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Entrevista: Jão estreia turnê “Anti-Herói”, quebra o silêncio e dá a primeira entrevista de sua nova fase com exclusividade ao POPline

“Eu não sou uma pessoa triste. Sou uma pessoa normal. Eu não gosto de gente feliz o tempo inteiro. Acho muito irritante”, diz.

(Foto: Leonardo Torres)

“Tô meio zonzo” – Jão diz ao se sentar com o POPline para a primeira entrevista de sua nova fase. “Estava com o cabelo cheio de suor. Tive que enfiar a cabeça embaixo d’água”. Ele acaba de fazer o primeiro show da “Turnê Anti-Herói”, com seu maior público no Rio de Janeiro até então. Com um álbum recém-lançado e sem nenhuma divulgação, ele encheu a casa de espetáculos Vivo Rio de jovens com todas as músicas na ponta da língua no sábado (26/10). Jão confessa que tinha medo que as pessoas não soubessem cantar as novas. Ficou surpreso. Das 17 faixas da setlist, 10 são do álbum novo, que emplacou todos os títulos no Top 200 do Spotify no dia do lançamento.

O show foi bastante emotivo. “Anti-Herói” é um álbum documental sobre um relacionamento amoroso que não deu certo. Um namoro super recente, com momentos tóxicos. Quando lançou o disco, Jão disse que estava se sentindo “pequeno e esquisito”. Como se fosse possível, veio com músicas ainda mais tristes do que em sua estreia. Não deu outra: cantando sua verdade, se emocionou no palco pelo menos duas vezes e deixou o público cantar algumas partes em seu lugar. “Eu não achava que ia ser tão difícil fazer esse show. Eu estava muito tranquilo, com muita saudade de vocês”, disse aos fãs, “mas olha só, não é mesmo? Já chorei quantas vezes? Me desculpem”. Nos bastidores, classifica a experiência como catártica.

– Parece que eu passei por uma catarse muito grande, sabe assim? Juro. Eu não quero soar doido, “ai, meu Deus, que experiência!”, mas foi uma experiência muito louca, de verdade. Eu tô me sentindo muito bem. Foi um pouquinho… estranho. No primeiro disco, a gente teve um mês de diferença entre o lançamento do disco e o início da turnê. Eu já fiquei muito nervoso, pensando se as pessoas iam cantar ou não. Nesse, teve um intervalo de 15 dias, então eu estava bem nervoso sobre se as pessoas iam saber cantar. E caral**, caral**! Teve uma hora que eu tive que pedir para aumentarem meu fone, porque eu não estava conseguindo me ouvir. Surreal. Muito bom. – diz ao site.

Jão não se considera uma pessoa triste (acredite se quiser), mas seu universo abraça a melancolia. O cantor entra no palco cantando “Triste Pra Sempre”, uma das músicas novas, na qual ele e público gritam em comunhão “tenho medo de ser só isso / minha vida daqui pra frente / por**, eu não quero ser triste pra sempre”. A cortina que tapa o palco antes do show começar é um painel nebuloso e cinzento. Quando ela cai, o público vê um cenário todo formado por lençóis brancos, uma tela de LED com vídeos pré-gravados, três músicos em altares e uma cabeça inflável imensa com uma auréola que muda de cor ao longo da apresentação.

(Foto: Leonardo Torres)

(Foto: Leonardo Torres)

“O Pedro [Tófani, diretor criativo que desenhou o palco] explicaria melhor [o conceito]. A gente tem uma preocupação muito grande em entregar um espetáculo para as pessoas. Eu acho que cada cantor, cada artista, tem seu molde de show, e eu acredito nesse. Quero sempre levar esse palco, na medida do possível, para todo mundo”, diz o paulista, que levará a turnê para Ribeirão Preto, Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre, Natal, Maceió, Maringá, Curitiba, João Pessoa, Recife, Caruaru, Campo Grande, Paulínia, Brasília e Goiânia só neste ano. Ele tem shows marcados até abril. “Gosto de criar uma experiência. O que mais ouço das pessoas é que, no show, elas se sentem um pouco fora da realidade, então é meio que isso: criar um universo em que saiam da realidade delas, mesmo que seja para entrar nelas mesmas, sabe? Escolha sua realidade: se quer lembrar ou quer esquecer, se quer sofrer ou se divertir. Dar essa abertura para as pessoas”.

