Quantas histórias existem em uma música? Ou, o que o artista quis dizer em seus versos que acabam se consolidando na vida das pessoas e na suas memórias afetivas?
E mais, o que o fã nunca viu o seu artista preferido responder? Ou, que tal conhecer novos artistas e a diversidade das expressões musicais brasileiras?!
Todas essas perguntas podem ser tema de um bom Papo de Música e para amantes dessa arte, Fabiane Pereira, Jornalista Musical, criou um projeto exatamente com esse nome; que é um canal do YouTube lançado em 2018 e neste ano, inicia uma nova etapa no universo de Podcasts e com o projeto contemplado pelo Edital Natura Musical, “Papo de Música pelo Brasil”.
Fabiane Pereira é jornalista, apresentadora, curadora, escritora, roteirista, programadora e pesquisadora musical. Há nove anos, apresenta o programa de rádio FARO atualmente transmitido na rádio MOOD FM (104.5), aos domingos, 21h.
Ainda atua como jurada de prêmios e seleções de melhores músicos do ano em vários veículos, dá mentorias em projetos que têm a arte como foco e participa de algumas comissões de especialistas de editais, festivais e eventos ligados à cultura.
É pós-graduada em “Jornalismo Cultural” pela ESPM; em “Formação do Escritor” pela PUC-Rio, em “Jornalismo Contemporâneo” pelo Instituto Universitário de Lisboa e mestre em “Comunicação, Cultura e Tecnologia da Informação” também pelo Instituto Universitário de Lisboa, Portugal.
Em 2015, idealizou o projeto musical-literário SOM & PAUSA – Vozes da Cena Contemporânea Carioca, que reúne 50 nomes da cena musical do Rio de Janeiro – entre artistas e produtores – pra falar sobre seus preciosos momentos de sons e pausas.
Em 2017 lançou seu primeiro livro de crônicas batizado de amadorA. A Jornalista ainda colabora com diversos sites musicais e toca outros projetos pela sua empresa, a Valentina Comunicação.
O Papo de Música leva pro Youtube, semanalmente, entrevistas descontraídas com artistas dos mais variados gêneros musicais num tom intimista.
O objetivo do canal é levar pra plataforma de vídeos um conteúdo exclusivo, dinâmico e de qualidade com artistas que fazem da música brasileira nosso maior patrimônio cultural.
No Papo de Música já estiveram: Adriana Calcanhotto, Erasmo Carlos, Lulu Santos, Felipe Ret, Nando Reis, Criolo, Pabllo Vittar, Xênia França, BK’, Duda Beat, Rubel e muitos outros grandes nomes.
Fabiane também apresenta o programa de rádio Palco Brasil, semanalmente, na rádio portuguesa Marginal FM. Nele, ela entrevista grandes nomes da música brasileira que estão de passagem pelo país europeu.
No último ano, Fabiane venceu na categoria de “Melhor Jornalista Musical” no Womens Music Event Awards (WME Awards) 2019.
Alguns dos próximos nomes que estão no Papo de Música em 2020: Ney Matogrosso, Vitão, Johnny Hooker, Ana Cañas, As Bahias e a Cozinha Mineira, Tuyo, Zeca Baleiro.
O Mundo da Música entrevistou Fabiane e aproveitamos a dinâmica de um bom papo muito rico sobre música para dialogar sobre: mulheres no mercado musical, rádio, Jornalismo musical, música brasileira, novos projetos do Papo de Música em 2020 e mais!
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Mundo da Música (MM) – Como surgiu a sua ideia de colocar a música como protagonista e criar o Papo de Música?
Fabiane Pereira, Papo de Música – Eu apresento um programa de rádio no Rio de Janeiro há mais ou menos 10 anos, pra ser mais específica, vai fazer 10 anos agora em setembro de 2020; que é voltado para “Nova Música Brasileira”, o que os Jornalistas costumam chamar a galera que começou a fazer música e lançar disco na virada do milênio, uma turma que vem principalmente aqui no Rio, no rastro dos Los Hermanos.
Desde que eu apresento esse programa de rádio, ele já mudou de estação três vezes, mas, nunca perdeu a essência que é promover o que a gente chama de “Nova Música Brasileira”.
Só que, justamente por conta desse recorte ser muito restrito, eu senti falta de conseguir me comunicar com mais gente e de também entrevistar artistas que eu admirava muitíssimo, mas, que estavam fora desse recorte.
