Nasci em 1981 e no final da década eu tinha apenas 9 anos, mas lembro de já ter iniciado a construção da minha memória musical. Culpa do meu pai. Tínhamos o costume de sentar de frente ao som, que na modernidade da época tinha vinil e fita K7 no mesmo aparelho, e ficávamos horas ouvindo o que estava ao nosso alcance, sem conversar um com o outro. Apenas aproveitando a companhia de pai e filha, embalados por uma variada trilha sonora. Entrei na adolescência seguindo o mesmo ritual que infelizmente foi perdido com a chegada do Ensino Médio e suas horas dedicadas aos estudos, esporte e língua estrangeira.
É fácil para eu me apegar a sons que remetem a esses primeiros 20 anos da minha existência. Nada contra o pop da década de 2010 para cá (mentira, alguma contra sim mas isso pode ser assunto para outro encontro), mas a influência deste período na minha vida construiu minha personalidade musical.
Então não me contenho em abrir um sorriso ao ouvir faixas atuais completamente mergulhadas neste universo. Lembro de quando ouvi “Last Friday Night”, da Katy Perry, pela primeira vez. O teclado característico da década de 1980 me transportou na primeira ouvida para aquela época e ela se tornou rapidamente a minha preferida do “Teenage Dream”.
E o que falar da Carly Rae Jepsen? Provavelmente uma das cantoras mais subestimadas da atualidade (falava isso da Pink, mas a Carly infelizmente entra nesta categoria também). “E•MO•TION” é um primor de disco, deveria ter sido ao menos indicado a uma categoria do Grammy (uma das maiores injustiças que vi nos últimos anos em premiações) e muito em parte por causa da atual geração, não foi além do mais do mesmo. A cantora, para a grande massa, ainda é uma one hit wonder e com um single que em nada a representa, na minha modesta opinião.
Tem também o The Weeknd que mês passado lançou um single com o Daft Punk e relatou claramente uma influência dos The Smiths e Prince no material do novo álbum “Starboy”. Quer mais anos 80 do que “pegada” rock no pop e sintetizadores? Lady Gaga também entra nessa lista com “Perfect Illusion” e a trilha da animação “Trolls”, curada por Justin Timberlake, com regravações de Diana Ross e Cindy Lauper.
Aí chegamos a Bruno Mars que me estreia um single com cara de anos 80 misturado com 90, que muita gente ainda não entendeu a vibe, mas eu tô aqui extasiada. Essa abertura estilo “California Love” (hit do 2Pac) com uma lembrança de Fresh Prince Of Bel Air no videoclipe… Muita gente achou uma releitura fraca de “Uptown Funk”, mas provavelmente a análise é de quem ainda não entendeu a proposta de som do Bruno Mars que mistura o R&B e soul com o pop e não o contrário e principalmente com o que ele entregou no “Unorthodox Jukebox”.
Nada contra o pop farofa (mentira, alguma contra sim, mas esse é assunto também para outro encontro), mas esse categorizado pop adulto é envolvente, vamos confessar! Pode ser a idade falando mais alto, mas ele é muito mais encorpado, cheio de referências e nuances para quem realmente se interessar em desbravar. Afinal, a história de uma música não começa quando o artista escreve os primeiros versos ou a melodia. Há uma bagagem gigante vivida pelo próprio e traduzida consciente ou inconscientemente para o som criado. E um pouco de história não faz mal a ninguém… nem no entretenimento.