” às suas letras. Ela traz um certo desconforto para quem não viveu a realidade das periferias baianas como o artista, mas é fundamental nesta quebra de barreiras de comunicação. Definitivamente, é uma característica um tanto atrativa a uma geração que reluta a ouvir ideias complexas que tome seu tempo.

Mas o pulo do gato na carreira de Baco foi o lançamento de Bluesman, segundo e incensado disco, eleito por muitas publicações como o melhor de 2018. O rapper virou notícia no mainstream por conta da faixa “Me Desculpa Jay-Z”, onde canta sobre sonhos eróticos com Beyoncé, esposa do rapper norte-americano. Mas o grande mérito deste trabalho é reafirmar, ainda mais, o orgulho de ser negro em um momento de grande intolerância entre as pessoas, fruto de uma disputa política que dá voz a aqueles que espalham ódio e preconceito diariamente. “Não sou obrigado a ser o que vocês esperam. Somos muito mais“, atesta Baco na letra de “B.B. King”, faixa que encerra o disco e que deixa claro que ser um bluesman é ser o inverso do que os outros pensam.

Da crueza franca de Esú ao refinamento estético de Bluesman, Baco Exu do Blues chega a “Paris”, seu mais novo single. Na última segunda-feira (25), o rapper publicou a foto da capa do single e escreveu em suas redes sociais: “Espero que toque a alma de vocês, quem acredita no trampo deixa um comentário positivo ou sobre o que achou da capa”. O belo registro do fotógrafo Roncca abre margem para várias interpretações. Seriam dois amigos? Dois irmãos? Um casal de namorados? Mensagens subliminares como esta fazem lembrar os questionamentos sobre orientação sexual que Baco foi submetido durante um papo com fãs no Instagram em dezembro.

E o jovem que via na música a única perspectiva para sobreviver chegou rapidamente à “Paris”. Não a capital francesa (ainda). Mas aqui observamos um artista em desenvolvimento, experimentando as possibilidades que o sucesso e a fama lhe dá. Mas tratando-se de Baco, nunca saberemos ao certo se as canções partem de uma vivência real ou de uma licença poética. A música começa com um homem em uma breve discussão em francês:

“J’en ai marre, à chaque fois que je t’appelle (Estou farto toda vez que te ligo)
À chaque fois que je t’appelle (Sempre que eu te ligo)
Tu me réponds par A+B (Você me responde por A + B)
Je sais pas ce que tu veux (Eu não sei o que você quer)
Je sais pas ce que tu veux au final (Eu não sei o que você quer afinal)
Qu’est-ce que tu veux de moi? (O que você quer de mim?)
Mais qu’est-ce que tu veux de moi, putain? (Mas o que você quer de mim, droga?)
Je suis tout le temps là pour toi (Eu estou sempre lá por você)
Je suis tout le temps là pour toi (Eu estou sempre lá por você)
Mais tu m’écoutes jamais, tu m’écoutes jamais (Mas você nunca me escuta, você nunca me escuta)”

Baco começa a versar sobre uma batida lenta que imediatamente nos remete à “Me Desculpa Jay-Z”. Enquanto canta, mostra toda sua vulnerabilidade para uma pessoa que parece não querer estar ali naquele relacionamento. “Outro cigarro e eu pensando no fim / Não se jogue sem mim / As minhas noias te tiraram de mim / Não se jogue sem mim / Eu sei que você sabe que a vida é mais dura do que eu posso aguentar“, lamenta. O narrador se confunde com a história de vida do rapper e canta toda trajetória que Baco viveu nesses últimos anos: a batalha por um lugar no mundo, a ascensão artística, a dualidade entre ter dinheiro e lidar com uma depressão. E por fim, ter tudo isso e não ter a plena realização emocional.

Se os artistas da cena hip hop estão mais preocupados com técnica, fazendo gravações pensando no flow rápido, na rima perfeita, no punchline, Baco vai além e comprova ter o feeling necessário para envolver o ouvinte em sua narrativa. Claro que esses aspectos técnicos também estão presentes até certo ponto. Mas “Paris” te conduz a uma história que poderia perfeitamente servir de pano de fundo para um filme de Tarantino. E emociona. A maior qualidade da obra de Baco está nesta (des)construção estética, aliada à habilidade em comunicar-se com a geração que acompanha a evolução do rap.

Ao fim, mais um diálogo em francês e um choro contido. E é neste momento que talvez esteja a pista sobre a dúvida suscitada desde a revelação da capa do single:

“Qu’est-ce que tu veux? (O que você quer?)
Qu’est-ce que tu veux de moi, putain de merde? (O que você quer de mim, merda?)
Qu’est-ce que tu veux de moi, de moi, putain de merde? (O que você quer de mim, de mim, merda?)
Hey gros, arrête de pleurer, tu sais (Ei grande, pare de chorar, você sabe)
Ça va aller (Vai)
Ça va aller gros, ça va aller, t’inquiète (Vai ser bom, vai ficar tudo bem, fique tranquilo)
Hey, je te comprends (Ei, eu entendo você)
Il n’y a pas de mauvaise heure, il n’y a pas de mauvais choix (Não há tempo ruim, não há escolha errada)
Tant que tu es toi-même gros, t’inquiète (Contanto que você esteja firme, fique tranquilo)
Eh, on est frangins, tu es pas seul (Ei, somos irmãos, você não está sozinho)
Tu es pas seul (Voce não está sozinho)
Merci (Obrigado)
Tu as compris ou quoi? (Você entendeu ou o quê?)
Tu es pas seul ‘hijo’ (Você não está sozinho ‘filho’)”

Por fim, a dúvida sobre qual tipo de relação existe ali. Um misto de fotografia e cinema funde-se nesta canção que promete dar margem à histórias e devaneios diversos. Este é o indecifrável Baco Exu do Blues, que gosta de se descrever assim: “Não sou legível. Não sou entendível. Sou meu próprio deus, meu próprio santo, meu próprio poeta. Só eu posso fazer a minha arte. Só eu posso me descrever. Vocês não têm esse direito“, como fica explícito em mais um trecho da canção “B.B. King”. Cabe a cada um fazer sua livre interpretação da música que estreará nesta sexta-feira (29) em todas as plataformas digitais.

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