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“Estou orando para o Brasil como se fosse uma pessoa doente”, diz Baby do Brasil em entrevista onde fala de política, sexo e religião


Baby do Brasil estreia turnê “Música Extravagante” no Rio de Janeiro. Divulgação: Salvador Cordaro

Em uma noite de primavera, digna de um dia quente do verão carioca, Baby do Brasil, no auge dos seus 66 anos sobe ao palco do Circo Voador pouco depois da meia noite para um show de MPB/rock com uma vitalidade invejável. Na estreia do show “Música Extravagante”, a menina dança, grita, protesta, e é claro, canta! Surpreende o público com o coral Vozes do Rio com uma interpretação animada de “Stand By Me”, faz improvisações com os convidados, canta por mais de duas horas e meia e troca de roupa três vezes. Ufa! Já se passa das 2h30 quando o show acaba e Baby ainda tem energia para receber amigos no camarim e conversar por 30 minutos com o POPline. Com o mesmo figurino que acabara de usar, despida de quaisquer tipos de vaidades e totalmente inteira, Baby nos atende às 3h30 e ao final da entrevista ainda pergunta se conhecemos um lugarzinho para dançar. In-can-sá-vel! Essa é a impressão que saímos sobre Baby não apenas como artista, mas também como “popstora”, que cita Deus em várias respostas e não tem medo de expor suas opiniões sobre política, sexo e religião.

POPline – Neste show você mistura Vivaldi com Jimi Hendrix, passa por Cauby Peixoto e Tina Turner, sem deixar seus sucessos de fora. Uma mistura realmente extravagante. Mas num conceito mais amplo, pra você o que é música extravagante?
Baby do Brasil – Eu pensei muito como eu direcionaria esse novo trabalho e qual seria a tônica. Após a turnê “Baby Sucessos”, pesquisei muitos aspectos da música que se misturasse rock, guitarra, pop. Desde os meus 16 anos eu experimento uma ebulição de notas, acordes, melodias, arranjos, bateria, guitarra. Então, eu venho vivendo há anos cercada de grandes influências tanto brasileiras, como internacionais. Desde Luiz Gonzaga, passando por Jackson do Pandeiro, Lupicínio Rodrigues e por aí vai. Também tem o Jimi Hendrix que, quando eu tinha 17 anos, entrou na minha vida, há também os boleros que meu pai ouvia muito e a parte jazzística veio da minha mãe. Aí eu pensei que nesse novo show levaria para a juventude uma informação preciosa do que é a música. A música é completamente extravagante, ela vai para dentro do nosso coração e abre caminhos diversos. Tanto que músicas de “tensão” não podem ser mais tocadas no Central Park porque as plantas morrem. Por isso, eu quis trazer essa extravagância para mostrar como a música é muito mais importante do que preferir um caminho comercial e fazer canções que não significam nada, o que pode matar a inspiração de toda uma geração, que já não está tão inspirada. Busco a extravagância através da beleza das melodias, harmonias e solos para fluir a extravagância musical em cada um.

Conta pra gente um pouco sobre o novo disco que você está preparando. No show você está apresentando as inéditas “Você é Lindo”, “Aquela Porrada” e “Eu vou dizer que sim (Por causa do perdão)”. Qual a sua inspiração para compor essas músicas? Tem previsão de lançamento?
Todo mundo pergunta para quem foi dedicado “Você é Lindo”, mas jamais contarei (risos). “Você é lindo” é uma música que toda mulher precisava ter para dizer ao seu amado. A maioria das músicas são dos homens para a gente. Foi um momento em que lembrei que ganhamos a pílula, ganhamos um espaço na sociedade e depois isso se tornou uma competição entre as mulheres sobre quem era a mais gostosa, quem era a melhor, quem pegava mais e isso foi ganhando outros contornos que todo mundo que namora é obrigado a transar. E esse não é um selo para que uma relação seja maravilhosa. Quando eu me converti, ouvi muito a ideia de transferência de espírito, que quando há o orgasmo, o que se tem na mente de um vai para o outro e vice-versa. Então, eu refleti – aqui bagunça espiritual não vai rolar. Aí eu fiz essa música para dizer que mesmo não transando, isso não significava que eu não sentisse a pessoa com quem estava, que o achasse lindo. “Eu vou dizer que sim (Por causa do perdão)” e “Você é lindo” já estão gravadas. Vamos gravar nesta semana “Aquela Porrada” e o CD também tem a participação de Pepeu Gomes. Estamos tentando lançá-lo no final do ano, mas não posso falar muito porque muitas coisas ainda precisamos fechar.

Você falou de uma geração que não anda muito inspirada, mas ainda assim a música brasileira é capaz de revelar talentos ano após ano. Tem alguém desta nova geração que você admira?
É meio difícil dizer quem é novo e quem não é, mas eu gosto muito de Maria Gadú, gosto da suavidade de Céu, de Tulipa Ruiz, de Pitty… e algumas dessas participações podem pintar no disco novo.

