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Entrevista: Nego do Borel assume seus pecados e busca a redenção com lançamento de DVD ao vivo

Mas eu sei que um dia a gente aprende/Se você quiser alguém em quem confiar/Confie em si mesmo/Quem acredita sempre alcança” – os versos de Renato Russo e Flavio Venturini para a canção “Mais uma Vez” servem de inspiração para um recomeço. Nego do Borel foi um dos personagens mais comentados do meio musical no primeiro semestre por conta de uma acusação de transfobia após uma resposta fora do tom à transexual Luísa Marilac, que havia elogiado uma foto sua no Instagram. A suposta brincadeira [ele garantiu, à época] quase arruinou de vez sua carreira, culminando no adiamento da gravação de seu DVD. Foi o momento de retirar-se de cena para repensar algumas atitudes e, principalmente, amadurecer.

Passados alguns meses, retomou aos poucos a vida artística sem fazer alarde. Gravou seu projeto audiovisual e, de quebra, ganhou uma indicação ao Grammy Latino pelo clipe de “Me Solta” (a premiação acontece no dia 14 de novembro). Estaria a vida lhe sorrindo novamente? Em um bate-papo com o POPline, Nego do Borel se mostra um pouco mais maduro, que escolhe bem as palavras que dirá, mas sem perder o bom humor característico. O artista pede uma segunda chance ao público, mas não deixa de assumir seus pecados e garante ter aprendido com este episódio.

Foto: Washington Possato / Divulgação

POPline – Nesta sexta-feira você dá início a mais um capítulo na carreira com o lançamento de seu DVD. O quão importante está sendo este novo ciclo para o Nego do Borel e, principalmente, para o Leno Maycon [nome de batismo do cantor]?
Nego do Borel – Este é um projeto que sempre sonhei realizar, independente de ter que fazer sucesso ou não. São oito anos de carreira, fazendo shows direto desde que estourei minha primeira música no Rio de Janeiro, tive pessoas bacanas fazendo parte disso, grandes profissionais do mercado musical ao lado como por exemplo o [produtor] Umberto Tavares, uma das referências atualmente. Observando “de fora”, como o Leno Maycon, é como se visse a vitória de um cara humilde, que veio de um lugar humilde. Isso representa muito porque envolve minha família. No fim, acaba sendo uma coisa só para o artista e o homem por trás do artista.

Você teve Wesley Safadão, Ferrugem, Matuê, Felipe Araújo, Naiara Azevedo, Kevin o Chris… Nomes que foram até lá te dar apoio quando você mais precisava. Como foi tê-los com você neste momento tão especial?
Eles estão marcando minha vida nesse momento mais que especial. Tive muito apoio dessa galera e de outras pessoas até mesmo depois de tudo que aconteceu. Falo muito com o Safadão pelo WhatsApp, é um cara que considero parte da minha família. Eu tenho um carinho enorme pelo Ferrugem desde antes dele estourar nacionalmente. Já participei de um DVD dele e agora ele me devolve essa gentileza. Adoro a filhinha dele, é um amorzinho comigo e tenho como uma sobrinha. Sou muito fã do Kevin o Chris. Ele está gravando com o Drake, abrindo portas pra gente lá fora. Fico muito feliz pela conquista dele. E é por isso que hoje penso em estudar, aprender sobre gerenciamento de carreira, ajudar outros talentos, orientá-lo na carreira. É um caminho que estou empenhado em trilhar no futuro.

Capa do novo DVD (Foto: Nove Letras Assessoria de Comunicação / Divulgação)

Você disse ser amigo da Anitta e da Ludmilla e, mesmo que elas não tenham participado do DVD, garante que a amizade com as duas não mudou. Mas temos outra personagem feminina nessa história: a Luísa Sonza retirou a participação dela do seu DVD após toda a confusão. Sendo sincero, como ficou a história com ela?
Sendo bem sincero, independente de tudo que aconteceu, a tenho como uma amiga. Ficou uma situação chata pra ela porque todo aquele episódio feriu diretamente o público que curte o som dela. Hoje eu entendo o fato deles terem ficado tristes comigo porque é uma luta que eles passam para serem aceitos como são. Hoje entendo melhor que não é uma questão simples e serviu como aprendizado para mim e para muitas pessoas. Tenho crianças que me seguem e espero que elas cresçam com pensamento diferente, que sejam respeitosas com todas as pessoas sem distinção. Eu gosto demais da Luisa, a gente se encontra, mantém contato. Mas naquele momento não seria legal colaborarmos juntos e eu entendo o lado dela.