SETLIST

01) Triste Pra Sempre
02) Essa Eu Fiz Pro Nosso Amor
03) Lindo Demais
04) Me Beija Com Raiva
05) A Última Noite
06) Você Vai Me Destruir
07) Ainda Te Amo
08) Louquinho
09) Barcelona
10) A Rua
11) Hotel San Diego
12) Enquanto Me Beija
13) 🙁 (Nota de Voz 8)
14) Imaturo
15) Fim de Festa
16) Vou Morrer Sozinho
17) VSF

(Foto: Leonardo Torres)

POPLINE – Teve uma música que você disse que quase não inseriu na turnê, que não queria cantar… Qual que era?
JÃO – Essa é a “nota de voz”. É a última do álbum. Na verdade, não é que eu “não queria cantar”. É que eu não imaginava. Ela realmente foi uma nota de voz no celular. A gente nem produziu ela em estúdio nem nada. Eu não imaginava como ela seria traduzida no show, sabe? Se as pessoas iriam cantar… porque é uma coisa muito pontual. Mas saiu. Saiu! Dei uma titubeada, mas saiu.

Essa foi a mais difícil para você cantar?
Acho que a mais difícil foi “Enquanto Me Beija”. Na “nota de voz”, eu estava no meu cantinho [ao teclado] e parecia que eu estava mais no meu quarto. Em “Enquanto Me Beija”, a galera estava ali, mesmo.

Fazer esse álbum foi catártico também? Ou você se afundou mais na fossa?
Então… Eu acho que agora com os shows que eu vou sentir um pouco o que ele vai traduzir para mim. Mas fazer o álbum foi bem… foi… Além de toda a temática do álbum, teve um pouco de: eu não gosto de estar no estúdio. Eu não gosto daquele momento ali. Você tem que ouvir tudo e eu fico pegando cada coisa milimétrica, tirando e colocando, então é muito exaustivo pra mim. A gente ficava 20 horas direto no estúdio. Para finalizar o disco, a gente ficou um dia e meio, e saiu de lá 10h da manhã. Eu gosto de escrever as músicas, “ai que legal essa música”, mas na hora de produzir e mixar não é um processo que eu gosto. E eu fico lá o tempo inteiro fazendo tudo. Eu gosto de estar no palco, viajar, ver as pessoas e cantar.

Você acabou de lançar o álbum. Mas quando você terminou de fazê-lo? Finalizou em cima do lançamento?
Nossa! Não lembro. Quando foi? [pergunta ao empresário] Foi menos que o prazo permitido pela Universal (risos).

Então o disco tá fresco para você também.
Tá muito fresco! Muito, muito fresco.

Você ainda está triste?
Cara… (suspira) Eu não sou uma pessoa triste. Eu acho que eu aceito a tristeza.

Jão, a gente ouve seu álbum e quer te salvar.
Mas, sabe, eu não sou uma pessoa triste. Sou uma pessoa normal. As pessoas zoam com isso, mas eu aceito que a tristeza é um sentimento como qualquer outro. Acho que as pessoas demonizam muito a tristeza, e eu acho que ela é parte de um processo. É importante você se sentir triste para se sentir feliz. Eu não gosto de gente feliz o tempo inteiro. Acho muito irritante. Tem que ter um balanço.

Quando você anunciou o álbum, disse que não queria romantizar a tristeza e sim normalizá-la. É isso?
Exato. É exatamente isso. Essa frase traduz tudo.

(Foto: Leonardo Torres)

Você trabalhou com novos produtores neste segundo álbum. Como que isso afetou seu trabalho?
Eu fiz a maioria do álbum com a Headmedia ainda. Mas eu fiz duas músicas com o Paul Ralphes, “VSF” e “Enquanto Me Beija”. Eu acho importante para o artista conhecer outros produtores e sair um pouco da bolha em que ele geralmente trabalha. Acho que, no Brasil, isso acontece bastante: os artistas sempre têm uma produção com quem trabalham recorrentemente, e eu acho importante a gente respirar outras coisas e entender como outras pessoas trabalham. Acho que enriquece. Assim como o produtor trabalha com vários artistas, acho importante o artista trabalhar com vários produtores.

Você falou de “Enquanto Me Beija”. Você que escolheu ela para ser single?
Fui eu que escolhi.

Mas se você achou doloroso cantá-la… Não é meio sádico?
Mas aí entre as dez que eu tinha para escolher, todas seriam (risos). Não tinha o que fazer!

