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Coluna do Leonardo Torres: o que vai ser do pop brasileiro na ausência de Anitta?


(Foto: Divulgação)

Você deve ter ouvido por aí que Anitta planeja sair do Brasil em 2020. Ela não confirma a informação, por enquanto, mas admite que pretende puxar o freio e focar mais na vida pessoal, diminuindo sua quantidade de trabalho. No ano que vem, Anitta completará 27 anos – três a menos dos 30 de sua anunciada aposentadoria. Será que ela usará esse tempo restante para focar totalmente na carreira internacional? Ela já disse por aí que hoje em dia se sente mais confortável cantando em espanhol do que em português. Nos bastidores da indústria, comenta-se que ela morará nos Estados Unidos e enxugará a agenda de shows para que cada apresentação no Brasil seja imperdível. Fato é: Anitta dá sinais de que sairá de cena, mais cedo ou mais tarde. É importante pensar em um eventual cenário sem a maior popstar brasileira da década.

De “Show das Poderosas” (2013) para cá, Anitta tornou-se o nome central do pop nacional. Longe de ser a melhor cantora ou performer, mas sem dúvidas a mais popular, inteligente, criativa e marqueteira. As contribuições de Anitta para a cena brasileira são múltiplas. Ela elevou potencialmente o nível dos videoclipes no país – algo fundamental para qualquer artista que queira se arriscar no mercado atualmente. As estreias dos clipes de “Bang” (2015), “Sua Cara” (2017) e “Vai Malandra” (2017) foram momentos ímpares na cultura pop brasileira. Não lembro de outro cantor nacional que tenha feito tanta gente parar na frente de uma tela ao mesmo tempo para prestigiar um lançamento. Recorde atrás de recorde, Anitta ditou tendências de mercado e deu o que falar. Acho que um artista pop só alcança o auge quando ninguém é indiferente a ele, e há muito tempo todo mundo tem uma opinião sobre Anitta. Ultimamente, ela impulsiona o funk a patamares impensáveis até cinco anos atrás, utilizando a força, a credibilidade e a agenda de contatos conquistados em dez anos de carreira. Quando e se sair de cena, deixará um legado inegável.

É até estranho imaginar a música pop sem as causações de Anitta – ainda que eu defenda uma pausa para um posterior “comeback”. Se ela antes fazia todo mundo parar para conhecer seus novos trabalhos, hoje em dia a produtividade é tão alta quanto inconsistente e descartável. Ela precisa dar um tempo para ter ócio criativo e para que o público sinta sua falta. Mas e como fica a gente em sua ausência? Órfãos. É inevitável se perguntar “quem ocupará o lugar deixado por ela?”, afinal a lacuna aberta será imensa. Candidatas e aspirantes, não faltam. Não vejo, no entanto, ninguém com as credenciais necessárias para ocupar o lugar que Anitta alcançou e soube brilhantemente manter. O trono é difícil de ser alcançado. Ela articula muitos pontos importantes para seu sucesso. Não se trata de mero talento ou de pura e simplesmente arte. Querer ser “a próxima Anitta” – caminho percorrido por tantas – é um erro fatal. Vimos muitas caírem enquanto ela subia e acredito que veremos outros mais quando ela der adeus.

Demais artistas do pop nacional, cada um com suas particularidades e seus méritos, orbitam esse nome fenomenal. Criou-se movimentos em torno dela e cada um tem sua importância, dadas as devidas proporções. Anitta ainda é o sol que ilumina muitas estrelas. Minha mãe conheceu Pabllo Vittar e Maluma através dela, por exemplo. Acredito que muita gente foi introduzida a Kevin O Chris, Silva, Vitão e MC Rebecca por conta das indicações ou parcerias da Anitta. Por sua curadoria, por assim dizer. O atual projeto dela, “Brasileirinha”, me cheira muito a despedida e cada música traz uma parceria diferente. Eu mesmo nunca tinha ouvido falar de MC Cabelinho. Já vazou também uma música dela com Jão – que eu amo, mas muita gente só o conhecerá a partir dela, tenho certeza disso. Vejo que Anitta está jogando vários nomes na mesa e intuo que, sem ela, o mercado será assim, pulverizado. O espaço aberto por sua ausência não deverá ser ocupado e dominado por um substituto direto, mas dividido em diferentes parcelas entre vários nomes. Talvez a cena pop se torne mais disputada, com uma concorrência menos desigual e até mais interessante.

Nos anos 2000, Sandy & Junior marcaram o pop nacional com suas megaturnês. “As Quatro Estações”, como “era”, é icônica. Só quem viveu sabe o que era aquele show sensorial, com cheiro, frio, calor e neve artificial – uma aposta alta que inovou o que se fazia em termos de espetáculo por aqui. Eles, claro, tinham o suporte da TV Globo, então poderosíssima. Nos anos 2010, veio Anitta com a revitalização do videoclipe na era digital. Já sem uma MTV robusta ou estreias no “Fantástico”, ela entendeu – e fez outros artistas entenderem – que seus clipes tinham que ser muito atraentes para disputar atenção com todo e qualquer conteúdo na Internet. Basta dizer que hoje em dia um clipe musical disputa atenção até mesmo com pornografia – tudo está ao alcance de um clique, grátis, no mesmo dispositivo, sem diferença. Ignorar essa realidade é sair perdendo de largada.

Anitta fez o Brasil imitar a coreografia de “Show das Poderosas”, gerou memes, paródias e fantasias de Carnaval com seus clipes seguintes, e virou até discussão acadêmica. Quando penso em Anitta não penso em outra coisa senão no impacto cultural de seus videoclipes. É uma carreira que se consolidou no Youtube. O que esperar dos anos 2020? Se teremos um grande nome do nível de Sandy e Junior ou Anitta, acredito que ainda não o conhecemos. Mas minha curiosidade é mais PELO QUE SERÁ FEITO do que por QUEM FARÁ. Com o mundo cada vez mais conectado, com novos adventos tecnológicos a todo momento e a iminência de casas inteligentes, a realidade de “Os Jetsons” se torna cada vez mais real. Tudo pode acontecer – inclusive na maneira de consumir música. As novas gerações já pensam diferente da minha ou da geração da Anitta. Que venha a próxima década e suas novidades!

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