Que eram artistas muito consagrados ou então, artistas que estavam fora dos gêneros musicais que as rádios que eu trabalho aceitam. As três rádios pelas quais eu já passei como apresentadora do Faro MPB, são rádios chamadas “Rádios Adultas” então, nós temos uma restrição de gênero também.
Eu nunca pude, por exemplo, entrevistar no Faro: ninguém do Funk, poucas pessoas do Rap, porque são rádios que não tocam na programação gêneros mais populares. Então, eu tinha essa frustração como Jornalista Cultural e Musical de não conseguir falar e me comunicar com esses artistas que eu gostava e gosto muito.
A partir daí, eu estava há mais ou menos três anos pensando na ideia de fazer um canal no YouTube. Só que eu não sei editar. E eu realmente sou muito ruim de edição (rs.).
Tentei aprender com tutorial no YouTube, mas, enfim, não saberia fazer! E eu demorei também para achar um parceiro que quisesse entrar nessa empreitada comigo. Uma vez que eu encontrei um parceiro, nós falamos: “Bom, vamos colocar no ar na cara e na coragem!”.
É um investimento. Porque como eu não sabia editar, quando você tem uma câmera e faz edição em casa, uma coisa mais caseira, você tem um investimento baixo.
No nosso caso, a gente quis levar para o YouTube um programa de entrevista que fosse bem editado no sentido de: nós temos três câmeras desde o início, queríamos que tivesse um acabamento de edição e que isso fosse um diferencial.
Eu costumo dizer que a edição do Papo de Música é um terceiro elemento do canal, porque é quase um terceiro entrevistado. Nós pontuamos e marcamos bastante as entrevistas com a edição.
Então, isso era muito importante para a gente, para o conceito que nós criamos para levar à internet. Para além disso, também tinha o gasto de deslocamento e logística, porque não dava pra trazer todos os artistas para serem entrevistados na minha casa.
Foto: Nando Reis e Fabiane Pereira para o Papo de Música. | Créditos: Divulgação
Muito deles possuem a agenda super lotada e eu consigo entrevistá-los no camarim, em qualquer resquício de agenda, mas, eu não conseguia. Nós tínhamos esse custo de logística.
Portanto, Vitor e Eu – que é meu sócio no canal, editor e diretor – resolvemos investir em 10 programas. Colocá-los no ar aos poucos e apresentarmos para algumas marcas.
E a partir disso, começamos o canal em novembro de 2018 e quando foi em janeiro, nós já tínhamos apoiadoes.Que acabaram fazendo com que nós não tivéssemos custos, nós não ganhávamos, mas, não havia custo para manter o canal.
E assim, nasceu o Papo de Música!
MM – Quais vozes ecoam quando você fala sobre música e valoriza os agentes e histórias que fazem com que ela exista?
Fabiane Pereira – Eu acho que em primeiro lugar, a voz feminina. Porque mulher dentro desse mercado de Jornalismo Musical, ainda somos poucas.
Eu venho de Rádio, o mercado de Rádio é um mercado que tem poucas locutoras. Dentro do meu segmento, que é mais nichado, de “Nova Música Brasileira”, eu conheço duas: Patrícia Palumbo, que é a minha grande inspiração; e Roberta Martinelli, de São Paulo.
Uma das vozes que ecoam dentro do meu canal e eu recebo muito feedback disso, é a voz da mulher que quer fazer Jornalismo e se especializar em Música.
Porque ela vê que é possível realizar um projeto sendo mulher, e querendo escrever sobre música. Nós ainda temos uma imprensa jornalística de música muito masculina, então, essa é uma das vozes.
Também por conta de eu vir de rádio que chamava “MPB FM”, que foi criada no Rio de Janeiro, ela durou 17 anos no dial carioca e ela tinha como premissa anunciar e desanunciar todas as músicas com o nome dos compositores. E eu tenho essa escola.
E apesar disso ser uma lei federal, não é cumprido no dia-a-dia pelas rádios de modo geral. Portanto, fiz questão de todas as músicas que nós colocamos no canal elas serem creditadas com o nome dos compositores, porque eu acho fundamental que a gente promova esses artistas.
Na verdade, eles são artistas também! Eles quem escrevem os versos, as poesias, aquilo que embala a nossa memória afetiva, eu acho indispensável nós ecoarmos e promovermos essas vozes.
E uma outra voz também que eu considero fundamental é a voz da diversidade. Porque dentro do canal é muito orgânico, eu não fico pensando “ah, eu tenho que colocar um artista negro, um artista LGBTQ+” é algo reamente muito orgânico pra mim.