Vem aí o Grammy Latino. O clipe de “Me Solta” está indicado. A Nega da Boreli vai reaparecer pra comemorar uma possível vitória?
Sabe que ainda não pensei nessa possibilidade? Mas veio à cabeça agora que você falou. Já bati na porta, fui indicado a prêmios algumas vezes. Melhores do Ano no Faustão, Prêmio Multishow… Seria massa o meu Mengão ganhar a Libertadores e eu ganhar um Grammy Latino. Eu e meu time do coração sairmos do “cheirinho” [risos].

Perguntei sobre a Nega da Boreli porque é um personagem que você criou. Você pensa em atuar novamente?
Quero muito voltar a atuar e estou procurando um curso bacana de atuação. Acho importante buscar outras frentes, desenvolver um outro talento que tenho. Foi muito boa a minha experiência na “Malhação”. Junto com a minha galera, estamos buscando algumas oportunidades. Tenho muita vontade de fazer uma novela ou um filme. Tem rolando algumas coisas que ainda não posso falar a respeito. Se Deus quiser vai rolar em 2020.

Foto: Washington Possato / Divulgação

E agora você tem tido aulas de inglês. Já pensa em levar sua irreverência para a terra do Tio Sam?
Cara, tô muito empenhado nisso. Se eu passo um dia sem praticar, me sinto como se estivesse sem uma parte do meu corpo. Já fui pra fora algumas vezes. Lembro que quando estive com o Maluma numa premiação que concorremos com a música “Corazon”, eu não entendia nada e isso me deixava agoniado. Prometi que nas próximas oportunidades eu estaria com o inglês um pouco mais afiado.

Você tem noção que é um dos pouquíssimos brasileiros que já marcaram presença na Hot 100 da Billboard, principal parada de singles dos E.U.A?
Sério, cara? Não fazia ideia, de verdade. Sei que é uma marca importante e me sinto extremamente realizado. Tanta gente já me colocou pra baixo, sabe? E às vezes me vejo em situações tão inusitadas. Teve uma vez que estava no Faustão para receber um prêmio. Olhei para o lado e tinha o William Bonner e a Fátima Bernardes. No outro tinha o Francisco Cuoco. Na frente a Juliana Paes. Parecia que eu estava no Borel, na minha casa, e de repente mergulhei dentro da televisão e estava ali do lado de toda essa gente. Foi uma experiência surreal vivenciar tudo isso.

E no meio disso tudo, você diz ter o desejo de colaborar com um rei dos charts americanos: o Justin Bieber. Por que ele?
Eu ouço muita gente diferente, sabe? Sou bem eclético, ouço tanta gente diferente do meu som, saca? Eu fui a um show dele aqui no Brasil. Gosto do som, da história dele, da forma como ele fala de Deus… Teve uma fase da vida dele que ele estava muito doido. Esteve aqui, pichou os muros da cidade… Dava pra ver que ele era um cara jovem, rico, mas perdido naquele momento. E hoje olho pra ele e vejo um cara amadurecido, está mais bonito, mais família. Sempre acreditei que ele mudaria um dia. Sou muito fã, tenho vontade de conhecer, quem sabe gravar um som… [nesse momento ele começa a cantar um trecho do hit “Sorry”].

