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Entrevista: “se não fosse drag queen, seria menos feliz do que sou hoje”, diz Aretuza Lovi


Aretuza Lovi está em um ponto de virada em sua carreira. De contrato assinado com a gravadora Sony Music, ela prepara o lançamento de seu primeiro álbum, “Mercadinho”. O início dos trabalhos aconteceu neste mês, com a estreia do clipe de “Joga Bunda” – parceria com Pabllo Vittar e Gloria Groove. Dirigido por Felipe Sassi (de clipes da IZA e da Ludmilla), o vídeo foi visto um milhão de vezes nas primeiras 12 horas. Ainda não completou uma semana no ar e já contabiliza 3,2 milhões de acessos.

A drag queen, natural de Goiás, pode dizer que vive sua melhor fase. Cantora, compositora e dançarina, ela agora quer ultrapassar o nicho LGBT e, como Pabllo Vittar, alcançar o grande público. É a meta também da gravadora. Para isso, seu primeiro álbum terá participações de IZA, Solange Almeida e Valesca – esta última entrou de última hora na tracklist como reforço extra. É isso aí: “se prepara pra jogar!”

POPLINE – Você era uma artista independente até este single. Já está sentindo mudanças por ter uma gravadora associada ao seu trabalho agora?
Nossa, estou muito feliz! Eu trabalhei por seis anos sozinha. Sozinha, assim, com a ajuda do escritório, que é a GW, que me amparou muito. No ano passado, recebemos a proposta da Sony Music, estudamos direitinho e assinamos esse contrato no fim do ano. Essa equipe só veio para somar. Hoje, eu vejo a diferença que tenho, a estrutura que tenho. Eles me abraçaram de forma muito carinhosa e a gente está trabalhando muito para que venha um projeto lindo no álbum. “Joga Bunda”, com a Gloria e a Pabllo, é o primeiro single do álbum e a gente começou com o pé direito. Todo mundo muito motivado. A expectativa é de escrever uma história muito linda, que já começou a ser realizada.

Trabalhar com uma gravadora era um sonho?
Era um sonho, mas tudo acontece na hora certa. Veio na hora certa, uma fase muito mais madura. A partir de agora, só tenho a amadurecer muito mais, cercada de bons profissionais, que me dão esse suporte e essa estrutura. Isso faz total diferença. Você passa a abrir seus olhos para um trabalho ainda mais profissional do que você já estava realizando. Estou muito feliz. A Sony está me dando tudo que preciso.

Depois do “Joga Bunda”, virá outro single ou já o álbum?
A gente vai trabalhar “Joga Bunda” para a grande mídia me conhecer. A gente tem uma ascensão muito grande no público LGBT e agora as pessoas do dito público tradicional vão passar a me conhecer mais com esse trabalho. É um trabalho muito lindo, de uma dimensão muito grande. A gente vai trabalhar no Carnaval, sentir a vibe da galera, da recepção. Depois do Carnaval, a gente vai lançar meu primeiro álbum de estúdio, assinado pela Sony.

Já tá pronto?
Já tá pronto. A gente está nos ajustes finais. As participações já estão gravadas, já está total pronto.

Vai ser aquela tracklist que você já divulgou né?
É. Mas entrou um feat novo. A gente já tinha parceria com a Pabllo e com a Gloria; “Catuaba” em uma versão remix com a Gloria; a IZA, que é minha musa e minha irmã; e a Solange Almeida, que é de uma verdade muito grande na minha vida. E agora… tem outra pessoa, que a gente conversou muito, por anos, e ela sempre me apoiou e acreditou no meu trabalho, que é a Valesca. Ela entra no álbum comigo.

A drag music está super em alta, com grande receptividade. Como você avalia sua trajetória? Há 20 anos, talvez, nada disso estivesse acontecendo.
Há 20 anos, há 10 anos, não existia isso. O Brasil é o maior exportador de talentos drags. As pessoas não têm essa noção, mas o “bate cabelo” se consolidou aqui. Há dez anos, a gente tinha um mercado muito forte, que a gente não pode deixar de falar. Nós temos Léo Áquila, Dimmy Kieer, Verônika, que já faziam um drag music com batidas eletrônicas e bordões tipo “arrasou, bonita!”, “brilho, close, carão”. É muito relevante lembrar disso, porque elas também construíram o mercado drag music. Quando você escuta as palavras drag music, te remetem a bate cabelo e era esse o estilo de música. Acho que agora há uma evolução muito importante e revolucionária de evidência, que eu e as meninas estamos vivendo. É uma hipocrisia dizer que a gente não está em uma frente de representatividade, porque a gente está. A gente está desbravando e desmatando muitas coisas, para que outras possam vir. Que venham muitas outras, para que daqui a um tempo a gente não precise mais taxar e rotular a música como segregação, entendeu? Pelo menos, para nós, que já somos segredadas ao extremo. “Drag music”. A gente faz música para todo mundo. Música é música. Espero que isso aconteça o mais breve possível.

Se você não fosse drag queen, seria o quê?
Não sou muito de planejar, mas já fiz de tudo na minha vida: já fui de atendente de lanchonete a dar banho em cachorro, entregar panfleto… Não sei o que seria, mas eu seria uma pessoa menos feliz do que sou hoje. Ser drag me faz muito feliz. Ser drag me fez chegar e conhecer vários lugares e conquistar várias coisas. Eu acho que eu seria mais uma pessoa normativa e às vezes triste. Ser drag me tirou de um buraco, de um momento muito triste na minha vida.

Você falou em outra entrevista que o clipe de “Joga Bunda” tem referência em Katy Perry e Lady Gaga. Conte-me mais sobre isso!
Eu sinto que faltavam grandes produções no Brasil. A gente tem artistas incríveis, com diretores e produtores incríveis, mas todos os clipes que eu assistia eu achava que faltava alguma coisa. Sempre tive vontade de fazer essa história lúdica, de buscar referências… Eu amo Katy Perry e Lady Gaga. Acho que a exuberância de Lady Gaga, o exagero, fazer coisas que ninguém fez, é o que chama a atenção. Peguei um pouquinho disso dela. Quanto a Katy Perry, a fotografia dela é muito marcante, né? Muito fantasiosa, muito lúdica, e a gente trouxe pra cá. No Brasil, não tinha isso. O resultado está muito lúdico, muito bonito.

Esse clipe promove a reunião das três drag queens, e vocês realmente parecem muito unidas, sempre dando suporte uma para a outra. Tem alguma competição?
Essa pergunta é muito interessante, porque nunca nos perguntam. As pessoas afirmam isso sem nos perguntar. Não, não existe competição. Existe um mercado musical, como é para todos os outros artistas. Mas a gente é muito unida. A gente começou juntas e estamos nessa luta juntas. Se a gente se desunir neste momento, a gente não vai conseguir nada. A verdade de uma bate muito com a verdade da outra. A gente é amiga, compartilha de problemas pessoais, chama atenção uma da outra, anima uma a outra… O consenso é “estamos juntas”. Acho que isso movimenta uma arte. Não existe competição. Cada uma tem o seu estilo, o seu talento, e tem espaço para todo mundo. Digo que juntas a gente forma o Poderoso Megazord. Se eu pudesse, gravaria clipe com todo mundo. As pessoas ficam falando “por que não gravou com Fulana, com Beltrana?”. Nesse trabalho, era para ser assim, sabe? Conspirou para que acontecesse isso. A gente trabalhou há três anos no “Amor & Sexo”, então já tinha esse primeiro contato. Tomara que a gente possa gravar com outras meninas também.