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Vitor Kley lança “A Bolha” e conta os detalhes faixa-a-faixa do álbum “divisor de águas” na carreira

Álbum que saiu nesta quinta (18) explora mais influências, traz mais detalhes de produção e participação de Vitão e Jão.

Foto: Rodolfo Magalhães/Divulgação

Começo esta entrevista na primeira pessoa do singular porque eu sou fã de muita gente, mas no âmbito Brasil, não sei porque, me sentia sempre muito distante de algum artista (mesmo com meu trabalho) até entrar Vitor Kley na minha vida. Quem acompanha o trabalho dele e ouviu a entrevista que fiz com ele na época do “Adrenalizou” sabe muito bem o porquê e um dia antes do lançamento do novo álbum “A Bolha” pude conversar com ele novamente pelo telefone sobre o projeto que ele mesmo considera um “divisor de águas” na carreira.

Vitor explodiu com a música “O Sol”, presente em um disco que foi compilado com faixas mais antigas lançadas em um EP e explorava bastante o apoio do artista no violão. Em “A Bolha”, Vitor reúne composições de quatro anos, se arrisca na produção e traz de samba-rock a rap sem esquecer sua raiz. Com uma simpatia ímpar, como sempre me tratou, ele já atende ao telefone brincando. Venha comigo na jornada de “A Bolha”:

Vitor Kley lança nesta quinta-feira (18) o seu novo álbum “A Bolha”. Foto: Rodolfo Magalhães/Divulgação

Amandaaaaaa (fala meu nome cantando), um beijo pra ti! Já vou começar assim!

Vitor Kleeeey, não sou tão afinada como você, mas um beijo para você também (risos)! Chegou o dia, Vitor!

Chegou o dia! O dia começou com solzão, céu azul, eu estou feliz da vida e muito ansioso.

Eu estou ouvindo “A Bolha” tem uma semana!

Noossa, e aí, tu gostou? Tu que acompanha, gostou?

Justamente por ouvir tanto eu pude perceber muitas nuances, detalhes de produção e novidades que eu queria falar com você música a música. Topa?

Claro, vamo lá! Tamo aí para lhe servir (risos)!

Não sei se você vai concordar com a minha percepção porque os filhos são seus, o “Adrenalizou” é um disco que te representa bem, mas foi um disco que você juntou pedaços, né? “A Bolha” não. As músicas do “A Bolha” se conversam, nas letras você explora assuntos que foram abordados no “Adrenalizou”, mas você vai mais a fundo e principalmente a produção!

MEU DEUS! Essa produção aí você pode colocar assinar Rick Bonadio porque ele mandou muito na produção, fiquei muito feliz e os arranjos também tem um quê de Vitor porque ele deixou eu ser eu, conseguiu extrair o melhor das minhas ideias. É um dos discos mais ricos que eu produzi. Eu consegui botar os metais que eu amo, as cordas que eu amo, as guitarras da minha veia do rock, o meu urbano do hip-hop. É realmente uma história linda sendo contada pela “A Bolha”.

Eu achei legal porque quem vê o Vitor até então como o “homem do violão”, vai ter muito mais a somar à interpretação da sua pessoa e da sua música.

É.. eu acho que vai ser um álbum, musicalmente falando, um grande divisor de águas porque algumas pessoas, acredito que quando a gente acerta um hit, tem uma visão certa de que é só aquilo ali que o cara é. E “A Bolha”, na minha opinião, não sei se você concorda, vai ser o álbum que as pessoas vão dizer ‘velho, o cara foi além musicalmente, tem umas harmonias bem loucas, letras mais profundas, arranjos bem ricos’. Acho que vai surpreender bastante.

“Acho que vai ser um álbum, musicalmente falando, um grande divisor de águas”

Vamos fazer um faixa a faixa?

Claro! ‘Vamo’ lá… Eu gosto pra caramba de falar sobre isso, por mim, velho, ‘vamo’ falar! Falar de cada filho.

“Ainda Bem Que Chegou” abre já com um violão e você identifica você, mas em seguida vem a surpresa do metal.

Exatamente, ‘tô chegando’. E os metais já vem somando e botando a galera pra dançar. Eu acho lindo esse arranjo de metal porque tem uma coisa Ben Jor, Tim Maia. Ficou bem lindo!