Quais outras músicas você gostaria de lançar como single e fazer clipe?
Eu gostaria muito de fazer “Essa Eu Fiz Pro Nosso Amor” como single. Eu acho que eu sempre me propus a fazer uma música pop redondinha, sabe? Eu acho que ela é uma das que eu mais gosto – de letra, de sentimento. Ela tem cor para mim quando eu a canto, sabe? E ela tem uma vibe legal. Eu gostaria de fazer… (pensa em outra) Eu não sei, na verdade. Eu vejo esse álbum muito como um álbum. Não vejo muito como um projeto de singles. Eu vejo muito um álbum.

Para ser ouvido inteiro, né?
É, exato. Eu não tive muito essa mentalidade [de singles] para fazer. Mas eu acho que “Essa Eu Fiz Pro Nosso Amor” é uma.

Você falou que tinha a ideia de fazer outro álbum, mais colorido e divertido. “Louquinho” inclinava para isso. Chegou a fazer outras músicas assim? Tem guardadas?
Eu tenho algumas músicas guardadas, que não são boas, que eu não gosto e que não são verdadeiras para mim.

Então a gente não vai ouvir?
(faz uma cara feia) Não. (risos) Eu tinha algumas músicas em que estava meio que forçando… Não me forçando a fazer, mas tentando fazer e elas não eram compatíveis com o que eu estava querendo dizer. Acho que nunca é bom lançar algo que não seja verdadeiro. Acho que as pessoas entendem muito quando não é verdadeiro, e entendem muito também quando é. Não pretendo lançá-las.

A gente pode ver o “Anti-Herói” como seu “21”…
Ah, é?

É, um álbum inteiro dedicado a uma pessoa.
Se eu falar isso, as pessoas vão cair matando (risos).

Mas você teve feedback dessa pessoa?
Só entreguei. Deixei o álbum falar por si. Foi uma campanha de álbum bem “não campanha de álbum”. Quando cheguei para a gravadora, deixei muito claro que queria fazer um álbum documental e queria meio que deixar o álbum falar por si. Eu não via muito sentido em ficar promovendo (se interrompe). Ainda é meu trabalho, minha carreira, e é óbvio que vou promover meu álbum. Tenho muito orgulho dele. Mas é um projeto: acho que, até a turnê, tentei deixar que o álbum falasse por si. Acho que as pessoas entenderam isso.

E as pessoas a seu redor – seus amigos – como reagiram? A gente que não te conhece, que não é próximo, ouve e quer te salvar!
Como você não me conhece?!

Eu não tenho seu Whatsapp! (risos)
(risos)

Eu fui ver e, na minha primeira entrevista com você, eu perguntei se você fazia terapia. Estava preocupado desde 2017!
Putz! Já estava… (risos) Cara, meus amigos são muito tranquilos. Eu mostro tudo para meus amigos e para minha família. A gente criou uma tradição de fazer uma audição para os amigos sempre que algo fica pronto. A gente fez com esse álbum também. É muito louco. Eu fico imaginando se um amigo meu lançasse um álbum. Porque eles participam da minha vida de uma forma e minha arte é outra parada, sabe? É uma outra expressão, uma outra linguagem. Deve ser doido. Eu fico pensando: se o Renan [empresário] lançasse um álbum… sabe? As coisas que fala, como ele fala… Mas eu acho que todos eles entendem as coisas que quero dizer. Eu sempre mostro as coisas para minha mãe. “Mãe, você acha que está muito real? Muito cru? Você acha que isso pode?”. Eu penso muito nisso: qual o limite de um artista para escrever alguma coisa? Se ele deve realmente falar tudo que pensa, porque é uma liberdade artística, ou se ele deve ter… Minha mãe sempre fala “as pessoas precisam da sua música. As pessoas que acompanham seu trabalho acompanham porque querem se identificar e colocar aquilo na vida delas, então faz sentido que você fale essas coisas”. Desculpa, eu falo muito.

Imagina, eu gosto disso! O álbum é todo baseado em fatos reais?
Sim.

Então essa orgia de “Hotel San Diego” aconteceu?
(risos) Pô! Eu vou falar com a minha mãe agora! Ela me ligou e falou “nós vamos ter uma conversa sobre isso”. Depois que eu conversar com ela pessoalmente, aí a gente se fala sobre isso.

E, para terminar, qual das suas músicas você indica para quem ainda não conhece seu trabalho?
Eu indico “A Última Noite”, porque eu tenho orgulho pra caralho da composição dela, da sonoridade dela, de tudo. Então escutem “A Última Noite”.

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