E se você observar o canal, você vai ver que todos os públicos estão inseridos. Nunca recebi nenhuma crítica do tipo, “tem pouca mulher, mas, tem muito gay”.
Não, tudo está sempre muito contemplado. Porque a música brasileira é muito diversa e uma das coisas que eu quis ecoar é a diversidade da música brasileira e isso está muito impresso no canal.
Então, eu acho que esses três pilares são coisas que eu faço questão de promover que é: diversidade, mulheres no mercado da música e o pilar da gente falar sobre os compositores das canções.
MM – Além desses elementos percebemos que você explora o ineditismo quando pergunta “conte algo que você nunca falou” para os entrevistados. Pra você, qual o panorama do Jornalismo Musical no Brasil?
Fabiane Pereira – Eu sinto duas coisas e eu recebo de feedback: a primeira é que eu acho é que, de um modo geral, o mercado de jornalismo musical, ele fica muito acomodado.
Quando a gente vê um artista lançando um disco, se nós lermos 10 matérias sobre o lançamento daquele disco, a gente percebe que 60% das perguntas são as mesmas.
Então, eu tinha muita preocupação de “não ser mais uma nesse rolê”. E eu acho que, pelo feedback que eu também recebo dos artistas, que eu tenho conseguido levar para internet um tipo de questionamento, de indagação e provocação que o fã daquele artista não está muito acostumado a vê-lo falar.
E eu tive muita preocupação: cada entrevista eu realmente trabalho em cima do roteiro, sou eu quem faço o planejamento das entrevistas, de todas elas, então eu realmente trabalho muito em cima do roteiro.
Te digo que 90% das entrevistas eu não sigo o roteiro. Porque nós acabamos desencadeando para outra conversa, outro assunto, mas, àquela base de informações está lá, eu estou segura daquilo que estou falando.
Eu entrevisto artistas há 13 anos. E além do Faro, eu apresento um programa de rádio em Portugal que também entrevisto artistas e sou Jornalista Musical, nunca trabalhei com outra coisa. Então, a minha vida inteira eu só entrevistei os artistas.
É um desafio a gente fazer uma entrevista diferente, com os artistas que estão muito na mídia ou com àquele artista que não quer falar.
Já aconteceu muitas vezes e eu posso citar, Jorge du Peixe, vocalista do Nação Zumbi, pernambucano. Quando eu cheguei para entrevistá-lo ele disse “só tenho 10 minutos, não posso dar entrevista em dia de show, etc”, e eu falei “beleza, a gente vai fazer em 10 minutos”.
E a entrevista rendeu muito e quando completou 10 minutos, a Assessora de Imprensa dele veio falar “olha, já deu o tempo” e ele respondeu “Não, pode continuar! Tô adorando a entrevista, achei que você ia fazer umas perguntas óbvias e as perguntas são ótimas”.
Enfim, eu acho que eu tenho muito essa preocupação de fazer com que o artista queira me dar a entrevista. Que ele entenda que ele está ali para falar de coisas diferentes do que ele está acostumado a falar.
MM – Pesquisas como Kantar IBOPE Media e IFPI apontam que o Rádio segue em alta popularidade e é um dos principais meios de comunicação do Brasil. Na sua visão, qual o momento do Rádio no país? Quais mudanças de mercado que você percebe?
Fabiane Pereira – Eu acho que quando falamos de rádio, temos que entender dois pilares: o primeiro dele é o rádio fora das metrópoles.
Porque eu que estou aqui no Rio de Janeiro e tenho muitos amigos em São Paulo, vou muito para lá, e ouço muitos dizerem: “ah, mas, ninguém hoje ouve rádio”.
Só que a minha família é de Volta Redonda (RJ), uma cidade que há 1h30min do Rio de Janeiro e lá, as pessoas se informam pelo rádio. Quando a gente fala de Brasil, a gente fala de um país que não é um “país metrópole”, mas, um país rural.
A maior massa populacional do país está fora das grandes capitais e nesses lugares, o rádio é o principal veículo de comunicação e informação.
E claro que a partir desse prisma, nós temos pesquisas dizendo que o rádio continua cada vez mais sendo um veículo de massa.
Porque o rádio não precisa de internet, você não precisa de Wi-Fi, e isso é também uma questão: nós temos um Wi-Fi nacionalmente falando, muito precário.
Nós temos uma internet boa funcionando nas grandes capitais, mas, quando a gente vai para o interior do país – e eu não estou falando do interior em cidades fora do estado de São Paulo e da Cidade do Rio de Janeiro não, só fora das capitais – temos uma internet completamente deficitária. O Brasil é um país em desenvolvimento, eternamente em desenvolvimento.