E aqui já mostra a pluralidade do Vitor Kley.

É.. exatamente! Eu acho que a gente tem uma missão. Eu, pelo menos, não gosto de repetir já o que foi feito, né? Às vezes as pessoas tem aquele lance de outro “O Sol”, outra “Morena”, “Adrenalizou”, “Pupila” e eu acho que não. O meu campo de musicalidade é muito maior. Toco piano com minha mãe, toco guitarra, faço meus beats no meu home estúdio, arranho na bateria e no bass então eu acho que a gente tem que ousar, mostrar o que a gente sabe fazer. Fica muito nítido isso na primeira faixa. Tem metais, conversões durante a música, tem um pouco de cordas no fundo. É uma boa música pra começar, como você falou: ela te dá o Vitor, mas te dá algo a mais.

E ela dá o tom do que vem em seguida porque “Jacarandá” já tem uma bateria eletrônica e eu escuto e me remete a um pouco de R&B também.

Iiiiiiisso! Exatamente, perfeito! E o Vitão dá um pouco dessa cara porque ele tem um pouco desse R&B na veia. Tem um pouco do drive, tem umas melodias incríveis. É um moleque super talentoso, que toca muito bem, canta muito bem. Acho que a gente se conecta muito musicalmente. É um popzão, como tu falou, que tem a bateria eletrônica, um groove, um swing pra você dançar na pista, né? Gosto muito desta música até por causa do Vitão ali quanto ele canta e que tem uma parte… (canta a melodia) marcando. Dá um ar musical quase pisando no funk soul americano e eu acho especial para a segunda faixa.

E aí vem “Menina Linda” e eu vou tirar uma onda com você. Você fez “A Tal Canção Pra Lua” em resposta para “O Sol” e essa é uma resposta pra “Morena”?

Até que enfim alguém notoooou! (risos) Taí a música para as loiras! Eu pensei ‘vou botar uma frase aqui, uma brincadeira, não tem como chamar uma música de loira e botei uma homenagem para as loiras’.

A letra ainda tem um quê de “Eduardo e Mônica” por essa dualidade das personalidades.

É… é uma história contada de um moleque do surf, a menina era formada na faculdade de aviação, que já pilotou avião, que hoje é professora de ioga.. A música faz essas brincadeiras com rimas. E acho que nesta música, o que mais me chama atenção, às vezes eu fico observando as músicas como se não fossem minhas (risos)… eu fiz uma rima de suco de laranja com acerola. Essa é uma rima que nunca imaginava que eu ia fazer, mas eu confesso que amo essa parte. Essa música tem uma levada que eu gosto muito, começa com violão bem Vitor e depois ela vem com bateria, bass na cara, uma vibe pra dançar e um refrão que gruda na cabeça.

Em “Anjo ou Mulher” você botou tudo o que quis aqui, né? Tem metal, piano, cuíca, cavaquinho…

(risos) Tem até umas cordas no fundo, eu e o Rick gostamos muito de cordas então quase todas a gente colocou um pouquinho. Quando a fizemos a gente até ficou ‘imagina Seu Jorge cantando isso, Zeca Pagodinho… porque ela tem um samba-rock de Ben Jor e foi uma das últimas músicas que eu escrevi pro álbum. Eu estava de Porto Alegre na casa do Guto, que é meu amigo, e a gente precisava de mais uma música levada e comecei a cantar o la-lá-rá-lá. E eu pensei ‘nossa, isso aqui com metais será lindo’, mostrei pro Rick e ele teve a mesma sintonia com os metais. Quando a gente colocou a gente pensei ‘é isso, é um samba-rock, botamos cuíca, cavaquinho’, ficou um negócio muito louco. Acho que ela mistura uma riqueza de produção, uma história engraçada, legal e um refrão chiclete, brinquei ali ‘a menina da novela que apareceu na minha casa’, que no caso é a Carol [Loureiro, namorada]. É uma brincadeira que eu acho que a galera vai curtir.

“O Amor é o Segredo” vem em sequência, todo mundo conhece a história e acho por mais que tenha sido por acaso dela sair primeiro, porque acredito que “Jacarandá” era o single que vocês estavam preparando inicialmente, né? A situação atual levou ao lançamento.