Foto: Washington Possato / Divulgação

Eu, enquanto negro como você, sei o quanto é difícil chegar a alguns lugares como um profissional bem sucedido. Sempre tem alguns olhares desconfiados e uma ligeira paciência para quaisquer tipos de erros. Temos o caso da jornalista Maju Coutinho, que foi muito criticada assim que assumiu a bancada do Jornal Hoje (TV Globo) por conta de alguns erros de pronúncia. Você acredita que parte desta “pouca paciência” da opinião pública pelos seus erros possa ter sido pelo fato de ser negro?
Eu admito que meu erro foi grave, mas acredito que hoje em dia as pessoas pegam pesado na hora de acusar umas às outras. Somos passíveis de erros. Acredito que muitas pessoas aproveitaram o fato de eu ser negro e foram mais cruéis em seus julgamentos. A gente sente o preconceito no dia a dia. Eu tenho um relacionamento inter-racial. Pelo fato da minha namorada ser branca, me chamam de “palmiteiro”, sabe? Quando a gente alcança um certo status na vida, algumas pessoas tentam tirar proveito disso ou desmerecem o que você conquistou. Tem sido assim nesse tempo. Se eu não tivesse tido a mente no lugar, eu teria caído em depressão após o episódio do início do ano. Poucos estão preocupados em te ajudar a trilhar o caminho correto. Tive que ir pra rua muito cedo pra batalhar na vida. É doído escutar das pessoas que você é preconceituoso, quando na verdade cresci num ambiente onde era proibido demonstrar afeto porque isso era visto como sinal de fraqueza. Eu gravei um clipe dentro de uma comunidade onde eu beijo a boca de um outro cara. As crianças, que assim como eu nasceram numa favela, verão aquilo com mais naturalidade. A maioria das pessoas não tem ideia o que é crescer numa comunidade e ter que ocultar sua orientação sexual para evitar julgamentos severos. As coisas estão mudando, mas é diferente de viver “na pista”. Com o meu clipe quis passar essa ideia que tá tudo bem ser quem você é, “me deixa dançar”, saca? Todo mundo é livre pra amar quem quiser, saca?

Passa pela sua cabeça que você é dos poucos exemplos para tantos jovens negros que sonham com uma vida melhor? Como isto ressoa pra você?
Eu sempre tive um lado “humorista”. Mas depois de tudo que aconteceu, aprendi que preciso filtrar o que falo, a forma como brinco com as pessoas. O respeito tem de haver sempre. Sigo aprendendo mais e mais. E encaro isso com muita responsabilidade. Entendo que as coisas que eu falo, o que publico nas redes sociais ou quando encontro essa galerinha, de alguma forma aquilo vai impactar na vida deles. Quando vou às comunidades, vejo nos olhos das crianças o quanto elas gostam de mim, o quanto é sincero. Isso não tem preço. Fico feliz e não vejo como um peso na minha vida porque estar nessa posição que estou agora foi tudo que pedi a Papai do céu. Se eu puder ser essa pessoa que irá orientar esses jovens a estudarem, honrarem pai e mãe, a trilharem o caminho do bem, minha missão estará completa.

Foto: Washington Possato / Divulgação

Se o Leno Maycon não fosse o artista Nego do Borel, o que seria?
Caramba… Se o Leno Maycon não virasse o Nego do Borel, ele estaria ferrado. Quando eu era moleque, só queria saber de soltar pipa o tempo todo. Ainda bem que a música foi um caminho que deu certo porque eu até sabia jogar bola, mas nem tanto pra seguir uma carreira [risos]. Mas no fim de tudo, acredito que seria um cara trabalhador. Sempre tive uma cabeça boa nesse sentido.

Estamos chegando ao fim do ano, aquele momento que a gente revê todas as nossas atitudes e faz planos para os próximos meses. Durante algum tempo a audiência do POPline ficou chateada com você. Mas hoje, mais maduro, qual balanço você faz disso tudo e o que diria aos nossos leitores?
Eu sou muito, muito, muito fã do POPline e leio diariamente as notícias. Gostaria muito de estar mais próximo, de contar mais novidades sobre minha carreira, de ter mais oportunidades de mostrar quem sou eu de verdade. Eu sou muito grato pelo espaço que vocês estão me dando neste momento. Eu sou um cara do bem e gostaria de ter esta segunda chance de provar isso pra galera que acompanha o site.

O áudio completo do show chega às plataformas digitais nesta sexta-feira (25). Os singles “Ding Dom” e “Rebola na Minha” já ganharam seus respectivos vídeos no ao YouTube. O clipe da nova faixa de trabalho, “Princesa”, parceria com o rapper Matuê, também estreia hoje. E de acordo com o cronograma de lançamento dos clipes do projeto, serão dois vídeos por semana, sempre às terças e quintas-feiras.

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