“Eu detestava roxo, não conseguia usá-lo em nenhum lugar”, revela Baby do Brasil sobre a cor que é predominante no seu visual

Falando ainda em extravagância, mas do ponto de vista visual, o roxo é uma cor muito presente no seu figurino. Tem alguma razão por trás desta escolha?
Eu detestava o roxo, não podia colocar roxo de jeito nenhum que me sentia mal, assim como uma vez também aconteceu com o preto. Aí depois eu curti muito o preto para ocasiões chiques. Quando as minhas filhas Sara, Nana e Zabelê formaram o SNZ e pintaram o cabelo de várias cores, eu estava com o cabelo rosa e azul, aí pensei em trocar, mas não sabia por qual cor. Aí comecei a orar perguntando: “Deus, que cor?!”. Veio na minha mente o violeta, aí pensei nossa: ‘Agora posso usar o violeta, estou me sentindo superbem e não tirei mais’. Pode ser que no próximo show de São Paulo, em novembro, eu venha com mechas rosa choque e azul bebê, mas eu tenho que entender como cuidar do cabelo para que fique bonito. O violeta entrou na minha vida de uma maneira muito espiritual. Casualmente, nas escrituras, o violeta é a cor do sacerdote. Só ele poderia usar o violeta e ter um peitoral cheio de pedra. E eu então amo usar colares (risos)…

E para 2019 teremos um documentário sobre sua vida, certo? Uma parte desse material é exibido no novo show, mas o que você pode nos contar a respeito dele?
O Rafael Saar, documentarista, era meu fã, e aí descobri que ele tinha feito o de Ney Matogrosso e ficou muito bom esse projeto. Ele tem imagens desde os meus 16 anos, pegou mais de 200 horas de material. Ele achou até um filme italiano que eu fiz, não lembrava e nunca tinha visto. Estou ansiosíssima para ver!

Você declarou seu voto em Marina Silva e que cantou a força que tem a mulher brasileira (citação de “Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira”), como enxerga o movimento de mulheres nesta campanha contra um candidato que por diversas vezes diminuiu a figura feminina, que bradou contra grupos tidos como “minoria”…

Eu estava o tempo todo vendo esse cenário e analisando que Marina sempre está querendo chegar e as pessoas dizendo que ela só aparece de 4 em 4 anos, ao invés de agradecer que ela saiu do governo ao perceber que rolava uma coisa estranha. Ela seria a candidata à presidência e aí entrou a chefe da Casa Civil. Eu super conheço Marina, sei que ela é preocupada com alimentação, pois teve um problema com alimentos transgênicos. Aí fiquei imaginando que devemos dar atenção porque quando se candidata uma pessoa mais humilde, muita gente tem medo. A gente precisa de educação, de moradia, de segurança, de cultura, de saúde e precisamos de alguém que não vai jogar isso no bolo da negociação. Porém, nós entramos em uma situação incrível com duas partes radicais. Lidar com a volta de um ditador, que pode fechar o congresso, acabar com o Ministério da Cultura, isso não dá. A gente viu a maneira como ele trata mulheres, como fala, como trata os gays, falar que vai dar uma surra… Não dá. Eu estou orando de verdade para o Brasil como se ele fosse uma pessoa doente e precisasse ser salvo.

Baby do Brasil fala sobre a política no Brasil: “Estou orando para o Brasil como se fosse alguém doente”. Foto: Divulgação

Quando a gente pensa na imagem de Baby do Brasil, temos a impressão que o tempo não foi ingrato com você. Na sua rotina, como você se mantém tão jovem?
O segredo da minha jovialidade não tem a ver com religião e sim com revelação. Desde o momento que me liguei ao Pai, me conectei, eu comecei a receber uma chuveirada de coisas que não são visíveis, que é a unção. Então, hoje, na hora que eu acordei, fiquei uma hora batendo papo com Deus na minha cama, pedindo para abençoar todos à minha volta. Eu faço isso todos os dias antes de acordar e antes de dormir. Saí do mercado [artístico] durante 14 anos, ninguém nunca mais me viu e fui estudar o Evangelho, só voltei porque Ele mandou. Deus disse: “Você vai voltar pra lá porque tem uma obra sua lá. Se eu estou aqui, é porque Ele permitiu.

É verdade que você lançará um livro? Conte-nos mais sobre esse projeto.
O nome será “Não vai ter bunda mole no céu, só casca grossa” (risos). Vou juntar vários testemunhos que aconteceram comigo ao longo do tempo em que me converti e todo mundo vai entender o que aconteceu comigo para eu entrar nessa. Aí vão entender que não teve religiosidade, não teve caretice, foi “punk do bem”. Os provérbios 24-10 falam: ‘Se fores frouxo, na hora da angústia a sua força será pequena’. Ele já tinha que estar pronto, mas como sou uma criança hiperativa, ainda não saiu, mas em breve sairá.

Qual conselho que a Baby de hoje daria à Baby do início da carreira?
Eu diria: ‘Olha bem que você programou o futuro lá no presente do passado. Agora deu tudo certo, que bom que você programou com antecedência, agora continue programando, até o dia que você sair do planeta’. Eu não abri mão da minha criança pura e sadia. Amadureci, virei uma adulta, mas não abro mão dessa criança que eu nasci, porque se eu perder isso, perco o céu.

Colaboraram para essa reportagem: Daiv Santos e Helena Marques