Foto: Marina Lima e Fabiane Pereira para o Papo de Música. | Créditos: Divulgação
Nós estamos agora com políticas de cultura sendo completamente desastrosas.
Possuimos um legado do Ministro da Cultura Gilberto Gil (2003 – 2008) e Juca Ferreira (2008 – 2010) sendo esquecido, para não dizer apagado, há um silenciamento cultural que faz com que o rádio se torne a maior fonte de informação.
Além disso, nós temos um outro problema seríssimo no Brasil que é a não-democratização midiática.
O quê que isso significa? Significa que a maior parte dos meios de comunicação estão nas mãos de pouquíssimas pessoas.
E dentre essas poquíssimas pessoas, nós temos a Igreja. E isso faz com que a informação seja muito filtrada e direcionada. Nós não temos no rádio a pluralidade da música e da cultura brasileira.
A gente tem uma mono-música na rádio que é o Sertanejo, que é um gênero que eu, particularmente, adoro ouvir; só que é uma indústria de compartilhamento de um único gênero no rádio. E isso é péssimo para o Brasil e para a nossa cultura.
Nós temos um país tão diverso e a gente não vê essa diversidade representada. Nem na Câmara, nem no Senado, nem no Rádio e nem na Mídia, de um modo geral.
Mas, eu considero o rádio fundamental, eu espero nunca deixar de fazer rádio!
Eu tenho muita vontade de fazer programas de rádio ao vivo, na minha cidade; onde eu já fiz o Faro ao vivo, que era um programa de duas vezes na semana só.
Eu tenho muita vontade de ter um programa de música diário em uma grande capital: São Paulo, Rio de Janeiro e que esse programa também seja reverberado para outros cantos, porque eu acho que o rádio é essencial.
MM – Se por um lado, a dinâmica digital abre portas para um mercado musical mais democrático, por outro, os algoritmos são um desafio para o crescimento orgânico. Diante desse cenário, como você percebe que os novos artistas lidam com a pressão sobre números e a manutenção da sua criatividade artística?
Fabiane Pereira – Eu acredito que nós estamos vivendo um momento muito único. Porque a revolução digital ela não tem precedentes na história e ela está acontecendo.
Ela não aconteceu e parou, ela está acontecendo e está em processo. Eu acho muito difícil para os artistas da nova cena esse desafio, porque, de fato: números e algoritmos hoje fazem a diferença.
É muito importante para um artista conseguir: público, matérias em jornais, entrar em rádio, aumentar o número de views e é muito difícil se ele não tem um engajamento alto nas redes sociais.
E é muito difícil e desafiador para mim, também, tendo um canal digital!
Eu preciso toda a semana ficar pensando como eu posso fazer para engajar mais pessoas a conhecerem o meu canal. E não é fácil.
Agora, eu vou falar uma coisa que pode parecer – e muitas vezes eu ouvi de outras pessoas mais experientes e eu achava que era meio “ah, que papo chato” – mas, você quando faz algo que de fato acredita e você tem muito tesão naquilo que você faz, eu acho que aí tá a fórmula do sucesso, no sentido de sucesso como estar em paz com sua consciência e com àquela sua ambição profissional.
Portanto, eu acho que um artista novo e qualquer pessoa que é do digital, antes dele pensar em aumentar o algoritmo, ele precisa pensar se ele está, de fato, dentro da sua própria verdade.
Eu acho que existe hoje em dia um “estupro digital”. Eu tenho a impressão que alguns artistas eles se deixam “estuprar” pelo mercado no sentido de fazer com que seus números aumentem a qualquer custo.
E eu acho que você até consegue, momentaneamente, ter um aumento de engajamento. Mas, qual o preço que se paga por esse “a qualquer custo”?
Eu sempre pensei no canal, na minha carreira, como uma construção de vida. E eu acho que os artistas que de fato tem essa compreensão de carreira de como construção de vida, que eles chegarão no lugar que eles desejam.
Vou dar exemplo de dois artistas da nova geração que eu acho que fazem isso muito bem: Rubel e a Duda Beat.
A Duda Beat é um fenômeno. Ela estourou de uns tempos pra cá, mas, eu acho que desde o início – e ela fala muito isso no canal – a Duda eu entrevistei antes de estourar no Papo de Música.
E ela fala sobre isso: a estratégia que ela desenhou para chegar onde ela queria chegar, a construção de carreira.