Exatamente. Eu não via sentido em lançar uma música alegre no meio a tanto caos que a gente tava vivendo, o lance da pandemia. A gente até pensou em segurar o álbum… todo o planejamento feito, a capa pronta, o lance de turnê, a primeira loja de produtos oficiais. Tava tudo certo e veio esse boom, cortou um pouco as nossas asas. A gente ficou chateado e falamos ‘vamos esperar’. Só que mais pra frente a gente viu que a situação ia mais longe, enfim, ”O Amor é o Segredo” conseguiu retratar esse momento, dar um pouco de esperança pras pessoas e não é por acaso que ela está neste álbum. Talvez a música já soubesse que o mundo viveria essa situação e ela disse ‘ei, tô aqui posso ser a primeira a mandar mensagem boa para as pessoas’”. O clipe retrata bem também o que a gente tá vivendo ainda.

Legal também “Ponto de Paz” estar em seguida porque a música também passa essa mensagem de tranquilidade, da gente poder ter empatia, né?

Exatamente. É uma música que já pisa um pouco do R&B, hip-hop, um pouco de Free Nationals, Anderson.Paak que é uma coisa que eu escuto bastante, e ela tem um beat slow, pra trás, mas tem uma letra que eu acho linda. Tem várias frases que eu tatuaria, que a gente fala pra nossa equipe, pra nossa família. Tem a frase chave que é “quando uma estourar, as outras vão estourar também” que é algo que sempre me falavam no início, meus professores de canto, quando a gente tava tentando a carreira. Acho até tipo, quando eu gravei a música eu criei uma personagem fictícia. Eu falo ali “desde 2010 a maior fã do meu som”, mas depois de um tempo eu descobri que na verdade eu devia ter cantado “o maior fã do meu som” porque esta música retrata muito eu e meu irmão então a partir de agora eu vou cantar “o maior fã do meu som” mesmo que tenha sido gravada “a maior fã do meu som” porque vai ser uma homenagem pro meu irmão.

Ah, achei bonito. Porque você já tem uma música pro seu pai, pra mãe e agora pro Bruno.

Isso, eu sou família, a base da minha família (risos). Eu acho legal dizer que o início da música eu fiz por causa Paulinha, a esposa do Rick, porque a Eva, a filha dele que nasceu em meio ao álbum, tava vindo ao mundo e havia uma mudança de humor muito grande dela. E ela começou a me contar as coisas enquanto estávamos lá gravando e eu comecei a perceber que realmente era o Rick era o ponto de paz, de calmaria. E surgiu a ideia inicial da música.

“A Bolha”: é coincidência ou as faixas-títulos dos seus álbuns são as mais enérgicas?

É uma coincidência, é verdade! Porque a gente não pensou nisso. Tu vê que a ”A Bolha” é a “Adrenalizou” versão rock.

Sim, exatamente por isso te perguntei (risos)!

É louco porque sempre toquei ela sempre nesse andamento de pulo mesmo, tu vê que ela pulsa, como se fosse o público pulando “me deixe só” (canta). Eu imagino o público cantando isso no show! Ela é a faixa-título mesmo porque ela fala da minha bolha que vivi anos atrás, quando as coisas não estavam dando muito certo na carreira. Ficava no cantinho, produzindo no aplicativo e minha mãe e meu irmão falavam muito “o Vitor vive numa bolha, não sai do quarto” e ficou marcado. Escrevi essa música porque (dá uma pausa), eu queria ficar ali, não queria ser tipo como os outros e eu falava “não, eu gosto disso aqui, me deixa na minha bolha”. Ela é o melhor título pro disco, ela é o que eu sou!

“O Tempo” vem seguida. Acho que todo mundo precisa entender a letra dessa música.

Eu gosto desse trocadilho “todo mundo quer saber do tempo, mas é o tempo que sabe de tudo. É vendável, furacão de pensamento. Dê tempo ao tempo”. Às vezes a gente quer correr na frente do tempo e na verdade não, as coisas acontecem no tempo que universo decidi. Então a gente tem que entender isso pra gente caminhar com mais leveza.  Ela tem um quê de “Farol”. É a “Farol” mais pra frente e o arranjo de cordas ficou lindo. Tem algo épico, meio “Iris”, do Goo Goo Dolls.

E quem faz os backings de “Sua Falta”?