E o Rubel é um artista extraordinário quando ele diz que não tem vergonha da ambição dele: ele sabia onde queria chegar. E não estava disposto a fazer qualquer coisa para os números dele chegarem rapidamente, mas, que ele sabia que os números dele chegariam.
E eu acho que os dois artistas hoje têm uma visibilidade digital que foi muito construída. Não são artistas que “do nada” estouraram.
São artistas que inclusive para o mainstream, ainda não são gigantes.E são artistas que tem números, que engajam público, fãs, e que sabem caminhar no digital.
Eu pego sempre eles como exemplo pra dar, não apenas em uma entrevista, mas, pra mim; no meu dia-a-dia, sobre como criar uma estratégia para o meu canal crescer também.
Eu também acho essencial que as marcas que de certa maneira se atrelam a canais e artistas, pensem um pouco mais em conteúdo do que em números.Porque muitos canais e artistas que têm números que as marcas gostam, mas, não tem conteúdo.
E aí não é uma questão de “música boa x música ruim”. Não é essa dicotomia. É uma questão de conteúdo.
A sua imagem, o seu canal, a sua música, ela precisa ter conteúdo. E conteúdo é: qual a mensagem que você quer passar com essa música?
Portanto, às vezes eu vejo várias marcas que eu acho interessantíssimas, se associando com canais cujo conteúdo você fala: só tem números.
O conteúdo de fato é nada, é raso, é falar sobre nada. É muitas vezes xingar o outro, ir de desencontro às pautas progressistas.
E aí eu fico pensando: por que que essa marca está se associando com determinado canal e artista? Porque eles querem só números.
E eu acho que o grande desafio dessa nova década, desses próximos 10 anos é de fato as marcas entenderem que conteúdo é fundamental para tudo.
Foto: Fabiane Pereira e Lenine para o Papo de Música. | Créditos: Divulgação
Para conseguirmos colocar nas pautas públicas, pautas progressistas; para conseguirmos de fato ter uma equivalência entre homens e mulheres no mercado; eu acho que já que nós não temos hoje uma legitimação do Estado na questão da cultura, do setor cultural, nós precisamos que os gestores que estão na frente das marcas olhem para esse lado.
É papel deles? Não é papel deles. Mas, diante da situação que a gente se encontra é fundamental que eles nos deem as mãos. Porque senão nós não vamos conseguir.
A gente vai ser aterrado pela bancada evangélica, pelos evangélicos que de fato que estão pautando as questões públicas – não estou generalizando a religião, mas, falando sobre essa associação que a religião evangélica, de um modo geral, tem com a política e como isso de uns tempos pra cá ficou muito forte – e faz com que, por exemplo, o gênero Rock não seja mais aceito em um edital federal.
O que beira o absurdo! Então, precisamos que as marcas nadem junto com a gente nessa progressividade.
E não se unam, única e exclusivamente, com artistas e a canais só por conta de números.
MM – Na SIM São Paulo 2019 você mediou a conversa sobre a importância do Feat como estratégia para alcançar novos mercados. Como foi essa experiência? E além das parcerias, o que você considera que são bons diferenciais estratégicos?
Fabiane Pereira – Essa palestra foi muito fascinante porque nós tínhamos na mesa, pessoas de diversas áreas. E foi muito interessante!
Eu como mediadora e público, particularmente, gostei bastante desse painel.
Mas, eu acredito, e volto a dizer, a principal estratégia para você conquistar altos números, podemos dizer assim: é ter conteúdo de qualidade.
É você saber o que você quer passar, qual a mensagem, você estudar para que àquela mensagem chegue da melhor maneira.Uma coisa que eu sinto muita falta é o artista entender a importância do Jornalista no ecossistema.
Vou te dar um exemplo: muitas vezes eu faço entrevistas maravilhosas e que eu não tenho o compartilhamento do próprio artista. Então, eu acho que, pensando estrategicamente; é estreitar relação do Jornalista com o Artista.
Fazer com que os artistas saibam que, sem a Imprensa, eles também não vão conseguir visibilidade. Principalmente, se eles tiverem nesse nicho, que não é o mainstream.
Eu acho primordial que o artista entenda isso. Nós vemos alguns artistas que estão no início de carreira, querendo participar do cenário, do meu programa e etc.
E aí, quando eles ganham uma certa visibilidade, há muita dificuldade de conseguir com que eles voltem e façam entrevista. Não vou citar nomes, mas, isso acontece com alguns artistas. Ainda bem que é uma porcentagem muito pequena.