Sou eu mesmo! Só que as ideias de backing, de coro, foram todas do Rick.

E é mais um adendo na sua discografia porque eu não lembro de ter uma harmonia tão clara sua.

É muito louco. Essa fica bem claro. Você já ouviu aquela “Kiss From a Rose”, do Seal? (canta trecho de abertura da música) Toda em voz. E no meio tem vozes que entram e saem então a gente pegou um pouco de referência disso também.

Vem “Retina”, e você está muito rap. Tem um scratch na música, Vitor Kley!

(risos) Ela é meio que declamada, né? É uma atitude! E eu gosto muito desta música. Esses tempos era a favorita [do disco], hoje é “Vai Na Fé” também, e ela é muito massa porque me lembra aquele Red Hot Chili Peppers californiano (canta “Give it Away”), sabe? Eu gosto muito de escutar isso! “Retina” é a música mais antiga, a fiz no final de 2015 ali, que eu estava em casa, surfando, tem bem as gírias da galera da área, do surf. E quem me ajudou a escrever foi Fernando Dutra, de Itajaí, foi ele quem me deu essa frase aí “minha retina já gravou você” que eu acho maravilhosa.

Esta música é a que você falou que produziu na mesma época de “O Sol” e que ficou guardada?

Isso, tenho até hoje a demo dela ali no aplicativo (risos).

“Dúvida”, com Jão. Estava ansiosa pra ouvir esta música. A letra é dos dois?

A letra é minha, mas um amigo me salvou porque eu tava travado uma hora numa palavra ali. O Di, que trabalha comigo, que faz nosso som. Tava em casa travado e só faltava essa palavra e ele me deu uma ajuda e eu chamei o Jão pra participar depois de um tempo. Não foi que nem “Jacarandá” que eu já escrevi e logo pensei no Vitão. A do Jão foi um pouco diferente. Eu a escrevi e a cantava sozinho, mas pensava ‘putz se eu chamar o Jão que tem esse quê de sofrimento, tem uma coisa linda quando ele canta, que emociona, acho que isso vai ficar muito bonito’. E o chamei e ele topou. A música desafia um pouco a mim e ao Jão porque é uma música que muda de harmonia, tem um orquestramento rico de cordas, de harmonia que modulam e acho que é uma música classuda.

E acho que vai surpreender também porque quem começa a música é ele.

Isso! Eu quis deixar bem claro que tivesse uma voz diferente começando as músicas. Como eu começo todas, e pra muita gente é normal que o dono do disco comece, e a gente colocou essa dúvida a mais (risos).

A minha favorita, fecha bem o disco, com cordas, a harmonia do coral “Vai Na Fé”. Estou ansiosa pra vê-la performar ao vivo.

É a mais especial essa. Assim, o início do coral me arrepia toda vez que eu escuto, acho que ela ficou exatamente como eu imaginava. Eu tinha essa ideia antiga de coral reforçando o refrão e começando mesmo a música.

É uma música especial pro momento, que conta muito a minha história e é uma música que resume o batalhador brasileiro, que persiste, que vai. Que tem muita fé mesmo.

Pra encerrar: você acha que, hoje em dia, é realmente estranha a pessoa que traz amor no coração?

Meu, eu vou te falar que é uma raridade. Eu sinto isso! Não sei se é o mundo que eu vivo ou só eu que penso isso. Na maioria das vezes o mundo parece um pouco sombrio e quando eu vejo uma luz, uma pessoa especial, uma pessoa que é sentimento, que é muito verdadeira eu fico com esperança, claro, e aliviado, mas são poucas pessoas. Acho que dá pra contar no dedo. E é por isso que eu fiquei na bolha, né? Acho que as pessoas dão muito mais valor a outras coisas antes de pensar no coração. Eu fico pensando, ‘cara, será que eu que tô errado que fico dando valor para certas coisas que são lindas, né? A verdade, o coração, o sentimento, se importar com o próximo, entender que todo mundo é igual, não precisa passar por cima de ninguém. Será que tô errado ou o que é? Alguém consegue explicar?’. Por isso eu deixo bem enfatizado na música “A Bolha”.

A vida me põe em dúvida, mas já descobri que não vou deixar isso [o pensamento] me levar por causa de outras pessoas.  Vou continuar sendo assim pro resto da minha vida.

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