Porém, esses artistas que ganham o mainstream, eles também já tiveram no começo.E uma vez que eles estão no mainstream, eles têm um amplificador, que é a voz para um público maior.
E essa amplificação eu acho fundamental para o ecossistema da música. Eu acredito que seria importante eles entenderem essa importância.
É aquilo: ninguém solta a mão de ninguém, vamos colocar isso na prática?!
Não é porque você ganhou mais seguidores, que sua música conseguiu “furar a bolha” que você não precisa mais de pessoas que foram fundamentais para você chegar onde chegou.
E quando uma artista de mainstream dá uma entrevista pra mim, por exemplo, quando Nando Reis topa dar uma entrevista pra mim, têm uma série de outros artistas que veem essa entrevista e falam: “ôpa, vou dar entrevista também”.
Já aconteceu comigo depois do Nando Reis: o Lenine, o Lulu Santos, nomes que entendem a importância de se amplificar a comunicação.
Eu acredito que precisamos “comer muita grama” nesse sentido pra chegar de fato a ser um artista nacionalmente conhecido. Pra mim, um grande diferencial estratégico é o artista reverberar àquela entrevista que ele deu.
Isso faz com que o artista, o que ele quer falar, a voz dele; seja amplificada, porque ele tá reverberando na rede dele uma entrevista. Isso faz com que o veículo seja fortalecido, porque está tendo mais cliques, views, e logo, mais anúncios.
E isso faz com que o ecossistema da música acabe girando. A gente está vivendo um momento que, de fato, ninguém solta a mão de ninguém, precisa ser colocado na prática.
MM – Em 2019, tivemos um “boom” dos Podcasts e o Papo de Música iniciou em 2020 nesse universo. A partir de qual momento você percebeu a necessidade de investir no projeto nesse formato? Como funcionará a manutenção de conteúdos na plataforma? É uma parceria exclusiva com a Deezer?
Fabiane Pereira – Eu nunca consegui ter um podcast do Faro por problemas burocráticos. Eu nunca consegui ter um podcast do Faro por problemas burocráticos.
A marca Faro, que é o programa que eu apresento de rádio, não é minha. Então, todo o investimento relacionado ao Faro, não vem de mim, há uma pessoa responsável por isso.
Logo, eu nunca consegui – e é uma grande frustração minha – ter um podcast do Faro. Que é um programa que já entrevistou, por exemplo, Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante quando eles estavam começando com o Los Hermanos.
Quando eu comecei a fazer o Papo de Música, eu falei “ôpa, vou querer fazer podcast!”. Só que, mais uma vez, quando a gente começou o canal, Vitor e eu, o investimento era 100% nosso.
E qualquer investimento audiovisual, pra quem não tem nada, é muito caro! Ainda mais quando a gente faz uma edição em três câmeras.
Nós resolvemos não termos podcast durante um ano, apesar de termos todo esse material, esse conteúdo todo gravado; decidimos não lançar o podcast porque a gente não tinha mão de obra, não tínhamos como pagar pra uma pessoa fazer.
Porque não é simplesmente levar o áudio do vídeo para o streaming de áudio.A gente tem que fazer uma outra edição e não tínhamos braço pra isso.
Este ano de 2020, nós fomos contemplados pelo Edital do Natura Musical. Então, graças a isso, vamos conseguir colocar o podcast no ar a partir da estreia da parceria com o Natura Musical prevista para o mês de março, mês da celebração das mulheres.
Nós colocamos agora, como experiência, o Podcast no ar. A gente só subiu na Deezer porque estamos paquerando eles (rs.) pra fazer uma parceria exclusiva.
Mas, nós ainda não temos a resposta deles, mas, optamos pela Deezer por uma questão de flerte e identificação com a plataforma de streaming.
Caso esse flerte não seja consolidado – mas, esperamos que sim – provavalmente iremos subir em outras plataformas a partir de março.
Mas, por enquanto, estamos subindo aos poucos no Deezer, clique aqui para ouvir.
MM – Com o projeto “Papo Pelo Brasil” ao contemplar as 5 regiões do país, você acredita que trará um novo significado sobre o que é, na prática, “música popular brasileira” tanto para brasileiros, quanto para o “Brazil que não conhece o Brasil” artístico?
Fabiane Pereira – Eu acho que é muita pretensão que eu vou conseguir isso. Porque o “Brazil que não conhece o Brasil” é um problema tão secular para achar que o projeto meu, digital, vai resolver essa questão ou de certa maneira fazer alguma “cosquinha” ne